PRIMEIRAS RESPOSTAS NO ATENDIMENTO EM OCORRÊNCIAS COM BOMBAS E EXPLOSIVOS: ADEQUABILIDADE NA FORMAÇÃO DO POLICIAL MILITAR DA BAHIA

Érico de Carvalho1

 

RESUMO

Este trabalho tem por objetivo demonstrar a necessidade e possibilidade de capacitar o efetivo recém-formado da Polícia Militar da Bahia (tenentes, sargentos e soldados) com noções básicas sobre bombas e explosivos. Devido ao aumento vertiginoso de ocorrências desta natureza, a preocupação com a capacitação para atuar de forma correta, emerge. Após análise dos currículos dos cursos de formação que os policiais são submetidos para estarem aptos para seus labores, identificou-se a inexistência de disciplina que contemple tal conteúdo. Visando uma menor exposição a risco por parte dos policiais e da sociedade e especificamente: Melhorar o desempenho do policial nas primeiras respostas em ocorrências envolvendo bombas e explosivos; aumentar a confiabilidade da sociedade na atuação da Polícia Militar nas ocorrências com bombas e explosivos e, reduzir a probabilidade de acionamento do artefato explosivo, refletindo na preservação de vidas e da proteção do patrimônio público e privado. Neste contexto, faz–se necessário que noções básicas de bombas e explosivos sejam inseridos nos cursos de formação da Polícia Militar da Bahia.

Palavras-chave: Polícia Militar. Bombas e Explosivos. Companhia Antibombas. Cursos de Formação.

 

ABSTRACT

This article have the purpose to demonstrate the needs of training of newly graduate corps of State of Bahia Military Police (lieutenants , sergeants and soldiers) in basic knowledge about bombs and explosives. Due to the exorbitant increase in cases involving bombs and explosives, the concern emerges about the training to function properly. After analysing the curriculum of courses that the police shall be submitted to being able to do their duties, identified lack of subject that covers such content. Seeking a lower risk exposure by the police and society and specifically; improving the performance of first responders in events involving bombs and explosives; enlarge the reliability of the society in the performance of military police in incidents with bombs and explosives; reduce the chance to detonate an explosive device, reflecting the preservation of lives and protect public and private property. in this context, the subject basic knowledge of bombs and explosives becomes necessary in the military police courses.

Keywords: Military Police. Bombs and Explosives. Bomb Company. Training Courses.

 

 

1 INTRODUÇÃO

Inicialmente, as sociedades primitivas não precisavam de regulação, pois eram extremamente simplórias e ainda baseadas no princípio da “natureza das coisas”, contudo, as mudanças sociais promoveram o surgimento da propriedade privada, da exploração do trabalho, do comércio e de outros fatores, que fizeram emergir um ente abstrato acima da sociedade para fins de sua regulação (HOBBES, 1971).

Trata-se da sociedade que “invoca o Estado forte para domar a “besta selvagem” (BOBBIO, 1995, p. 133), ou seja, a necessidade emergente de regulação e controle das relações humanas e sociais, sobretudo nas sociedades mais desenvolvidas, o que levou ao surgimento de uma organização superior a ela e dotada de um governo para conduzi-la, sob a égide da violência legítima quando necessário (WEBER, 1979).

A adaptação às mudanças é uma questão de sobrevivência, ou se adapta ou deixa de existir, essa é a teoria da evolução proposta por Charles Darwin, e que se pode abreviar oportunamente como sendo a sobrevivência do mais apto, ou seja, adaptáveis às dinâmicas sociais, financeiras e econômicas.

Na atual conjuntura de transformação das relações entre a sociedade e o Estado, no Brasil, urge que o papel e a formação da polícia sejam substancialmente modificados. A polícia em uma sociedade que se diz e se quer democrática, e a garantia da ordem social legítima.

Ante o exposto verificou-se que a Administração atua por meio de atos de polícia, objetivando a manutenção da ordem e da segurança pública. Encontra-se disposto na Lei Maior o dever do Estado perante a segurança pública, que está constitucionalmente obrigado a assegurar a ordem pública, a incolumidade das pessoas e do patrimônio, consoante artigo 144 da Constituição Federal, com as Polícias Civis (investigação de delitos); Polícias Militares (policiamento ostensivo fardado); Polícia Federal (tráfico de drogas, contrabando, crimes contra a ordem política e social), Polícia Rodoviária Federal (patrulhamento ostensivo das rodovias federais); Polícia Ferroviária Federal (patrulhamento ostensivo das ferrovias federais) e Guardas Municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988).

A Constituição Federal (1988) é bem clara ao dispor que “Segurança Pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos”, por isso, a mudança de comportamento das instituições que legitima soluções e práticas para a manutenção e salvaguarda do seu poder.

Nos últimos anos, tem crescido assustadoramente o número de ocorrências envolvendo bombas e explosivos, principalmente em arrombamento a instituições financeiras. Isso faz com que a necessidade do aparato de segurança pública da Bahia, esteja em condições de fazer frente a tais ocorrências.

Cabe destacar que tais ocorrências têm sido realizadas em sua grande maioria, em pequenas cidades no interior da Bahia e durante a madrugada, o que vem dificultando a sua resolutividade e inibição.

O Governo do Estado da Bahia com o apoio do Governo Federal tem investido no sistema de segurança pública para fazer frente a esse tipo de delito, que pela sua gravidade causa medo à população e preocupação para as autoridades. Desde 2014 a Polícia Militar da Bahia já conta com uma Unidade Especializada em atuação em ocorrência com bomba e explosivos, a Companhia Antibombas do Batalhão de Operações Policiais Especiais2 (BOPE).

No decorrer das atuações da Companhia Antibombas, foi identificada no seio do efetivo da PM que a há uma insuficiência de conhecimentos básicos neste tipo de evento, para identificar e ou saber como proceder com bombas e artefatos explosivos, o que põe em risco a vida da população e dos próprios agentes de segurança, bem como incapacita as ações da Polícia Militar da Bahia, em fazer frente aos ataques com explosivos.

Para este escopo, este trabalho tem por objetivo, através do método explorativo, demonstrar a necessidade e possibilidade de capacitar o efetivo recém-formado da Polícia Militar da Bahia (tenentes, sargentos e soldados) com noções básicas sobre bombas e explosivos. E especificamente: Melhorar o desempenho do policial nas primeiras respostas em ocorrências envolvendo bombas e explosivos; Aumentar a confiabilidade da sociedade na atuação da Polícia Militar nas ocorrências com bombas e explosivos e, Reduzir a probabilidade de acionamento do artefato explosivo, refletindo na preservação de vidas e da proteção da proteção do patrimônio público e privado.

 

2 BREVES RELATOS SOBRE AS NOVAS CONEXÕES DA CRIMINALIDADE NO ESTADO DA BAHIA

No Estado da Bahia, a modalidade de crime contra instituições financeiras, conhecida como “novo cangaço”, que consiste em grupos e facções criminosas fortemente armadas com armas de grosso calibre (fuzis, metralhadoras), adotando técnicas de guerrilha urbana – impossibilitando o efetivo policial local, destruindo fontes de energia elétrica e comunicação – para sitiarem pequenas cidades do interior do estado, saqueando instituições financeiras e estabelecimentos comerciais, causando terror e pânico a população.

Diante deste cenário, e com o crescimento e descentralização dos serviços bancários – caixas eletrônicos, agências de fomento para pequenos créditos e bancos postais credenciados – bem como, a fragilização do aparelho policial em escassos recursos humanos, materiais e equipamentos, desta forma, a agenda de atuação desses grupos, migra para furto qualificado com emprego de explosivos, características estas, para evitar o confronto direto com as forças policiais no espaço público.

Na Bahia saltou se de 121 ocorrências contra instituições financeiras no ano de 2011 para 184 no ano de 2014 (gráfico 1), desses 135 foram com utilização de explosivos. 72,6% das ocorrências, conforme dados do Sistema de Gestão Integrada da Ação Policial (SIAP).

GRÁFICO 1: Ocorrências contras instituições financeiras no Estado da Bahia - janeiro de 2011 a dezembro de 2014.

FONTE: Sistema de Gestão Integrada da Ação Policial (SIAP)

 

3 A COMPANHIA ANTIBOMBAS NA ESTRUTURA OPERACIONAL DA POLÍCIA MILITAR DA BAHIA

Até o ano de 2013, a Polícia Militar da Bahia não possuía um efetivo que atuasse exclusivamente com bombas e explosivos, mesmo tendo casos graves no seu histórico, como dois casos com “cinto bomba” fixado ao corpo de um gerente de banco nas cidades de Cansanção e Caeitié (G1.globo, 2012), bomba na Avenida 7 de setembro em um posto elevado de observação da PM durante o carnaval em 2011 (PIMENTA, 2011).

A unidade responsável para atendimentos a ocorrência dessa natureza era a Companhia de Operações Especiais (COE), subunidade do Batalhão de Polícia de Choque, criada pelo decreto 2.906, de 19 de outubro de 1989, pronta para atuar em ocorrências complexas, especialmente as envolvendo reféns, aplicando alternativas táticas do gerenciamento de crises, antiterrorismo, cumprimento de mandados de prisão de marginais de alta periculosidade, localização, identificação e tomada de pontos críticos, segurança de autoridades em grandes eventos, ocorrências envolvendo bombas e explosivos, dentre outras não convencionais em todo território baiano.

Com a aproximação dos eventos internacionais, Copa das Confederações, Copa do Mundo e Olimpíadas, o que colocaria a Bahia em um cenário mais exposto a possíveis atentados, concomitante com o crescimento do número de ocorrências com bombas e explosivos, o Estado da Bahia, percebeu a necessidade de uma atenção maior para essa especialidade que requer muito cuidado devido ao seu alto poder de destruição e não admite erros ou atuações amadoras como afirma o Leão (2001, p. 15):

Os incidentes envolvendo bombas e explosivos são sempre críticos, emergenciais e com grande probabilidade de resultados trágicos. Que seja motivado por um ato terrorista ou por uma ação criminosa comum, o uso criminoso de bombas e explosivos pode gerar pânico entre as pessoas, e seus resultados podem ter danos de grandes proporções mortes ou lesões gravíssimas, Desde Guy Falkes e a Conspiração da Pólvora, na Inglaterra do Século XVII as ações com bombas e explosivos têm evoluído e exigido das corporações policiais contramedidas à altura desses criminosos. O gerenciamento de incidentes dessa natureza exige uma base técnica muito aprimorada, embasada cientificada e metodologicamente seguida. Não há mais condições de permitir procedimentos de “achismo”, em que o profissional usa seu “bom senso”, “lógica” e sua “vasta experiência em generalidades”. Muito menos, aceitar os profissionais “filmólogos”, que atuam baseados naquele interessante filme a que assistiram semana passada no cinema.

 

3.1 CAPACITAÇÃO E APARELHAMENTO DA COMPANHIA ANTIBOMBAS DA POLÍCIA MILITAR DA BAHIA

Em 2012 iniciou-se o processo de capacitação e aquisição de equipamentos, foram enviados policiais para se especializarem em Estados que possuem um conhecimento mais avançado, Brasília, Mato Grosso, Rio Grande do Norte, formando-se explosivistas, especialista em explosivos, além de intercâmbio com Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, que sempre são receptivos e contribuem para o engrandecimento antibombas na Bahia.

Foram enviados, também, policiais para se especializar em outros países como Peru e Colômbia, com destaque para esse último, que possui um dos melhores cursos de explosivos, o Curso Técnico Profesional en Explosivos, com duração de 14 meses, na Escuela Nacional de Investigación Criminal, (ENSIC), da Polícia Nacional da Colômbia – (PONAL). Como trabalho de conclusão do curso, TCC, na Colômbia, foi produzido o artigo “Criterios Para La Conformación Del Grupo Antibombas De La Policía Militar De Bahia (Brasil), que utilizou como parâmetro a Unidad Antiexplosivos do Centro Antiexplosivos e Rastreo de Armas (CIARA), da PONAL, e o Esquadrão de Bombas do Grupo de Ações Táticas Especiais (GATE) da Polícia Militar de São Paulo”, artigo esse utilizado para a implementação da atual estrutura e atuação da unidade antibombas da Polícia Militar da Bahia (CARVALHO, 2012).

Em 2013, a Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos (SESGE) do Ministério da Justiça enviou um kit para todos Estados que sediariam jogos da Copa FIFA 2014, com vários equipamentos de última geração para atuação com bombas e explosivos, robô, traje antifragmentação, raio-x, canhão disruptor, braço mecânico, kit de linhas e ganchos, detector de gases tóxicos, totalizando quase três milhões de reais em equipamento.

Como estabelecido em lei, bem como definido em planejamento do Ministério da Justiça, as polícias militares permaneceram com a atribuição antibombas, nas suas áreas de competência, durante a COPA 2014, sendo assim, ainda como um grupo da Companhia de Operações Especiais (COE), o Grupo Antibombas da PMBA, foi contemplado com esses equipamentos, saindo do “zero”, pois até então não possuía nenhum equipamento específico na área, um grande marco, salto e legado para a atividade na Bahia.

 

4 ATUAÇÃO E IMPLANTAÇÃO DA DOUTRINA ANTIBOMBAS

Ao contrário do que muitos pensam uma unidade antibombas não atua somente quando se localiza um artefato, possui atribuições bem mais amplas, com ações pré-incidentais, contramedidas, pós-incidentais e em atividades de operações especiais como bem descreve Leão (2000, p.117-120):

As Operações Pré-Incidentais: compreende as operações de segurança e prevenção que antecedem o incidente com bombas e as operações de busca e localização de bombas e explosivos. As Operações de Desativação: compreendem as ações que são desencadeadas após a localização de uma bomba, explosivo ou objeto suspeito, com a finalidade de tornar os materiais seguros para o manuseio, transporte e para o trabalho pericial ou investigativo, assim como tornar seguro o ambiente ou a situação em que foram encontrados. Podem ser citadas também como Operações Incidentais, pois são realizadas em uma condição entre a prevenção e explosão. Estas são as operações mais perigosas, que oferecem maior risco de vida tanto para os operadores como para pessoas envolvidas direta ou indiretamente com o incidente, pois a existência da bomba ou explosivo é confirmada. As Operações Pós-Incidentais: compreendem as operações realizadas após uma explosão ou depois de terem sido realizadas as operações preventivas ou de desativação. As Operações Especiais: compreendem o apoio técnico e operacional às Unidades Táticas e de Operações Especiais dos órgãos policiais ou militares, oferecendo suporte técnico para ações que necessitem do pessoal, técnica e equipamento da Unidade Antibombas, trabalho de demolição ou outro emprego de explosivos.

 

Desde 2013 a unidade antibombas tem tido um trabalho árduo, visto que ao mesmo tempo em que teve que atuar nas ocorrências, teve que implantar e implementar a doutrina que inexistia na Bahia até então, estabelecendo procedimentos, medidas de segurança, canais de acionamento, que foram difundidos através de palestras e instruções para a própria instituição e outros órgãos.

Tendo que atuar nos grandes eventos: copa das confederações, sorteio da copa do mundo e a copa FIFA 2014, a unidade especializada teve a oportunidade de pôr em prática, avaliar, reforçar e dar legitimidade a todo esse labor, mesmo com algumas dificuldades, tendo que se dividir em duas equipes para atuar em duas cidades que receberiam seleções (Salvador e Porto Seguro). Executou-se muitas buscas e varreduras em veículos, hotéis, estádios e embarcações, uma experiência única, de muita interação e cooperação entre as Polícias Federal, Militar, Civil, Rodoviária Federal e Forças Armadas, que foram de fundamental importância para o êxito dos jogos e para a consolidação da doutrina de emprego da Unidade Antibombas da PMBA.

 

4.1 AUMENTO DAS ATUAÇÕES DA UNIDADE ANTIBOMBAS DA POLÍCIA MILITAR DA BAHIA

A Cia Antibombas vem tendo um aumento de demanda, saindo de 11 atuações em 2013, passando para 36 atuações em 2014 e até março de 2015 computou-se 10 ocorrências, conforme demonstrado no gráfico 2. Isso não deve ser associado exclusivamente ao aumento de delitos com utilização de explosivo, sendo que em 2013 foram 89 furtos a instituições financeiras com emprego de explosivos e em 2014 foram 135, segundo números do Sistema de Gestão Integrada da Ação Policial (SIAP).

Portanto, enquanto o número de ocorrências atendidas pela unidade antibombas aumentou vertiginosamente para mais de 220%, o número de ações de explosões contra bancos cresceu 51,7%, isso comprova que o aumento das atuações na Bahia em sua grande parte se deve à ação preventiva do grupo, com a divulgação da existência da unidade, ainda desconhecida pelos próprios integrantes da PMBA, e principalmente pela implantação e disseminação da doutrina, através de instruções e palestras orientando como proceder e quem chamar nos incidentes que envolvam suspeita de bombas ou artefatos explosivos.

 

GRÁFICO 2: Número de ocorrências atendidas pela unidade antibombas da PMBA

FONTE: Cia Antibombas BOPE PMBA

 

Uma experiência bastante positiva, e que contribuiu fundamentalmente, foi a realização de três edições do curso de Primeiras Respostas Envolvendo Bombas e Explosivos, custeado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública - SENASP e,na Bahia, ministrado pela Cia Antibombas. Foram capacitados policiais militares das unidades especializadas, além de agentes de Polícia Civil, Polícia Rodoviária Federal, Casa Militar do Governador e peritos do Departamento de Polícia Técnica.

Nesse curso foi possível informar aos agentes de segurança pública a existência do Antibombas, suas missões e funções, seus equipamentos e o mais importante foi poder ensinar como identificar um explosivo, como proceder no local, medidas de segurança e quem acionarem.

 

5 A DIFICULDADE DE PREPARO TÉCNICO-PROFISSIONAL E OS RISCOS NO MANUSEIO DE EXPLOSIVOS

Após análise dos currículos dos cursos de formação da PMBA, tanto para oficiais como para praças, foi identificado que não existem disciplinas que tratem da temática bombas e explosivos, concluído que a grande maioria do efetivo da PMBA, não possui o conhecimento básico sobre explosivos, desde sua identificação até como proceder, o que fazer e quem chamar quando a situação for com bombas e explosivos.

Atrelado a isso, constatou-se nas atuações da Cia Antibombas, bem como nos casos relatados por policiais das diversas unidades operacionais que já se depararam com situações com artefatos explosivos, foi identificado, e com grande preocupação, o risco que o efetivo da Polícia Militar da Bahia e consequentemente a sua população, estão expostos por procedimentos praticados em ocorrência com bombas e explosivos, casos que seriam cômicos se não fossem tão perigosos.

Daí surge a necessidade de que existam instruções nessa área específica, e que tais instruções sejam durante o curso de formação do policial, para que saia dos bancos acadêmicos já com esses conhecimentos, não só para evitar pôr em risco a vida da população ou a própria vida, mas também para que a ocorrência seja atendida da forma mais técnica e correta, visto que as primeiras ações em ocorrências com explosivos são de fundamental importância para a atuação dos explosivistas (especialista em explosivos) da Companhia Antibombas.

Dentre os vários casos relatados, narram procedimentos equivocados que colocaram em risco a vida do policial e da população. Destacou-se um em que uma emulsão (explosivo em gel) com espoleta, pronta para detonação foi levada por policiais para dentro da delegacia e lá exposta como troféu e armazenada junto com outros vários tipos de produtos apreendidos, o que nos faz relembrar o caso em dezembro de 2012 em Maceió - AL onde explosivos apreendidos e armazenados na delegacia, explodiram destruindo a delegacia, matando uma policial e ferindo outros dois (G1.GLOBO, 2012).

Em outro caso, no dia 23 de junho de 2014 na BR 324, a unidade antibombas da Bahia foi acionada para atender uma ocorrência, ocasião em que houve uma tentativa de assalto com explosivo a um posto de gasolina. Bandidos colocaram o explosivo no cofre do estabelecimento, porém o artefato não explodiu (Correio da Bahia, 2014). Os policiais que chegaram ao local retiraram o explosivo e levaram à sede do quartel. Quando alguém informou sobre o risco que o artefato oferecia, eles simplesmente o levaram de volta ao posto de gasolina, afixando-o novamente ao cofre e, somente após toda essa manipulação, foi acionado o grupo antibombas, não sendo informado que houve manuseio do artefato.

Essa falta de conhecimento dos procedimentos normativos influencia diretamente na atuação da Companhia Antibombas (identificação, neutralização e/ou remoção), e na investigação dos delitos que envolvem explosivos (autoria e origem do artefato), tendo em vista a não observância de ações de primeira resposta, as quais competem aos primeiros agentes de segurança a chegarem ao local da ocorrência em via de regra, integrantes do policiamento ostensivo cotidiano, que deveriam coletar informações, efetuar entrevistas, isolar o local, preservar vestígios, adotar medida de segurança com material suspeito, reconhecer um explosivo e acessórios da detonação, todos esses procedimentos básicos determinam a adoção ou não de técnicas para desfecho exitoso ou a completa tragédia da ocorrência, ceifando vidas, destruindo patrimônio e comprometendo a elucidação de autoria delitiva.

 

6 INGRESSO E FORMAÇÃO DO POLICIAL MILITAR DA BAHIA

O efetivo da Polícia Militar da Bahia é composto por cerca de trinta e dois mil homens, o ingresso na corporação se dá obrigatoriedade através de concurso público, (Lei nº. 7990-2001, Art. 06) os quais são divididos em duas carreiras, Oficiais e praças, (Lei n. 7990-2001, Art. 09) o primeiro trata-se dos responsáveis pela atividade de gestão, comando e direção da corporação (Lei n. 7990-2001, Art. 44), a segunda carreira trata-se dos elementos de execução direta de policiamento ostensivo e auxílio das atividades administrativas na corporação.

 

6.1 QUALIFICAÇÃO E FORMAÇÃO DE OFICIAIS POLICIAIS MILITARES DA POLÍCIA MILITAR DA BAHIA

Para atingir a qualificação desejada pela sociedade na atividade policial (Goldstein, 2003)3, é inadiável enquadrar-se com os pressupostos teórico-metodológicos da Matriz Curricular Nacional da Secretaria Nacional de Segurança Pública (áreas temáticas e eixos articuladores) que estimulam o raciocínio estratégico-político e didático-educacional necessários à reflexão sobre Justiça, Direitos Humanos e Cidadania no desenvolvimento das ações formativas segurança pública.

As Academias de Polícias Militares são Instituições de Ensino Superior, responsáveis pela formação dos quadros de oficiais subalternos (tenente PM), encontra equivalência aos cursos superiores de graduação (Lei 9.394/96 no artigo 83), segundo Prado (2002, p. 7). o “Processo MEC nº 239296/82, trata do reconhecimento do CFOPM como Curso Superior”. Os alunos egressos após 03 (três) anos são declarados aspirantes-a-oficial podendo galgar até a patente de Capitão/PM na hierarquia da Organização Militar. As Polícias Militares são semelhantes ao modelo castrense do Exército Brasileiro, cabendo em grupos distintos – Oficiais: Coronel, Tenente-Coronel, Major, Capitão, 1º Tenente, 2º Tenente, Aspirante-a-Oficial – Praças: Subtenente, 1º Sargento, 2º Sargento, 3º Sargento, Cabo e Soldado. Tal consonância dispõe-se na Carta Magna de 1988, no art. 144 (DA SEGURANÇA PÚBLICA), parágrafos 5º e 6º 4.

No período ditatorial foram sedimentados os pilares das forças militares estaduais – Dec. Lei nº 667 de 02/07/69 e o Dec.88.777 de 30/09/83 (R-200) – Regulamento das Polícias e Corpos de Bombeiros Militares - que forjaram o atual modelo de formação, treinamento, qualificação e atuação da Polícia Militar da Bahia (PMBA). Na Carta Magna de 1988, conforme preceitua o artigo 42 (Dos servidores públicos estaduais) e 144 (Da Segurança Pública) retornam às polícias militares, o controle, estruturação e coordenação tendo como finalidades: a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio executadas pelo policiamento ostensivo fardado.

Ao ingressar na PMBA no quadro de Oficiais o candidato integrará o curso5 de Formação de Oficiais Policiais Militares, na Academia de Polícia Militar (APM), com duração de três anos, com um currículo muito bem elaborado de uma carga horária de 4428 (quatro mil quatrocentos e vinte e oito) horas, com componentes curriculares fundamentais, profissionais e complementares. O curso objetiva formar um profissional com elevado preparo intelectual, qualificado para o exercício técnico, profissional e científico das atividades gerenciais da Segurança Pública, observando os aspectos jurídicos, ambientais, econômicos e sociais, com ênfase em: policiamento ostensivo (comunitário e de guardas), policiamento especializado (Choque e em biomas, Montado, Trânsito Urbano e Rodoviário, Ambiental e Bombeiro Militar). Apesar de uma carga horária vasta, não há previsão na ementa do curso de nenhuma hora-aula que trate do tema bombas e explosivos.

 

6.2 QUALIFICAÇÃO E FORMAÇÃO DAS PRAÇAS DA POLÍCIA MILITAR DA BAHIA

O ingresso no Curso de Formação de Soldado se dá através do concurso externo, após autorização do Governo do Estado, conforme requisição do Comando Geral da Corporação, onde o processo seletivo é regido por Edital específico, confeccionado pela Secretaria da Administração do Estado da Bahia (SAEB) e PMBA em conjunto, composto das fases de habilitação (inscrição e exame intelectual) e fase pré-admissional (convocação dos candidatos aprovados e classificados, exames médico, odontológico, psicológico, físico, investigação social documental).

Após aprovado nas fases anteriormente citadas o candidato ingressará no curso de formação, passando por uma profissionalização que o habilite ingressar na corporação de praças para o exercício das funções inerentes à profissão policial militar.

Com um currículo de 1202 (mil duzentos e duas) horas-aula, com duração de 9 meses, o curso de formação de soldados da PMBA objetiva internalizar no aluno valores e princípios morais que norteiam a condição de cidadão e de profissional policial militar, desenvolver competências cognitivas, operativas e atitudinais para o desempenho da profissão policial militar nos âmbitos operacional e administrativo. Concluindo o curso com aproveitamento, o aluno soldado estará apto para exercer a função de soldado da polícia militar da Bahia e cumprir seu papel legal e social. Apesar de ter um currículo bem atualizado, com ações voltadas para as necessidades da sociedade, uma polícia mais cidadã, não existe previsão na ementa, de carga horária que trate do tema bombas e explosivos.

 

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após análise dos currículos dos cursos de formação dos policiais da Polícia Militar da Bahia, tanto de oficiais quanto das praças, conclui-se que oficialmente o futuro profissional de segurança da Polícia Militar da Bahia não tem contato com instruções no que tange a atendimento básico, de primeiras respostas, com bombas e explosivos, nem ao menos para identificar um componente explosivo em uma abordagem.

Atualmente um aspirante a oficial ou um soldado recém-saídos dos bancos acadêmicos da instituição não possuem, tecnicamente, condições de atuar, identificar ou até mesmo apoiar uma ocorrência com bombas e explosivos, sem estar expondo em risco a sua vida e a da população.

Os cursos, tanto de oficiais quanto de praças são muito bem elaborados e abrangentes, porém essa temática que vem sendo uma demanda recente, não foi contemplada, sendo essa lacuna já refletida e identificada nas ocorrências com bombas e explosivos, gerando dúvidas, insegurança e erros de procedimentos, durante o atendimento de uma ocorrência do gênero, corroborando com Toledo ( 2001,p.103):

O processo de conscientização e mudança de comportamento, para que um alto grau de profissionalismo seja atingido, normalmente, é moroso e complexo. Dessa forma, urge que os primeiros passos no sentido de se difundir globalmente os conhecimentos básicos sejam dados a curto prazo,pois é grande a tendência de agravamento da problemática relacionada aos incidentes com explosivos e bombas no Brasil.

 

É de fundamental importância que seja ofertado aos policiais, desde a fase de formação a qualificação para atuar no atendimento de primeira resposta a um incidente com bombas e explosivos, dentro de sua esfera de responsabilidade, até o acionamento da Companhia Antibombas.

Para adquirir conhecimentos básicos para atendimento de primeiras respostas, um futuro oficial, que irá exercer função de comando e de orientação, necessita de uma instrução que abrangesse histórico dos explosivos, conceitos básicos, características dos explosivos, efeitos de uma explosão, procedimentos em ocorrências com explosivos, técnicas de buscas, mecanismos de acionamento e práticas com explosivos. Baseando-se na ementa e carga horária do Curso Técnico Policial Explosivista – (CTEP), já aprovado pelo Instituto de Ensino da PMBA e ministrado pela Companhia Antibombas do BOPE PMBA, esse conteúdo básico necessitaria de uma com carga mínima de horária de 20 (vinte) horas-aula.

Entretanto o ideal seria que aluno a oficial concluísse a academia já com o curso de primeiras respostas envolvendo bombas e explosivos, também já com o projeto aprovado pelo Instituto de Ensino da PMBA e realizado pela Companhia Antibombas do BOPE PMBA, que por ter uma carga horária maior, 60 (sessenta) horas-aula, tem uma abrangência maior e mais detalhada.

Para o curso de formação de soldados, com uma carga horária menor e voltado a função de execução, também baseando–se pela ementa e carga horária dos mesmos cursos citados sugere-se uma instrução com carga horária mínima de 10 (dez) horas-aula, que possibilitasse ao soldado identificar um explosivo, os riscos que os explosivos oferecem e saber como proceder em um evento que envolva bombas e explosivos.

Analisando a grade curricular atual do curso de formação de soldados observa-se que existe uma carga horária de sessenta horas-aula para seminários de temas selecionados, uma sugestão seria inserir a instrução de primeiras respostas no atendimento em ocorrências com bombas e explosivos.

O jargão utilizado “com explosivos só se erra uma vez”, expressa muito bem a nossa preocupação com procedimentos mal feitos, um erro pode ceifar a vida de várias pessoas, e causar danos irreparáveis, nosso bem maior sempre tem que ser preservado e é inadmissível a perda de vidas humanas por falhas ou erros que poderiam ser evitados.

Capacitar, especializar e instruir, na busca constante de melhor servir e contribuir para uma sociedade melhor.

 

REFERÊNCIAS

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G1.globo. Policial Morre após explosão em delegacia de Maceió. Portal G1. Publicado em 20 dez. 2012. Disponível em: <http://g1.globo.com/jornal-da-globo/noticia/2012/12/policial-morre-apos-explosao-em-delegacia-de-maceio.html>. Acesso em 15 mar. 2019.

GOLDSTEIN, Herman. Policiando uma sociedade livre. Tradução Marcello Rolemberg; revisão da tradução Maria Cristina P. Da Cunha Marques. In: Educação superior e a polícia. Cap. XI, p. 349-409. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2003. (Série Polícia e Sociedade; n. 9/ Organização Nancy Cardia).

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LEÃO, Décio José Aguiar. Doutrina para operações antibombas. 170 p. Monografia (Pós-graduação Lato Sensu em Política e Estratégia) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2000.

LEÃO, Décio. Prefácio. In: TOLEDO Jr, Theseo Darcy Bueno. Medidas preliminares no atendimento de ocorrências com bombas e artefatos explosivos: uma proposta para inclusão da unidade didática nos cursos de formação da PMESP. 178 p. Monografia (Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais) – Polícia Militar do Estado de São Paulo, São Paulo, 2001.

MAEDA, Alexandre Makoto; LUCAS, Diogo. Incidentes com Bombas e Explosivos: Proposta de Inclusão da Disciplina no Curso de Formação de Soldados da PMPR. Monografia (Curso de Formação de Oficiais) – Polícia Militar do Paraná, São José dos Pinhais, 2014.

PIMENTA. Suspeita de bomba no carnaval de Salvador. Pimenta.blog.br. Publicado em 08/03/ 2011 Disponível em: <http://www.pimenta.blog.br/2011/03/08/ameaca-de-bomba-no-carnaval-de-salvador/>. Acesso em 10 mar. 2019.

TOLEDO Jr, Theseo Darcy Bueno. Medidas preliminares no atendimento de ocorrências com bombas e artefatos explosivos: uma proposta para inclusão da unidade didática nos cursos de formação da PMESP. 178 p. Monografia (Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais) – Polícia Militar do Estado de São Paulo, São Paulo, 2001.

UNCP, United Nations Civilian Police. Manual de Polícia para Ações Antibombas. São Paulo, 2001.

WEBER, Max. Os Três tipos puros de dominação. In: COHN, G. Max Weber: sociologia. São Paulo: Ática, 1979.

 


1 erico_carvalho13@hotmail.com

2 Em 09 de dezembro de 2014, através da lei nº 13.201, a Companhia de Operações Especiais (COE) é elevada a Batalhão, tornando-se o Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE), consequentemente o grupo antibombas foi elevado a Companhia.

3 Professor e pesquisador norte-americano, especialista em formação e cultura policial, consultor em políticas de Segurança Pública e Justiça Criminal.

4 Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil”.
“As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios”.

5 curso: é a modalidade de ensino que tem como finalidade preparar o indivíduo para a vida em sociedade, para habilitar pessoas para o exercício do cargo e das funções de policial militar e bombeiro militar, bem como capacitar e qualificar policiais militares e bombeiros militares para desempenhar, de forma eficaz e eficiente, as técnicas e utilizar as tecnologias inerentes às profissões (PMBA, Plano Geral de Ensino 2012/2015).