Estudo comparativo dos Índices de Aptidão Física de Bombeiras Militares do Estado do Paraná antes e após a gestação

1° Ten. QOBM Débora Fernanda Kolossoskei
Prof° Dr. Raul Osiecki

RESUMO

Estudo quantitativo elaborado com 13 bombeiras militares voluntárias do Corpo de Bombeiros do Paraná, que realizaram Teste de Aptidão Física (TAF) antes e após a gestação, no período de novembro de 2012 e fevereiro de 2019. O objetivo foi comparar os resultados dos testes realizados através de suas pontuações, de acordo com índices obtidos, sexo e faixa etária, conforme estabelecidas em portaria da Polícia Militar do Paraná. Os testes que compõem a avaliação física na corporação são: teste shuttle run, teste de flexão ou isometria na barra fixa, ou flexão de braço no solo e teste de 12 minutos (corrida/caminhada). Os dados foram coletados pelas seções de ensino e instrução das unidades às quais as bombeiras pertenciam quando os realizaram. Paralelo a isso, foi aplicado um questionário às voluntárias para buscar informações sobre a prática de exercícios físicos antes, durante e após a gestação, bem como no período após o retorno ao serviço e que antecedeu a realização do TAF. Outras informações sobre complicações durante a gestação, tipo de parto realizado, peso corporal e estatura foram contempladas. Os resultados foram os seguintes: no teste de shuttle run ocorreu 53,84% de redução nas pontuações; no teste de flexão ou isometria na barra fixa, ou flexão de braço no solo 41,66% piorou o resultado; no teste de 12 minutos 46,15% da voluntárias reduziram suas pontuações; sobre complicações durante a gestação, 62% das voluntárias afirmaram ter ocorrido algum tipo de problema, sendo o mais frequente o descolamento da placenta, acusado por três bombeiras; dentre as 13 voluntárias, oito não retornaram ao peso corporal informado antes da gestação; verificou-se que antes da gestação 84,61% das voluntárias praticavam exercícios físicos ao menos duas vezes por semana, reduzindo para 61,53% durante a gestação, 38,46% após o parto e aumentando novamente para 61,53% ao retornar para o serviço. Portanto, de uma forma geral a pontuação média total do TAF após a licença gestante superou em 7,62 pontos a média de pontos totais do TAF antes da gestação. Com base nessas informações, outros trabalhos com maior aprofundamento e dados qualitativos poderão ser realizados, a fim de que as militares tenham uma orientação mais específica sobre como melhorar seus resultados, sem prejuízo ao organismo e com mais qualidade de vida a elas e aos bebês.

Palavras-chave: Teste de aptidão física (TAF); aptidão física; gestantes; saúde da mulher; bombeiras militares; Corpo de Bombeiros.

 

1. INTRODUÇÃO

A prática de atividade física é uma recomendação mundial para promoção da saúde e qualidade de vida, tendo em vista que a inatividade física é apontada como o quarto maior fator responsável pela mortalidade global, precedido apenas por pressão arterial elevada, consumo de tabaco, alto nível de glicose sanguíneo e sobrepeso ou obesidade (WHO, 2010). Para os militares estaduais, o benefício da atividade física busca mais do que a saúde do praticante, pois a atividade fim do policial e bombeiro militar depende amplamente do seu desempenho físico, conforme previsão de missões estabelecida no Art. 48 da Constituição do

Estado do Paraná, de que os militares estaduais devem desempenhar:

(...) polícia ostensiva, a preservação da ordem pública, a execução de atividades de defesa civil, prevenção e combate a incêndio, buscas, salvamentos e socorros públicos, o policiamento de trânsito urbano e rodoviário, o policiamento ferroviário, de florestas e de mananciais, além de outras formas e funções definidas em lei. – Art. 48 da Constituição do Estado do Paraná, 1989.

Por este motivo são destinados horários para treinamento físico militar em dois dias da semana (terça-feira e quinta-feira, das 16h à 17h30min), conforme a Portaria do Comando- geral n° 882, de 4 de outubro de 2012, (PARANÁ, 2012) a todos os militares estaduais. Além disso, para fins de avaliação, são realizados Testes de Aptidão Física (TAF’s) três vezes ao ano, o qual é composto por três avaliações físicas (teste shuttle run, tração ou isometria na barra fixa ou flexão de braço no solo e teste de 12 minutos – corrida/caminhada), bem como alguns controles fisiológicos: frequência cardíaca de repouso, frequência cardíaca de atividade e pressão arterial em repouso. O resultado de cada teste físico é dado em pontuação, que pode variar de 0 a 100 pontos, conforme tabelas dos Anexos B e C1 da Portaria n° 076/2016 do CG/PMPR, e no final somam-se as três pontuações. Para ser considerado apto, o militar deve atingir a pontuação mínima, de acordo com sua faixa etária2, no somatório final dos resultados dos três testes de aptidão física, sem poder zerar em nenhuma prova.

O efetivo de bombeiros do estado do Paraná é composto por 3.431 militares, dentre eles 224 bombeiras femininas (PARANÁ, 2018). De acordo com a Portaria n° 759, de 17 de julho de 2014, as militares que estiverem gestantes são afastadas do serviço operacional e ficam desobrigadas de realizar o TAF, bem como estarão autorizadas a trajar-se com roupas civis (PARANÁ, 2014). Após o nascimento do bebê, as militares estaduais têm direito a cento e oitenta dias de licença gestante, conforme previsto no Regulamento Interno de Serviços Gerais da PMPR (PARANÁ, 2010).

A prática de atividade física durante a gestação é recomendada, desde que não haja impedimentos médicos, visto que os benefícios para a mãe e o bebê são, respectivamente, um parto com melhor recuperação e um ganho de peso maior (BATISTA et al, 2003 apud ACOG3, 1994). Clapp e Little (1995) afirmam que gestantes que praticam atividade física durante o terceiro trimestre da gestação apresentam uma significativa redução na velocidade de aumento de peso e redução da gordura localizada após a gestação.

A escassez de estudos relacionados às bombeiras militares gestantes no Brasil e seus impactos no exercício da profissão instiga a realização desse estudo, que é um passo inicial na busca dos resultados e dificuldades enfrentadas pelas mulheres, cujas capacidades físicas são ferramentas essenciais para o bom desempenho de suas atividades laborais.

O objetivo deste trabalho foi comparar os índices de aptidão física de bombeiras militares antes e após a gestação, considerando nessa análise suas particularidades, tais como: treinamento antes, durante e após a gestação, tipo de parto e ainda complicações durante e/ou após a gestação.

 

2. METODOLOGIA

O estudo caracteriza-se como quantitativo e foi realizado com 13 bombeiras militares do estado do Paraná, que já retornaram ao trabalho após a gestação, com idades entre 27 e 39 anos, lotadas em unidades presentes nas cidades de Curitiba (SESP- Casa Militar, APMG- CPM, CCB-BM3, CCB-Ajud), Piraquara (CCB-CEI), Paranaguá (8°GB), Ponta Grossa (2°GB), Irati (7°SGBI), Guarapuava (12°GB), Maringá (5°GB) e Pato Branco (2°SGBI). As militares foram voluntárias para o estudo, que foi divulgado no grupo do aplicativo Whatsapp que contempla a maioria das bombeiras do estado do Paraná. O critério de exclusão foi aquelas militares que engravidaram antes de ingressar na Corporação, em virtude de não haver controle dos índices antes da gestação.

Para obter os índices necessários para esta pesquisa, foram consultadas as unidades às quais pertenciam as bombeiras militares quando realizaram os TAF’s antes e após a gestação. Considerando a Portaria n° 759 do CG/PMPR, após apresentar o atestado médico de gestação, as militares estaduais devem ser realocadas somente em serviços internos e administrativos e cessar o uso de qualquer fardamento, a fim de preservar a saúde e integridade da gestante e do nascituro. Nos casos em que a gestante esteja matriculada em curso de formação ou aperfeiçoamento, ela deverá ser desligada assim que for apresentado o atestado de gestação. Em casos de curso de especialização, a Diretoria de Ensino e Pesquisa solicitará um parecer da Junta Médica da Corporação para que, com base nas disciplinas do curso, manifeste a possibilidade de participação da militar.

Os dados coletados variam da data de 7 de novembro de 2012 a 12 de fevereiro de 2019 e são compostos pela pontuação resultante dos índices obtidos nos testes de shuttle run, teste de força para membros superiores (tração ou isometria na barra fixa, ou apoio de braços sobre o solo) e corrida de 12 minutos. Vale ressaltar que a militar pode ter realizado o teste de membros superiores de maneira diferente antes e após a gestação; no entanto, neste estudo foi considerada a pontuação obtida, independente da opção realizada.

Os resultados que serão apresentados na sequência das descrições dos testes mostrarão quantas voluntárias melhoraram, não alteraram ou pioraram suas aptidões físicas, devendo ser relevado o fato de que duas voluntárias não se sentiram capazes, portanto não realizaram os testes após o retorno da licença maternidade. Seus resultados serão apontados no quantitativo que piorou a pontuação.

 

3. RESULTADOS

3.1 Teste de Shuttle Run

Consiste numa corrida de agilidade realizada em pista reta com distância de 9,14 m medidos da linha externa das marcações que a limitam. A 10 cm de uma das linhas são depositados dois tacos de madeira (5cm x 5cm x 10cm) longitudinalmente e separados numa distância de 30 cm entre eles. O atleta deve largar detrás da linha contrária aos tacos e correr em máxima velocidade até a linha oposta, da qual deverá passar pelo menos um dos pés e pegar um dos tacos. Em seguida corre novamente para a linha de largada e deposita o taco (sem jogar), devendo passar um dos pés da linha. Retorna à linha contrária e, da mesma forma, pega o outro taco para depositar na linha de largada, momento em que o cronômetro será parado. O resultado do teste varia conforme o tempo, a idade e o sexo do militar, constando nos Anexos B e C da Portaria n° 076/2016 do Comando Geral da PMPR (PARANÁ, 2016). Ao relacionar os resultados do teste de Shuttle Run das militares voluntárias tivemos o resultado abaixo relacionado.

Tabela 1: Índices da prova de shuttle run em bombeiras militares antes e após a gestação

Voluntária

Tempo antes (s)

Pontos antes (0-100)

Tempo depois (s)

Pontos depois (0-100)

Diferença

Diferença Percentual

%

1

11,6

80

11

95

+15

18,75

2

10,19

100

0

0

-100

-100

3

11

90

_

_

-90

-100

4

10,20

100

11

95

-5

-5

5

11,8

75

11,4

85

+10

13,33

6

11

90

12,2

65

-25

-27,78

7

11,4

80

11,5

75

-5

-6,25

8

9,95

100

10,2

100

0

0

9

10,5

100

10,7

100

0

0

10

10,4

100

10,8

95

-5

-5

11

11,2

95

11

95

0

0

12

10,7

100

11

95

-5

-5

13

11,18

85

10,4

100

+15

17,65

Média

10,85

91,92

10,1

83,33

-15

-15,33

D.P.

0,58

9,25

3,22

28,39

3,08572

27,18

Fonte: Seções de Ensino e Instrução (B-3) das unidades consultadas. Elaboração: A autora (2019).

 

Aplicando os resultados comparativos em gráfico podemos verificar que, majoritariamente, houve uma decadência nos índices de agilidade, totalizando 7 diminuições de pontuação, 3 permanências e 3 melhoras.

Fonte: Seções de Ensino e Instrução (B-3) das unidades consultadas. Elaboração: A autora (2019).

 

3.2 Teste de tração ou isometria na barra fixa ou apoio de braços sobre o solo

Com o objetivo de avaliar a força de membros superiores dos militares são realizados os testes de tração ou isometria na barra fixa e para militares a partir de 36 anos, como opção, o apoio de braços sobre o solo.

O teste de tração na barra fixa ocorre partindo da posição em que o militar já está com as duas mãos na barra, em posição de pronação, braços estendidos e pés fora do solo. Deve flexionar os braços até que o queixo ultrapasse a parte superior da barra, em seguida retornando à posição inicial com os braços estendidos. Não pode haver auxílio das pernas ou corpo em contato com qualquer objeto ou outro auxílio.

O teste de isometria na barra fixa inicia com os braços flexionados em posição de pronação, com o queixo ultrapassando a linha superior da barra. Será iniciada a contagem do tempo no cronômetro do avaliador, finalizando assim que o militar baixar o queixo da linha superior da barra.

 

Tabela 2: Índices do teste de força em membros superiores de bombeiras militares antes e após a gestação

Vol.

QA

TA(s)*

PtA

QD

TD(s)*

PtD

Diferença

Dif %

1

_

26

100

_

37

100

0

0

2

_

13,18

40

_

0

0

-40

-100

3

_

11

30

_

0

0

-30

-100

4

_

36,12

100

_

36

100

0

0

5

_

7

15

33**

_

95

+80

533,33

6

2

_

40

_

22

90

+50

125

7

_

26

100

_

37,4

100

0

0

8

11

_

100

_

26

100

0

0

9

7

_

90

3

_

60

-30

-33,33

10

_

26

100

4

_

70

-30

-30

11

_

14

50

_

12

40

-10

-20

12

_

31

100

_

26

100

0

0

13

4

_

70

_

19

75

+5

7,14

Média

6

21,14

71,92

3,5

21,54

71,54

-0,38

29,39

D.P

3,91

10,06

32,37

0,71

14,00

36,88

33,32

161,06

*Realizaram teste de isometria em barra fixa. ** Realizou flexão de braço com apoio no solo. Dado não contabilizado na média e desvio padrão das quantidades de flexão na barra. Vol= voluntária; QA= quantidade antes; TA= tempo antes em segundos; PtA (0-100)= pontuação antes; QD= quantidade depois; TD= tempo depois em segundos; PtD (0-100)= pontuação depois; Dif % = diferença percentual. Fonte: Seções de Ensino e Instrução (B-3) das unidades consultadas. Elaboração: A autora (2019).

 

O teste opcional para militares com idade a partir de 36 anos é o apoio de braços sobre o solo, o qual difere sua realização para homens e mulheres. Militares do sexo masculino se colocarão com as mãos paralelas sobre o solo (na linha dos ombros) e pernas esticadas com pés unidos, devendo apenas as pontas dos pés tocar o solo. Ao sinal do avaliador o militar iniciará o teste flexionando os cotovelos até o tórax estar distante 10 cm do solo, em seguida esticar os braços, contando assim uma repetição. Deverá executar o máximo de repetições em 1 minuto. Para militares do sexo feminino o mesmo teste será realizado, sendo opcional apoiar também os joelhos no solo, além das pontas dos pés e mãos, formando um ângulo de 120º entre posterior de pernas e coxas.

Todos os testes deverão ser pontuados, levando-se em consideração o número de repetições ou tempo de execução, conforme Anexos B e C da Portaria n° 076/2016 do Comando Geral da PMPR (PARANÁ, 2016).

A seguir conseguimos observar as informações das pontuações resultantes do teste de tração na barra fixa, isometria na barra fixa ou flexão de braço no solo. Verificamos que 5 voluntárias mantiveram a mesma pontuação nos TAF’s anterior e posterior a gestação, 5 voluntárias tiveram uma redução na pontuação e 3 voluntárias melhoraram suas pontuações.

 

Fonte: Seções de Ensino e Instrução (B-3) das unidades consultadas. Elaboração: A autora (2019).

 

Em virtude da variedade na forma de avaliar a força de membros superiores através desses testes, é difícil afirmar que a voluntária 6, por exemplo, teve uma melhora, visto que antes da gestação ela foi avaliada através da isometria na barra fixa e após a licença maternidade o teste aplicado foi a flexão de braço no solo, em virtude da idade que a militar se encontrava e a Portaria n° 076/2016 permitir esse método avaliativo. Essa diferença de teste avaliativo também ocorreu com as voluntárias 7, 9, 11 e 13, as quais realizaram isometria em um dos TAF’s e flexão na barra fixa em outro.

 

3.3 Teste de corrida de 12 minutos

Esse teste elaborado por COOPER (1968) visa avaliar a capacidade cardiorrespiratória dos militares, os quais devem percorrer a maior distância possível em 12 minutos correndo ou andando, sendo que não é permitido parar durante o teste. O resultado é dado em pontos, conforme a tabela do Anexo C (feminino) da Portaria n° 076/2016, considerando a idade e a distância máxima alcançada pela militar que realizou o teste.

Na tabela abaixo estão listadas as distâncias e pontuações obtidas pelas voluntárias no TAF realizado antes da gestação e após o retorno da licença maternidade.

 

Tabela 3: Índices do teste de 12 minutos em bombeiras militares antes e após a gestação

Vol.

DA(m)

PtA (0-100)

DD(m)

PtD

Diferença

Dif %

1

2150

70

2400

95

+25

+35,71

2

2050

50

0

0

-50

-100

3

1950

45

0

0

-45

-100

4

2500

100

2450

100

0

0

5

2100

65

2100

65

0

0

6

2000

50

2050

60

+10

+20

7

2300

80

2400

90

+10

+12,5

8

2400

85

2200

65

-20

-23,52

9

2010

51

1800

35

-16

-31,37

10

2000

50

2200

70

+20

40

11

2400

95

2150

70

-25

-26,31

12

2050

60

2300

85

+25

41,66

13

2588

100

2150

70

-30

-30

Média

2192,15

69,31

1861,54

61,92

-7,38

-12,41

D.P

217,15

20,52

843,64

32,24

25,57

46,81

Fonte: Seções de Ensino e Instrução (B-3) das unidades consultadas. Elaboração: A autora (2019).

 

O teste de corrida apresentou um leve desequilíbrio quando somados os resultados de melhoria e a manutenção de índices nas pontuações (5 e 2 voluntárias, respectivamente), comparado às 6 voluntárias que reduziram seus índices.

Fonte: Seções de Ensino e Instrução (B-3) das unidades consultadas. Elaboração: A autora (2019).

 

3.4 Análise final dos TAF’s

Ao final da realização dos testes de aptidão física são somados os pontos de cada prova e, caso atinja a pontuação mínima, conforme a faixa etária, a militar é considerada apta fisicamente. Para fins de promoção, existe a previsão de que o TAF seja novamente realizado 30 dias após a inaptidão, conforme previsão na Portaria n° 078 do Comando-geral da PMPR (PARANÁ, 2016).

Comparando os resultados finais das militares voluntárias, antes e após a gestação, encontramos o seguinte resultado:

Fonte: Seções de Ensino e Instrução (B-3) das unidades consultadas. Elaboração: A autora (2019)

 

Em suma, verificamos que 5 militares apresentaram melhoria na pontuação do TAF e 8 militares tiveram uma redução na pontuação, incluindo as 2 militares que não obtiveram qualquer pontuação no segundo TAF, por não executarem os testes.

 

Fonte: Seções de Ensino e Instrução (B-3) das unidades consultadas. Elaboração: A autora (2019)

 

De modo geral, observamos que a pontuação média dos resultados do TAF realizado após a licença gestante superou 7,62 pontos a pontuação média total do TAF realizado antes da gestação.

Consideramos nesses resultados o fato de que a aplicação dos TAF’s após o retorno das bombeiras da licença gestante variaram no período de execução, como por exemplo a voluntária n° 1 que retornou ao serviço em fevereiro de 2016, porém o teste considerado foi o de novembro de 2018. Ao contrário das voluntárias n° 8 e 12, que retornaram da licença maternidade (6 meses corridos, sem acrescentar férias) e realizaram o TAF um mês depois, ou seja, sete metes após o parto.

 

3.5 Análise do questionário

Paralelo à busca dos resultados dos TAF’s foi aplicado um questionário, a fim de coletar informações à respeito do treinamento físico das voluntárias antes e durante a gestação, bem como após a licença maternidade. Informações sobre o peso e complicações durante a gestação também foram contempladas dentre as perguntas.

A idade gestacional das voluntárias variou de 22 a 35 anos, sendo que a idade predominante foi 30 anos, resposta de três bombeiras.

Um dos questionamentos foi sobre complicações durante a gestação das militares, sendo que oito dentre as treze responderam que sim, houve complicação. Abaixo podemos verificar esse percentual dividido por complicação específica mencionada pelas voluntárias.

Dentre as complicações tivemos a mais frequente foi o descolamento da placenta, citado por 3 voluntárias (4, 5 e 12), sendo que duas (5 e 12) ficaram impedidas de praticar exercício físico em virtude dessa alteração. Das complicações, a mais grave apresentada (voluntária 9) foi o nascimento prematuro do bebê (ocorrido com 27 semanas e 4 dias de gestação), seguido de atonia uterina pós parto, que evoluiu para histerectomia (remoção do útero) total, além de choque hipovolêmico grau 3 e trombose de veia gonodal esquerda. Tal sucessão de complicações exigiu internamento da mãe e do bebê em unidade de terapia intensiva (UTI) por 11 e 52 dias, respectivamente, além do impedimento da prática de exercícios físicos por dois meses, bem como a recomendação de não praticar exercícios moderados e com impacto por seis meses, em virtude da trombose. Em geral, 5 das 8 bombeiras que apresentaram complicações não puderam realizar exercícios físicos durante um período da gestação ou totalmente.

 

Fonte: Seções de Ensino e Instrução (B-3) das unidades consultadas. Elaboração: A autora (2019)

 

Durante a prática de exercício físico pelas gestantes pode ocorrer uma diminuição do fornecimento de oxigênio ao feto e disponibilidade de carboidratos. Porém, isso vem acompanhado de adaptações fisiológicas, tal como o aumento da extração de oxigênio e sua redistribuição intrauterina e hemoconcentração (MANN et al, 2009 apud BESSINGER7, 2003). Clapp (2000) afirma que um programa de exercício físico de moderada intensidade, quando tem início durante a fase hiperplásica do crescimento placentário, por exemplo, tende a melhorar a capacidade funcional placentária, propiciando desta forma uma melhor distribuição de nutrientes e crescimento do feto.

Considerando a prática de atividades físicas pelas voluntárias no período que precedeu a gestação, durante a gestação e após a alta médica durante a licença maternidade, bem como as modalidades informadas pelas bombeiras, tivemos as seguintes respostas:

 

Tabela 4: Prática de exercícios físicos antes, durante e após a gestação

Vol.

At. Fís. antes

Modalidade

At. Fís.

durante

Modalidade

At. Fís. Depois

Modalidade

At. Fís. Pré-

TAF

Modalidade

1

Não

_

Não

_

Não

_

Não

_

2

Sim

Aeróbico+

resistido

Sim

Caminhada

Sim

Caminhada

Não

_

3

Sim

Aeróbico

Sim

Pilates

Sim

Pilates

Não

_

4

Sim

Corrida + yoga

Sim

Caminhada +

yoga

Sim

Trein. funcional

Sim

Trein.

funcional

5

Sim

Aeróbico+

resisitido

Não

_

Não

 

Sim

Corrida

6

Sim

Academia+yoga

Sim

Yoga

Não

Pilates+ corrida

Sim

Pilates +

corrida

7

Sim

Corrida+bike+

natação

Não

_

Não

_

Sim

Pilates +

natação + bike

8

Sim

Spinning+

corrida

Sim

Caminhada+

hidroginástica

Sim

Corrida+

crossfit

Sim

Aeróbico

9

Sim

Crossfit

Sim

Crossfit +

pilates

Não

_

Não

_

10

Não

_

Sim

Pilates+

Caminhada

Não

_

Sim

Corrida+

resistidos

11

Sim

Corrida

Sim

Pilates

Sim

Aeróbico+

resistido

Sim

Caminhada

 

12

 

Sim

Natação+corrida

+ bike+ musculação

 

Não

 

_

 

Não

 

_

 

Sim

 

Corrida

13

Sim

Bike

Não

_

Não

_

Não

_

Total

Sim=84,61%

Não=15,38%

A=10/13 – 76,92%

R=6/13 – 46,15%

Sim=61,53%

Não=38,46%

A=4/13 – 30,77%

R=6/13 – 46,15%

Sim=38,46%

Não=61,53%

A=5/13- 38,46%

R=4/13- 30,77%

Sim=61,53%

Não=38,46%

A=8/13

R=3/13

Vol.= voluntárias; A= aeróbico; R= exercícios resistidos. Fonte: A autora (2019)

 

Observando todas as fases (pré-gestação, durante, pós-gestação - puerpério e retorno ao serviço), a única cujo percentual de praticantes foi inferior ao percentual de não praticantes de atividade física foi o período de licença gestante (38,46% das voluntárias praticaram atividade física), reduzindo mais que a metade quando comparado ao período de maior prática, o pré-gestacional (84,61% de praticantes), visto que aquele é o período de recuperação e, dependendo da situação da mãe, pode variar o tempo de repouso após o parto.

Quanto ao tipo de parto realizado foram obtidas três respostas diferentes no questionário, sendo que 10 bombeiras realizaram cesariana (75%), 2 bombeiras tiveram parto normal (17%) e 1 bombeira realizou o parto humanizado (8%). A maioria das voluntárias realizou parto cesariana seja por opção própria ou por alguma dificuldade no nascimento da criança, como o caso da voluntária 9 que teve parto prematuro.

Por fim, foram tabelados alguns dados das voluntárias, que podem ser utilizados na avaliação ao compararmos com os resultados dos testes, como justificativa do desempenho. Informações como: peso e altura.

 

Tabela 5: Estatura e peso corporal antes, durante e após a gestação

Vol.

Alt.

P1

P2

P3

Dif. P2-P1

% P2-P1

Dif. P2-P3

% P2-P3

1

1,6

47

63

56

+16

+34,04

-7

-11,11

2

1,66

67

78

78

+11

+16,42

0

0

3

1,73

75

89

89

+14

+18,66

0

0

4

1,66

57

71

60

+14

+24,56

-11

-15,49

5

1,65

78

82

82

+4

+5,13

0

0

6

1,6

52

62

52

+10

+19,23

-10

-16,13

7

1,63

56

68

56

+12

+21,43

-12

-17,65

8

1,62

55

68

57

+13

+23,63

-11

-16,18

9

1,63

63

70

70

+7

+11,11

0

0

10

1,58

54

72

52

+18

+33,33

-20

-27,78

11

1,6

60

72

62

+12

+20

-10

-13,89

12

1,56

54

67

52

+13

+24,07

-15

-22,39

13

1,61

62

64

51

+2

+3,22

-13

-20,31

Média

1,62

60

71,23

62,84

11,23

19,60

-8,38

-12,38

D.P.

0,04

8,97

7,77

12,78

4,55

9,23

6,55

9,50

Vol.= voluntária; Alt.= altura; P1= peso antes da gestação (Kg); P2= peso máximo durante a gestação (Kg); P3= peso ao realizar o TAF (Kg); Dif. P2-P1= diferença entre o peso máx. da gestação e peso antes da gestação; % P2-P1= percentual da diferença entre P2 e P1; Dif. P2-P3= diferença entre o peso ao realizar o TAF e o peso máximo da gestação; % P2-P3= percentual da diferença entre o peso máximo da gestação e o peso ao realizar o TAF. Fonte: A autora, 2019.

 

Foram coletados os dados de peso corporal das voluntárias antes da gestação, o máximo atingido durante a gravidez e o peso antes da realização do primeiro TAF após a licença gestante. É possível observar na tabela 5 que a média de peso corporal teve um crescimento de 2,84 Kg dos valores anteriores à gestação comparados aos valores após a licença gestante. Ainda, analisando esses dois dados, verificamos que 8 voluntárias não retornaram ao peso corporal original, sendo que a maior variação foi de 14 Kg e a menor de 2 Kg, dentre as que não recuperaram.

 

4. DISCUSSÃO

Iniciando a análise pelo Teste Shuttle Run, observamos que foi o teste que apresentou maior queda nos índices e pontuação das bombeiras, com 53,84% de voluntárias que pioraram seus resultados. A variação foi de -100% a 18,75% de melhoria.

O teste de força para membros superiores (tração ou isometria na barra fixa, ou flexão de braço no solo) teve um percentual de melhoria e permanência que, somados, superou o percentual de redução de pontos após a gestação, sendo que 16,66% das voluntárias melhoraram as pontuações, 41,66% mantiveram as pontuações e 41,66% pioraram. Lembrando que, em virtude da diversidade de possibilidades para realizar esse teste, estamos focando em pontuações não em índices, pois estes foram representados por repetições de barras fixas, tempo de isometria e repetições de flexões, não existindo outra maneira de equipará-los a não ser pelos pontos obtidos.

O teste de 12 minutos apresentou nos resultados uma melhoria de 38,46%, manutenção de 15,38% e piora de resultados com 46,15%.

Podemos apontar pontos positivos que justifiquem os resultados das voluntárias que melhoraram ou mantiveram as pontuações, tais como: oito militares não tiveram impedimento para realizar atividade física durante a gestação (mesmo três delas tendo complicações); além disso oito dentre as 13 voluntárias praticaram exercícios físicos durante a gestação, dentre eles: caminhada, yoga, pilates, hidroginástica e crossfit (este último enquanto a gestante desconhecia gravidez).

Podemos observar ainda que nove voluntárias tiveram redução de peso antes de realizar o TAF ao retornar para o serviço, sendo que três sofreram uma redução que resultou num peso menor que o anterior à gestação e duas conseguiram igualar o peso após a gestação com o peso anterior a ela.

Como fatores negativos podemos citar que nos períodos gestacional, puerpério e pré- TAF não foi superado o percentual de praticantes de exercícios físicos àquele apresentado antes da gestação. Podemos justificar a última análise em virtude das complicações durante a gestação, bem como a redução de opções de atividades que podem ser realizadas pelas gestantes, o que desprende tempo para deslocar a um local adequado ou depende de condições climáticas e acompanhamento para praticar atividades fora de casa. O Manual de Treinamento Físico Militar do Exército Brasileiro indica exercícios de baixa intensidade, preferencialmente sem impacto e sem contato, como atividades na água para militares gestantes. Informa ainda que devem ser priorizados exercícios que não induzam a realização da manobra de Valsalva durante a gestação; nesse período a percepção de esforço da mulher é maior pelo aumento do consumo de oxigênio, da frequência cardíaca de repouso e no exercício, bem como aumento do débito cardíaco e temperatura corporal, o que acarreta numa fadiga mais elevada para realizar atividades que já eram praticadas anteriormente (MINISTÉRIO DA DEFESA, 2015).

Outro quesito analisado foi o tipo de parto realizado pelas bombeiras, resultando como maioria a cesariana (75%), cirurgia que exige tempo de repouso para cicatrização após sua realização, seguido pelo parto normal, realizado por 17% das bombeiras e, finalmente, uma voluntária (8%) realizou parto humanizado.

 

5. CONCLUSÃO

Através de todos os dados coletados para este estudo, bem como buscando as referências que tratam sobre o assunto, concluímos que as bombeiras militares voluntárias para a pesquisa e que tiveram uma gestação no período entre maio de 2013 e novembro de 2017 apresentaram redução (53,84%) nas pontuações do teste de agilidade Shuttle run, bem como nos testes de força em membros superiores e teste de 12 minutos apresentaram redução de 41,66% e 46,15%, respectivamente, nas pontuações dos TAF’s realizados após a licença maternidade.

Observamos ainda que houve uma queda no número de praticantes de atividade física durante a gestação, após a gestação e no período que antecedeu a realização do TAF, quando comparados ao número de praticantes antes da gestação.

No que tange às complicações, verificamos que apenas 38% (5 voluntárias) não apresentaram algum problema. O mais predominante foi o descolamento de placenta, ocorrido em 23% das bombeiras avaliadas. Em virtude das complicações citadas, 38,46% das voluntárias foram impedidas de praticar exercício físico durante a gestação. Por fim, observamos que oito dentre as treze voluntárias não conseguiram retornar ao peso corporal anterior à gravidez quando avaliadas antes do TAF realizado após a licença maternidade, sendo que a maior variação de antes e depois da gestação e parto foi de 14 Kg e a menor variação de 2 Kg.

Como aproveitamento, esse trabalho poderá embasar e despertar o interesse em realizar pesquisas mais aprofundadas, com dados mais específicos e qualitativos, que tragam novidades quanto ao que pode ser empregado pelas unidades militares e desempenhado pelas próprias gestantes, a fim de que consigam manter um nível de aptidão física adequado para que o retorno ao trabalho e às atividades rotineiras sejam menos prejudiciais ao organismo, ao bebê e com mais qualidade de vida.

 

REFERÊNCIAS

BATISTA, D. C.; CHIARA, V.L.; GUGELMIN, S.A.; MARTINS, P.D. Atividade física e

gestação: saúde da gestante não atleta e crescimento fetal. Rev. Bras. Saúde Matern. Infant., Recife, 3 (2): 151-158, abr. / jun., 2003.

CLAPP III, J.F.; KIM, H.; BURCIU, B.; LOPEZ, B. Beginning regular exercise in early pregnancy: Effect on fetoplacental growth. Am J Obstet Gynecol, 2000;183(6):1484-8.

CLAPP, J.F.; LITTLE, K.D. Effect of recreational exercise on pregnancy weight gain and subcutaneous fat deposition. Med Sci Sports Exerc 1995; 27: 170-7.

COOPER, K.H. A means of assessing maximal oxygen intake. JAMA, n. 203, 1968. GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2002.

MANN,L.; KLEINPAUL J.F.; TEIXEIRA, C.S.; KONOPKA, C.K. Gravidez e exercício

físico: uma revisão. http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Ano 14 - Nº 133 – Junho de 2009.

MINISTÉRIO DA DEFESA, Exército Brasileiro. Manual de Campanha – Treinamento Físico Militar (EB20-MC-10.350), 4ª ed., publicado no Boletim do Exército n° 53, de 31 de dezembro de 2015.

PARANÁ. Constituição do Estado do Paraná, publicada no Diário Oficial no. 3116 de 5 de Outubro de 1989.

PARANÁ. Decreto n° 7339, de 8 de junho de 2010, publicado no Diário Oficial do Estado n° 8236, de 8 de junho de 2010.

PARANÁ. Portaria n° 882, de 04 de outubro de 2012, do Comando-Geral da Polícia Militar do Paraná.

PARANÁ. Portaria nº 759, de 17 de julho de 2014, do Comando-Geral da Polícia Militar do Paraná.

PARANÁ. Portaria n° 076, de 22 de janeiro de 2016, do Comando-Geral da Polícia Militar do Paraná e Anexos.

PARANÁ. Portaria n° 078, de 25 de janeiro de 2016, do Comando-geral da Polícia Militar do Paraná.

PARANÁ. Sistema Business Inteligence da Polícia Militar do Paraná. Acessado em 26 de novembro de 2018.

World Health Organization (WHO). Global recommendations on physical activity for health. Genebra: WHO; 2010. Disponível em: http://whqlibdoc.who.int/publications/2010/9789241599979_eng.pdf. Acessado em fevereiro de 2019.


Anexo A


ANEXO B

QUESTIONÁRIO APLICADO ÀS BOMBEIRAS MILITARES

Nome completo.

Idade atual e idade quando engravidou?

Peso atual, peso antes da gestação, peso máximo durante a gestação e peso ao realizar o TAF após a gestação?

Altura?

Teve complicações durante a gestação? O que? Em qual período? 6- Em caso positivo, impediu a prática de atividades físicas?

Praticava atividade física regularmente antes da gestação? O que? Quantas vezes na semana?

Praticou atividade física durante a gestação? Qual? Com que frequência semanal? Por quanto tempo/trimestre?

Qual o tipo de parto realizado? (normal, cesárea, humanizado etc).

Teve complicações pós-parto que a impediram de praticar atividade física? Por quanto tempo da licença maternidade?

Após a alta médica, praticou atividade física durante a licença maternidade? Qual? A partir de qual mês? Com que frequência semanal?

Ao término da licença maternidade, e outros afastamentos por ventura somados a ela (férias, licença especial etc.), e retorno ao serviço praticou atividade física antes da realização do TAF? Qual? Por quanto tempo e frequência semanal?


1 É importante destacar que o foco deste trabalho são os resultados dos testes de aptidão física das bombeiras militares, por isso serão apresentados somente dados relacionados ao efetivo feminino.

2 Pontuação do TAF: até 35 anos= 150 pontos; de 36 a 45 anos= 140 pontos; acima de 45 anos= 130 pontos.

3 ACOG (American College of Obstetricians and Gynecologists). Exercise during pregnancy and the postpartum period. Washington (DC): O College: 1994.