O INSTITUTO DA COLABORAÇÃO PREMIADA SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 12.850 DE 2013 (LEI SOBRE O CRIME ORGANIZADO)

VIANA, Ivo Vourvupulos1

Resumo:

O presente trabalho tem sua pesquisa lastreada em leis, doutrinas, jurisprudência, artigos e notícias publicadas na internet. Hodiernamente, sabe-se que o crime organizado é um fenômeno global, altamente estruturado, que aprimora seus métodos com velocidade vertiginosa, exigindo por sua vez uma reação eficaz e enérgica por parte do poder público. Em razão disso, o legislador tem aprimorado a legislação e criado mecanismos que visem coibir ou reprimir a criminalidade organizada, ganhando destaque a colaboração premiada, que é utilizada como meio de obtenção de prova para o desmantelamento da associação, sendo o tema de abordagem desse artigo científico. Como forma de contextualizar o estudo, examina-se, inicialmente, a inserção do instituto no ordenamento jurídico brasileiro. Posteriormente, o trabalho se volta para a análise da colaboração premiada com foco na lei que prevê seu regramento (Lei nº 12.850/13). Como objetivo, busca-se analisar a colaboração premiada na esteira da nova lei sobre o crime organizado (Lei nº 12.850/13), especialmente para saber as hipóteses de aplicação e quais requisitos são necessários para torná-la eficaz no caso concreto. Ao final, depois de demonstrados os requisitos e forma de aplicação do instituto, concluiu-se pela utilização da colaboração premiada como medida eficaz para a proteção do bem jurídico social, de modo a concretizar a justiça, a proteção do Estado e o bem estar social.

 

Palavras-chaves: Colaboração premiada. Crime organizado; Inserção do instituto no Ordenamento Jurídico. Análise da colaboração premiada com base na Lei nº 12.850/13.

 

The Institute for Awarded Collaboration Under Law No. 12,850 of 2013 (Law on Organized Crime)

 

Abstract:

The present work has its research backed by laws, doctrines, jurisprudence, articles and news published on the internet. Organized crime is known to be a highly structured, global phenomenon that improves its methods at breakneck speed, requiring in turn an effective and energetic reaction on the part of the public power. As a result, the legislator has improved legislation and created mechanisms to curb or repress organized crime, with emphasis on award-winning collaboration, which is used as a means of obtaining evidence for the dismantling of the association. scientific. As a way of contextualizing the study, it is initially examined the insertion of the institute into the Brazilian legal system. Subsequently, the work turns to the analysis of the collaboration awarded with a focus on the law that provides for its regulation (Law nº 12.850 / 13). The objective is to analyze the collaboration awarded in the wake of the new law on organized crime (Law nº 12.850 / 13), especially to know the hypotheses of application and what requirements are necessary to make it effective in the concrete case. In the end, after demonstrating the requirements and form of application of the institute, it was concluded by using the awarded collaboration as an effective measure for the protection of the juridical social good, in order to realize justice, protection of the State and social welfare .

 

Keywords: Award-winning collaboration. Organized crime; Insertion of the institute in the Legal System. Analysis of the award-winning collaboration based on Law nº 12.850/13.

 

 

 

Introdução:

No atual cenário da criminalidade, especificamente no que toca aos delitos cometidos por organizações estruturalmente ordenadas, detentoras de instrumentos sofisticados e preparo tecnológico avançado para a prática de crimes, ganham imenso relevo os meios alternativos de provas que auxiliam o Estado no combate ao crime organizado. Entres eles, o instituto da colaboração premiada aparece como ferramenta importante para auxiliar o êxito da persecução penal, ao mesmo tempo que, paralelamente, propicia ao delator (autor ou partícipe do crime) os benefícios estabelecidos pela lei, caso sua contribuição seja efetiva a ponto de alcançar quaisquer dos resultados pretendidos pela norma regulamentadora.

A propósito, o crime organizado foi um dos maiores desafios do final do século passado e na atualidade é um dos problemas que assola e inquieta os indivíduos, em particular o Estado, que tem como desafio elaborar, aplicar e promover mecanismos eficazes para reprimir o crime organizado, de maneira a evitar que se prolifere e comprometa a paz social.

Com esse intuito, surge o instituto da Colaboração (Delação) Premiada, que tem aplicação efetiva, porque se explora, de certa forma, a colaboração, como uma medida de política criminal.

Assim, o presente trabalho tem por objetivo analisar o instituto da colaboração premiada na esteira da nova lei que disciplina o crime organizado (Lei nº 12.850/13), pretendendo explorar os requisitos e formalidades que possibilitam sua adoção, bem como ressaltar a importância do instituto no combate ao crime organizado.

Este trabalho não tem a intenção de esgotar os temas que serão aqui examinados, apenas retirar os traços mais relevantes e demonstrar sua importância como meio de enfrentamento ao crime organizado.

 

1. A Introdução da Colaboração (Ou Delação) Premiada na Legislação Brasileira:

A técnica da colaboração premiada é recente na legislação brasileira, especialmente quando se fala de normas positivadas. Entretanto, seu registro histórico dá conta de que lá nas Ordenações Filipinas2, no século XVII, já havia indícios de aplicação do instituto nos crimes denominados de “Lesa Majestade”, com previsão no Livro V, Título CXVI, do Código Felipino, sob a rubrica “como se perdoará aos malfeitores, que derem outros à prisão”.

Fato é que somente na década de 90, já no século XX, a (então) delação premiada passou a fazer parte do ordenamento jurídico brasileiro, com a entrada em vigor da Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072, de 25 de julho de 1990)3. A seguir, outros diplomas legais catalogaram o instituto, sendo eles os seguintes: Lei 8.137/90 (Lei de Crimes Contra a Ordem Tributária, Econômica e Contra as Relações de Consumo), Lei 9.034/95 (Lei do Crime Organizado – revogada pela Lei 12.850/13), Lei 9.080/95 (acrescentou a delação premiada na Lei 7.492/86 – Lei dos Crimes do Colarinho Branco), Lei 9.269/96 (alterou a redação do § 4º do art. 159 do Código Penal – crime de extorsão mediante sequestro), a Lei n. 9.613/98 (Lei de Lavagem de Capitais), Lei n. 9.807/99 (Lei de Proteção a Vítimas e Testemunhas), Lei 11.343/2006 (Lei Antitóxicos) e mais recentemente a Lei 12.850/13 (Lei sobre o crime organizado).

Cabe mencionar que até a entrada em vigor da nova lei dos crimes organizados (Lei 12.850/13) “não havia um regramento mais específico e um roteiro mais detalhado que propiciassem a efetividade da medida4, pois cada uma das normas até então vigentes previa mecanismos distintos para que o delator se beneficiasse do prêmio.

Como a nova lei sobre organização criminosa traz um regramento específico sobre o instituto da colaboração premiada, que de certa forma suplanta as normativas já existentes, por ser mais amplo e detalhado, não há necessidade de analisar de forma pormenorizada as peculiaridades da colaboração existentes em cada diploma legal referido no parágrafo anterior.

 

2. A aplicação da colaboração premiada sob a égide da lei dos crimes organizados (lei nº 12.850/13):

Além de disciplinar os crimes praticados por organizações criminosas, e especialmente dar definição conceitual a esse tipo de delito, a Lei nº 12.850/13 também regulamentou alguns instrumentos de obtenção de provas, entre eles o instituto da colaboração premiada.

Não se nega que há muito tempo esse procedimento investigatório vem sendo adotado no direito brasileiro, da mesma forma que já não resta dúvida da sua eficácia no desmantelamento da criminalidade organizada, mas é importante ressaltar que sua aplicação ganhou maior visibilidade e repercussão, além de constantemente dominar o noticiário no Brasil, a partir de 2005, quando veio à tona o escândalo do “mensalão”, muito em virtude da revelação feita pelo então deputado federal Roberto Jefferson, que apontou a participação de diversos parlamentares e ministros no esquema de corrupção, muitos deles (hoje) já condenados pelo Supremo Tribunal Federal.

Recentemente, explodiu no cenário brasileiro a chamada “Operação Lava Jato”, denominação dada à investigação desencadeada pela Polícia Federal, que desvendou o maior caso de corrupção no Brasil, envolvendo sua maior empresa, a Petrobras. Foi através de informações prestadas pelo doleiro Alberto Youssef e pelo ex-diretor de abastecimento da empresa, Paulo Roberto Costa, em acordo de colaboração premiada, que a Polícia Federal e o Ministério Público Federal descobriram as principais personagens envolvidas no esquema de desvio e lavagem de dinheiro público, fazendo parte desse rol inúmeros políticos do país.

Nesse cenário, é importante esclarecer como se dá a aplicação da colaboração premiada e quais requisitos são necessários para torná-la eficaz, de acordo com a previsão legal da Lei nº 12.850/13.

Inicialmente, cabe referir que o instituto da colaboração premiada, nos termos da lei normativa, é um procedimento decorrente de uma negociação realizada entre os agentes públicos encarregados da persecução penal e um dos integrantes de organização criminosa interessado em auxiliar, de forma voluntária e efetiva, a investigação criminal, para apuração da autoria e materialidade das condutas delituosas praticadas pela organização criminosa.

Pela normativa, os órgãos detentores de atribuição para propor e realizar a colaboração são o Delegado de Polícia, durante o inquérito policial, e o Promotor de Justiça, a qualquer tempo da persecução penal (fase investigativa ou processual). Ressalta-se que é vedado ao juiz participar das negociações, somente podendo atuar depois de realizado o acordo, caso em que deverá homologá-lo ou não.

Nesse ponto, importante destacar que considerável parte da doutrina entende que a norma que atribui ao delegado de polícia a possibilidade de celebrar acordo de colaboração premiada é inconstitucional, pois significa violação ao art. 129, I, da CRFB, que confere ao Ministério Público a titularidade exclusiva/privativa da ação penal.

Para Eduardo Araujo da Silva, a norma é inconstitucional porque, ao conferir tal poder ao delegado de polícia, dispõe de atividade que não lhe pertence, qual seja, “a busca da imposição penal em juízo”, cuja atribuição pertence ao Ministério Público por força constitucional5.

Segundo Renato Brasileiro, por mais que a autoridade policial possa sugerir ao investigado a possibilidade de celebração do acordo de colaboração premiada, não há como se concluir que o Delegado de Polícia tenha legitimidade ativa para firmar tais acordos com uma simples manifestação do Ministério Público. Para o autor, quando a Constituição outorga ao Ministério Público a titularidade da ação penal pública, também confere a ele, com exclusividade, o juízo de viabilidade da persecução penal diante da valoração dos fatos que tenham ou possam ter qualificação criminal. Nesse sentido, diante da possibilidade de o premio acordado com o colaborador repercutir diretamente na pretensão punitiva do Estado, não se poderia admitir a celebração de acordo de colaboração premiada sem a intervenção do Ministério Público como parte principal6.

Divergindo em parte, Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto entendem que somente no caso de o delegado de polícia representar, o Ministério Público emitir parecer contrário e o juiz homologar é que a discussão seria relevante a ponto de verificar a constitucionalidade do dispositivo legal. De acordo com os autores, se o Parquet concorda com a representação, tal manifestação equivale à ratificação do pedido, como se o próprio Ministério Público estivesse o subscrevendo, não havendo motivo para invocar a inconstitucionalidade.

Não obstante os posicionamentos divergentes, crê-se que o ato do delegado de polícia em celebrar acordo de delação premiada e representar pelo perdão judicial do colaborador, a fim de colher subsídios para a investigação criminal, está inserido no âmbito regular das suas atribuições, tal como ocorre, por exemplo, quando representa pela decretação da prisão preventiva (art. 13, IV, do CPP), inclusive na Lei Maria da Penha (art. 20 da Lei nº 11.340/2006), ou pela decretação da prisão temporária (art. 2º, da Lei nº 7.960/89).

É preciso destacar que o Ministério Público é o titular da ação penal e não do direito de punir. A colaboração premiada eventualmente proposta pelo Delegado de Polícia não trata em nenhum momento sobre a ação penal, mas somente sobre questões referentes à pena e sua execução. O direito de ação segue intacto nas mãos do Ministério Público, conforme determina a ordem constitucional. O mesmo ocorre quando o Delegado instaura o Inquérito ou indicia alguém ou mesmo quando não indicia. Em qualquer caso, o Ministério Público não está atrelado à convicção jurídica da Autoridade Policial, podendo pedir o arquivamento de um inquérito com indiciamento ou denunciar alguém que não foi indiciado.

Nada impede o Membro do Ministério Público de discordar de eventual acordo do Delegado em termos de colaboração premiada, mesmo porque a lei obriga sempre a manifestação do Ministério Público. E se esse acordo for homologado à sua revelia pelo Juiz, o que dificilmente ocorrerá, poderá valer-se dos instrumentos processuais disponíveis para garantir seu direito, inclusive do Mandado de Segurança e da Correição Parcial. Talvez nem disso precise, apenas necessitará agir normalmente, intentando a ação penal e desconsiderando o acordo com o qual não tem nenhum liame.

A Propósito, a Lei nº 12.850/13 (art. 4º, § 2º) parece ter vislumbrado a possibilidade de discordância do órgão ministerial em relação à representação do delegado de polícia pela concessão do perdão, pois estabeleceu a aplicação do art. 28 do Código de Processo Penal, quando cabível. A conjugação dos dispositivos em comento dá a entender que o juiz, ao deparar-se com a discordância ministerial, deverá remeter os autos ao Procurador-Geral, a quem caberá dar a palavra final. Nesse caso, se o chefe do Ministério Público concordar com a posição do membro ministerial de primeira instância deverá ser afastada a possibilidade de concessão do perdão judicial.

É bom que se diga que, recentemente, mais precisamente no dia 20 de junho de 2018, o Supremo Tribunal Federal, nos autos da ADI 5508, considerou constitucional a possibilidade de delegados de polícia realizarem acordos de colaboração premiada na fase do inquérito policial. De acordo com a decisão, embora não seja obrigatória a presença do Ministério Público em todas as fases da elaboração dos acordos entre a autoridade policial e o colaborador, o Ministério Público deve obrigatoriamente opinar. No entanto, cabe exclusivamente ao juiz a decisão homologar ou não o acordo, depois de avaliar a proposta e efetuar o controle das cláusulas eventualmente desproporcionais, abusivas ou ilegais.

Portanto, não há mais dúvida sobre a possibilidade da Autoridade Policial celebrar acordos de delação premiada durante a investigação policial.

Superada essa questão, passa-se a análise dos requisitos exigidos pela lei para validade da colaboração premiada. Nos termos do art. 4º, caput, Lei nº 12.850/13, são dois os requisitos (objetivos) exigidos: a voluntariedade do colaborador e a eficácia da colaboração.

Em relação ao primeiro, basta que o agente expresse sua intenção de colaborar de livre vontade, desprovido de qualquer constrangimento ou espécie de coação, seja física ou psíquica, ou ainda de vantagens ilegais não previstas no acordo7, mesmo que a iniciativa seja de um terceiro, como, por exemplo, do seu defensor. Como informa Renato Brasileiro, “é de todo irrelevante qualquer análise quanto à motivação do agente, pouco importando se a colaboração decorreu de legítimo arrependimento, de medo ou mesmo de evidente interesse na obtenção da vantagem prometida pela Lei”.8

A voluntariedade na opção colaborativa do agente é das exigências mais importantes no trato do instituto, razão pela qual o legislador regulamentou a matéria com o propósito de amenizar os riscos de constrangimentos ou coerção na colaboração9. Assim, o § 7º do art. 4º exige que o acordo seja homologado judicialmente, com prévia verificação do juiz, dentre outros aspectos, da voluntariedade do colaborador.

Com o propósito de assegurar a voluntariedade da colaboração, a lei estabeleceu em seu art. 6º, e incisos, que o acordo deve ser elaborado por escrito e assinado por todos os envolvidos, contendo expressamente a declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor. Com o mesmo fim, a lei indica (art. 4º, § 13) a preferência pelo registro dos atos de colaboração pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual.

No tocante ao segundo requisito, que diz respeito à eficácia da colaboração, a Lei nº 12.850/13 exige que ao menos um (não há necessidade de que sejam cumulativos) dos resultados previstos nos incisos do art. 4º seja alcançado em virtude da delação.

Com efeito, será necessário que, a partir das declarações do colaborador, seja possível alcançar um dos seguintes resultados: a) a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas; b) a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa; c) a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa; d) a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa; e) a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.

Preenchidos os dois requisitos objetivos, o agente colaborador fica muito próximo de fazer jus aos benefícios previstos na lei, como a obtenção de perdão judicial, redução da pena privativa de liberdade em até 2/3 (dois terços) ou substituição por restritiva de direitos.

Na verdade, nesse momento, o direito ao prêmio só não é absoluto porque, além dos requisitos antes mencionados, é necessário que as circunstâncias subjetivas previstas no § 1º do art. 4º (requisito subjetivo) sejam favoráveis ao colaborador. Nesse sentido, antes de homologar o acordo e conceder a benesse, deverá o magistrado levar em consideração a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração. Além disso, o juiz poderá ouvir o colaborador, visando apurar se há voluntariedade ou não no ato.

Diante disso, mesmo preenchendo os requisitos objetivos do acordo (voluntariedade e eficácia da colaboração), pode ser que o colaborador não faça jus ao prêmio, caso as circunstâncias subjetivas lhe sejam desfavoráveis. Segundo Vicente Greco Filho, a colaboração e os efeitos não geram automaticamente o direito ao benefício (perdão judicial ou redução de pena), dependendo da apreciação de outras circunstâncias previstas na norma de regência, como a personalidade do agente, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão do fato criminoso e a eficácia da colaboração, as quais deverão ser levadas em conta pelo juiz ao dosar o benefício, o que ocorrerá na sentença de mérito10.

É importante, ainda, esclarecer em que momento a colaboração pode ser realizada. Pela análise conjunta das normas contidas nos §§ 2º e 5º do art. 4º, conclui-se que não há um prazo definido para que o processo cooperativo ocorra, podendo se dar antes de iniciado o processo, durante ou após, inclusive com o trânsito em julgado. Neste último caso, a norma prevê que o colaborador somente poderá ser beneficiado com a redução da pena (até a metade) ou progressão de regime, ainda que ausentes os requisitos objetivos.

Deve ser observado que os requisitos objetivos ressalvados no dispositivo legal para possibilitar a progressão de regime são aqueles previstos na Lei de Execução Penal (LEP), não devendo ser confundido com aqueles previstos no art. 4º, caput e incisos, da Lei nº 12.850/13, que devem ser observados. Conforme apontam Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto, “a colaboração posterior à sentença (que se encontre em grau de recurso ou já transitada em julgado), continua a exigir a observância aos requisitos de voluntariedade e eficácia previstos no art. 4º (sic) da lei11.”

Importante registrar que as partes (tanto Ministério Público ou Delegado de Polícia como o colaborador) podem, antes de homologado o acordo, retratar-se da proposta elaborada (art. 4º, § 10), independente de motivação, caso em que as provas auto incriminatórias produzidas pelo colaborador não poderão ser utilizadas exclusivamente em seu desfavor.

Inclusive, o Ministério Público deixar de oferecer a denúncia, nos casos em que agente (a) não for o líder da organização criminosa e (b) for o primeiro a prestar efetiva colaboração nos termos do art. 4º, § 4º. Como se percebe, a norma legal excepciona o princípio da obrigatoriedade, pelo qual o Ministério Público está obrigado a oferecer a denúncia sempre que presentes a prova da existência do crime e indícios de autoria (art. 24 do Código de Processo Penal). Cabe destacar, que os requisitos referidos devem ser atendidos cumulativamente12 para que o prêmio seja possível.

Na prática, ao deixar de oferecer a denúncia, o Ministério Público está, na verdade, formulando o pedido de arquivamento dos autos referentes ao procedimento da colaboração, condicionado à homologação judicial. Andrey Borges de Mendonça, ao nominar essa espécie de barganha como “acordo de imunidade”, esclarece que no caso do juiz discordar da proposta feita pelo parquet deverá encaminhar os autos aos órgãos de cúpula do Ministério Público (Procurador- Geral de Justiça ou Câmara de Coordenação e Revisão), por aplicação analógica do art. 28 do CPP13.

Em relação à forma e conteúdo do acordo de colaboração, a regulamentação foi inserida no art. 6º da Lei nº 12.850/13 (sem necessidade de transcrição literal).

Sobre o ponto, Renato Brasileiro esclarece que até pouco tempo atrás não havia uma norma expressa que regulamentasse o acordo de colaboração premiada, uma vez que era realizada informalmente, gerando mera expectativa de premiação ao colaborador, caso suas declarações fossem objetivamente eficazes para atingir os resultados previstos nas diversas leis que tratam da matéria14.

Fato é que o regramento do instituto premial, a partir da Lei nº 12.850/13, propicia maiores garantias e segurança ao colaborador, pois preenchidos os requisitos formais e objetivos previstos na lei a concessão de algum benefício é medida que se impõe.

Agora, exige a lei que o acordo seja formulado por escrito, relatando as informações prestadas pelo colaborador e contendo os possíveis resultados advindos das declarações (art. 6º, I). Aqui, a preocupação do legislador foi com a eficácia da colaboração, que, se de fato for positiva para alcançar os objetivos da lei, será homologada judicialmente e o benefício daí advindo deverá ser confirmado na ocasião da sentença condenatória. Cabe destacar que, segundo o inciso II do artigo 6º, deve ser especificado no acordo com qual das benesses o colaborador será agraciado, de modo a garantir maior segurança ao beneficiário.

Também se faz necessário que no acordo conste a declaração de aceitação do colaborador e seu defensor (art. 6º, III), além da assinatura de todos os envolvidos (Membro do Ministério Público ou Delegado de Polícia, colaborador e seu defensor – inciso IV do citado dispositivo). Conforme se infere do mandamento constante no art. 4º, § 15, da Lei nº 12.850/13, a validade do acordo condiciona-se à assistência de um defensor, que deve participar e ratificar todos os atos da colaboração. É nesse momento que será possível aferir a voluntariedade do pedido, como impõe o art. 4º, § 7º da lei15.

Ainda, nos termos do art. 6º, V, deve constar no acordo, caso seja necessário, “a especificação das medidas de proteção ao colaborador e à sua família”, que devem ser aquelas previstas na Lei nº 9.807/99, pelo que se infere do art.5º, I, da Lei 12.850/13.

Andrey Borges de Mendonça ressalta a possibilidade de serem utilizadas outras cláusulas, além daquelas previstas no art. 6º da Lei 12.850/13, para antever eventuais problemas, especialmente à luz do caso concreto. E exemplifica dizendo: “importante o estabelecimento de cláusulas que preveem a rescisão do contrato pelas duas partes, com as suas consequências, bem como a limitação temporal do acordo16.

Importante sinalar as hipóteses de intervenção judicial durante o procedimento da colaboração premiada. Como informado anteriormente, o magistrado não deve participar das negociações realizadas entre as partes (art. 4º, § 6º), isso porque no sistema jurídico penal brasileiro, via de regra17, o juiz não participa da colheita de provas, especialmente na fase de investigações, justamente para não comprometer sua imparcialidade em futuras decisões. Como bem advertem Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar, não cabe ao juiz substituir a atuação das partes na produção probatória, devendo possuir papel meramente complementar, cujo objetivo seja esclarecer dúvida sobre ponto essencial à demonstração da verdade18.

Assim, nos termos do art. 4º, § 7º, da lei de regência, cabe ao juiz homologar ou não o acordo de colaboração formulado pelas partes (delegado de polícia ou Ministério Público e colaborador), devendo, para tanto, verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade, e, se necessário para esse fim, ouvir o colaborador, sigilosamente, na presença de seu defensor.

Observa-se que a finalidade da homologação é, sobretudo, realizar o controle da regularidade, legalidade (ou seja, se foram observados os requisitos, procedimentos e garantias previstos em lei19) e voluntariedade do ato. Neste último caso, com o fim de obter maior certeza, é possível que o juiz realize a oitiva do colaborador, sendo garantida a presença de seu defensor, sem a presença do proponente do acordo (Ministério Público ou delegado de polícia).

Rogério Sanches e Ronaldo Batista Pinto justificam a ausência dos legitimados para proporem o acordo, afirmando que “a presença daqueles que propuseram tais acordos decerto que traria constrangimentos ao colaborador que, talvez por isso, pudesse se sentir inibido em apontar os reais motivos de que levaram a prestar o auxílio20”.

Havendo homologação pelo juízo, o acordo passará a produzir efeitos jurídicos, podendo o colaborador a qualquer tempo ser ouvido pelo membro do Ministério Público ou pelo Delegado de Polícia presidente das investigações, sempre se fazendo acompanhar de seu defensor (art. 4º, §§ 9º e 15). Como informa Vicente Greco Filho, “seguir-se-ão os chamados atos de colaboração, como depoimentos, indicação de locais, identificação de pessoas etc21”. Cabe ressaltar que a homologação não implica a concessão imediata da benesse prevista no acordo, que só ocorre no momento da prolação da sentença judicial, oportunidade em que o juiz aferirá a eficácia da delação (art. 4º, § 11).

Caso opte o juiz por não homologar o acordo de colaboração premiada, em virtude de algum vício na regularidade, legalidade e voluntariedade do ato, duas parecem ser as soluções apontadas pela doutrina, a saber: a) possibilidade de recorrer da decisão, por meio da interposição de recurso em sentido estrito, por aplicação analógica do art. 581, I, do CPP, visto que a lei não fez previsão sobre recurso 22; b) a remessa dos autos ao Procurador-Geral de Justiça ou à Câmara de Coordenação e Revisão, conforme o caso, por aplicação analógica do § 2º do art. 4º da Lei nº 12.850/13, pois o pedido de homologação por parte do órgão responsável pela acusação equivale ao pedido de arquivamento da acusação na fase preliminar, à renúncia integral (perdão) ou parcial (diminuição) de aplicação da pena ou ainda à sua atenuação na forma de cumprimento (substituição da privação de liberdade) na fase judicial, assim como à redução da pena imposta no processo de conhecimento ou à sua atenuação na sua forma de cumprimento (progressão do regime prisional) na fase de execução23.

A lei possibilita ao juiz, ainda, conforme previsão do art. 4º, § 8º, parte final, adequar o acordo ao caso concreto, limitado à observância dos requisitos legais, de modo a evitar “indesejável invasão na esfera privativa de acusação, com inevitável comprometimento da imparcialidade, se implicar alteração do mérito24”.

Não obstante, é no momento da sentença (art. 4º, § 11) que o juiz irá valorar o acordo de colaboração formulado pelo Ministério Público ou Delegado de Polícia e o colaborador, já de posse de todo manancial probatório produzido nos autos.

Resta saber se o juiz estaria vinculado ou não aos termos do acordo. Consoante aponta o § 11 do art. 4º da Lei nº 12.850/13, na sentença o juiz apreciará os termos do acordo e sua eficácia, e disso extrai-se o entendimento de que, caso o colaborador tenha cumprido aquilo que foi pactuado, e algum dos resultados previsto na lei tenha sido alcançado, não restará outra alternativa senão a aplicação do benefício proposto no acordo.

Nesse sentido, Eduardo Araújo da Silva, ao tratar do acordo versando a concessão de perdão judicial, salienta que o juiz deve ficar vinculado ao acordo.25

Ainda sobre a sentença, cabe dar ensejo à previsão do § 16 do art. 4º, a qual estabelece que a condenação não poderá ser fundamentada unicamente com base nas declarações do agente colaborador. Significa dizer que o juiz, antes de prolatar a sentença condenatória dos acusados, deve confrontar a colaboração com outros elementos de prova produzidos nos autos, sopesando seu valor, e a partir daí chegar à decisão final. Segundo informa Andrey Borges de Mendonça, a lei veio reconhecer o que já era pacífico na jurisprudência, no sentido de que o depoimento do colaborador, por si só, não ser o único fundamento da condenação26.

Vencida essa parte, cabe trazer à baila questão intrigante prevista na Lei, que diz respeito à renúncia pelo colaborador ao direito de silêncio durante os depoimentos que prestar, bem como quanto ao compromisso legal de dizer a verdade (art. 4º, § 14). Como é sabido, a Constituição Federal (art. 5º, LXIII) assegura ao investigado/acusado o direito de permanecer em silêncio durante o interrogatório, por isso há quem diga que referida restrição, prevista em norma infraconstitucional, não poderia ser aplicada ao colaborador que figura no processo como corréu, apenas àquele que ostenta condição de testemunha, quando não denunciado pelo Ministério Público. É a posição de Rogério Sanches e Ronaldo Batista Pinto27 e de Cezar Roberto Bittencourt28.

Em sentido oposto, Eduardo Araujo da Silva entende que a restrição imposta pela lei não viola o direito ao silêncio previsto na Constituição, pois o objetivo é afastar qualquer dúvida quanto à espontaneidade da colaboração, ressaltando que se o agente resolveu colaborar, consectário que não poderá ficar calado.

O mesmo entendimento é adotado pelo Promotor de Justiça de São Paulo, Artur Pinto de Lemos, que defende não haver ilegalidade alguma e, tampouco, ofensa ao princípio constitucional do acusado em permanecer em silêncio (art. 5°, inc. LXIII – “nemo tenetur se detegere”). Para o autor, o Colaborador, espontaneamente, sempre pode optar por não exercer seu direito ao silêncio. Não está obrigado a produzir prova contra si, mas prefere fazê-lo como estratégia de defesa e, assim, por coerência, deve renunciar ao exercício da garantia constitucional para fazer jus ao Acordo com o Ministério Público29.

Crê-se que a razão está com última corrente. De início é preciso considerar que o colaborador não está obrigado a firmar o acordo com a Polícia ou Ministério Público. Se optar por não colaborar responderá o processo normalmente, sendo-lhe concedidas todas as garantias previstas legalmente, inclusive o direito de permanecer em silêncio, tanto na fase investigativa como na processual. Porém, se decide voluntariamente colaborar, firmando o acordo com os órgãos competentes (o que não é uma obrigação), necessariamente terá de fazer declarações, assumindo culpa e entregando comparsas, por exemplo, não havendo qualquer afronta à garantia constitucional do silêncio, até porque será feito para trazer benefícios e não malefícios. Quanto ao fato de não poder faltar com a verdade no momento em que presta as declarações, também não se vê qualquer infringência de ordem constitucional. Pensar diferente seria aceitar a hipótese de um eventual colaborador fazer declarações inverídicas, possivelmente atribuindo a responsabilidade do crime aos demais integrantes da facção criminosa, com o único objetivo de se beneficiar, sem qualquer prejuízo da sua conduta. É também conceber que o judiciário e os órgãos de persecução penal sejam utilizados de forma inapropriada, de modo a provocar procedimentos administrativos que não levarão a descoberta da trama criminosa, gerando gastos de verbas públicas e dispêndio de serviço desnecessário, pois a falta de veracidade das informações não acarretará qualquer responsabilidade ao delator.

Sobre essa questão, não há ainda posicionamento majoritário, assim como em relação a outras tantas pertinentes ao tema, cabendo à comunidade jurídica – advogados, membros do Ministério Público, magistrados e doutrinadores – construí-lo a partir da soma de suas experiências, reflexões e trabalho diários.

Para finalizar o estudo sobre o instituto da colaboração premiada, entende-se por bem enumerar os diversos direitos concedidos pela lei ao colaborador, previstos no art. 5º da Lei nº 12.850/13.

Renato Brasileiro avalia que de nada adianta o Estado obter informações privilegiadas, através de um dos integrantes da organização criminosa, se não oferecer ao colaborador, em contrapartida, uma série de direitos que minimizem os riscos da traição por ele praticada30.

Assim, pela redação do inciso primeiro (art.5º), possibilita-se ao colaborador “usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica”, que, como dito linhas atrás, referem-se àquelas previstas na Lei 9.807/99 (Lei de proteção a vítimas, testemunhas e réus colaboradores), sendo elas: a) segurança na residência, incluindo o controle de telecomunicações; b) escolta e segurança nos deslocamentos da residência, inclusive para fins de trabalho ou para a prestação de depoimentos; c) transferência de residência ou acomodação provisória em local compatível com a proteção; d) preservação da identidade, imagem e dados pessoais; e) ajuda financeira mensal para prover as despesas necessárias à subsistência individual ou familiar, no caso de a pessoa protegida estar impossibilitada de desenvolver trabalho regular ou de inexistência de qualquer fonte de renda; f) suspensão temporária das atividades funcionais, sem prejuízo dos respectivos vencimentos ou vantagens, quando servidor público ou militar; g) apoio e assistência social, médica e psicológica; h) sigilo em relação aos atos praticados em virtude da proteção concedida; i) apoio do órgão executor do programa para o cumprimento de obrigações civis e administrativas que exijam o comparecimento pessoal (art.7º da Lei 9.807/99). De acordo com a lei mencionada, é possível, ainda, caso necessário, que o colaborador possa alterar sua identidade, bem como sua família, além de obter prioridade na tramitação do inquérito ou do processo criminal.

O inciso segundo prevê a possibilidade do colaborador ter seu nome, imagem e demais informações pessoais preservados, cujo objetivo principal é preservar sua incolumidade física31, estendido a seus familiares. A importância dessa medida é tamanha que a própria lei sobre organizações criminosas, em seu art. 18, cuidou de tipificar a conduta de “revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador, sem sua prévia autorização”, com pena de reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos e multa.

O inciso terceiro dá o direito de o colaborador ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais acusados, também com o objetivo de garantir sua integridade física, visto que seria extremamente arriscado conduzi-lo na mesma viatura dos demais corréus.

Outro direito estendido ao colaborador (inciso IV) é o de participar das audiências sem o contato visual com os outros acusados, o que pode ser feito via emprego de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de som e imagem em tempo real, por analogia ao art. 255, § 2º, I, do Código de Processo Penal. Nesse caso, para proteger o colaborador é possível distorcer a imagem, de modo a impedir contato visual entre ele e os acusados. Pode, ainda, em último caso, retirar o réu da sala32.

O colaborador ainda tem o direito (inciso V) de não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito. A medida é necessária para evitar que a integridade física e a própria vida do colaborador e seus familiares seja posta em risco. Cabe lembrar que o desatendimento desse direito pode tipificar o crime previsto no art. 18 da Lei nº 12.850/13.

Por fim, o colaborador tem direito (inciso VI) a cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais corréus ou condenados. Conforme assinalam Rogério Sanches e Ronaldo Batista Pinto manter o colaborador junto aos demais condenados “importaria em verdadeira pena de morte, já que “o código de ética” dos marginais não tolera essa espécie de comportamento33”.

Feito tais apontamentos, entende-se que foi possível analisar, ainda que sem esgotar o assunto, a forma como se dá a aplicação da colaboração premiada e quais requisitos são necessários para torná-la eficaz, de acordo com a previsão legal da Lei nº 12.850/13.

 

Conclusão:

O estudo desenvolvido teve por objetivo analisar o instituto da colaboração premiada, em especial os seus requisitos e forma de aplicação, a partir da nova lei sobre o crime organizado, a Lei nº 12.850/13.

Foi visto que, no Brasil, o instituto da (então) delação premiada surgiu na época das Ordenações Filipinas, durante o século XVII, vigorando até o advento do Código Criminal em 1830, quando a delação não foi mais utilizada e nem legislada no ordenamento jurídico brasileiro. Somente no século XX, já na década de 90, a delação passou a fazer parte do nosso sistema jurídico, com a entrada em vigor da Lei nº 8.072/90, que cuida dos crimes hediondos. Posteriormente, outros diplomas legais catalogaram o instituto, sendo eles os seguintes: Lei 8.137/90 (Lei de Crimes Contra a Ordem Tributária, Econômica e Contra as Relações de Consumo), Lei 9.034/95 (Lei do Crime Organizado – revogada pela Lei 12.850/13), Lei 9.080/95 (acrescentou a delação premiada na Lei 7.492/86 – Lei dos Crimes do Colarinho Branco), Lei 9.269/96 (alterou a redação do § 4º do art. 159 do Código Penal – crime de extorsão mediante sequestro), a Lei n. 9.613/98 (Lei de Lavagem de Capitais), Lei n. 9.807/99 (Lei de Proteção a Vítimas e Testemunhas), Lei 11.343/2006 (Lei Antitóxicos) e mais recentemente a Lei 12.850/13 (Lei sobre o crime organizado).

Após, direcionou-se a pesquisa acadêmica para o eixo principal do trabalho, voltado para o estudo da colaboração premiada no sistema penal pátrio, especificamente no tocante aos requisitos e formalidades previstos na lei de regência. Na oportunidade, foi dado destaque aos personagens que figuram no acordo colaborativo, à atuação judicial e aos benefícios e garantias que podem ser concedidos àquele que se dispõe a colaborar com a persecução penal, além de outras particularidades contidas na normativa legal.

Diante da exposição foi possível observar que, ao inserir definitivamente o instituto da colaboração premiada no ordenamento jurídico brasileiro, o legislador buscou uma alternativa para conter os avanços da criminalidade organizada, que cresce e se fortalece a cada dia no seio da sociedade, por se tratar de uma organização estruturalmente ordenada, detentora de instrumentos sofisticados e preparo tecnológico avançado para a prática de crimes.

Para tanto, estrategicamente, o Estado criou incentivos ao coautor ou partícipe do crime organizado que esteja disposto a colaborar com a justiça, tudo com o fito de combater a criminalidade organizada e evitar ou minorar os resultados advindos das condutas por ela praticadas.

Embora não se desconheça os posicionamentos contrários e críticos acerca do instituto em apreço, o que não foi alvo do estudo elaborado, acredita-se que os benefícios trazidos pela contribuição daquele que também tenha participado da conduta criminosa estão muito acima de discussões éticas e morais que cercam o tema e notadamente têm se demonstrado eficazes para o desmantelamento de diversas organizações criminosas.

É sempre preciso considerar que o caráter mutante, difuso, transnacional e operacional dos grupos organizados faz com que o Estado crie novos mecanismos para combatê-los e, nesse sentido, a colaboração vinda de um dos integrantes da facção criminosa facilita e muito a investigação criminal, restabelecendo a ordem jurídica e possibilitando que todos os envolvidos sejam responsabilizados penalmente.

Não se vê qualquer incongruência na possibilidade de estender ao colaborador algum tipo de benefício pelo auxílio prestado à justiça, até porque são reais os riscos a que fica submetido após ter entregado seus comparsas, sendo perfeitamente compreensível que a lei previamente estipule garantias e benesses para atrair algum integrante da organização criminosa que esteja disposto a colaborar.

Portanto, considera-se inegável a contribuição do instituto da colaboração premiada para desarticular a poderosa sistemática de atuação do crime organizado, devendo ser utilizado sem maiores restrições em prol da defesa e proteção dos bens jurídicos tutelados, individuais e coletivos, desde que atendidos os requisitos objetivos e subjetivos previstos na norma que regulamenta a colaboração premiada.

 

Referências Bibliográficas:

ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 7ª ed. rev. e atual. Salvador: Juspodivm, 2012.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Delação premiada na "lava jato" está eivada de inconstitucionalidades. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 04 dez. 2014. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-dez-04/cezar-bitencourt-nulidades-delacao-premiada-lava-jato>. Acesso em 17 abr. 2015.

_____________, Cezar Roberto. Primeiras reflexões sobre organização criminosa. Disponível em <http://atualidadesdodireito.com.br/cezarbitencourt/2013/09/05/primeiras-reflexoes-sobre-organizacao-criminosa/>. Acesso em 18 mar 2015.

CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Crime Organizado: Comentários à nova lei sobre o Crime Organizado - Lei 12.850/2013. São Paulo: Editora JusPodivm, 2014.

GOMES, Luiz Flávio. Definição de crime organizado e a Convenção de Palermo. Disponível em: <http://www.lfg.com.br 06 de maio de 2009>. Acesso em 4 mar. 2015.

_______, Luiz Flávio. Justiça Colaborativa e Delação Premiada. Disponível em http:// www.lfg.com.br - 8 de março de 2010. Acesso em 3 mar. 2015.

GRECCO FILHO, Vicente. Comentários à Lei de Organização Criminosa: Lei nº 12.850/13. São Paulo: Saraiva, 2014.

GUIDI, José Alexandre Marson. Delação Premiada no combate ao crime organizado. São Paulo: Lemos & Cruz: 2006.

JESUS, Damásio E. de. Estágio atual da "delação premiada" no Direito Penal brasileiro. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 854, 4 nov. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/7551>. Acesso em 10 mar. 2015

LEMOS, Artur Pinto de. Delação premiada: posição favorável. Carta Forense, São Paulo-SP: 05 maio. 2014. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/delacao-premiada-posicao-favoravel/13614>. Acesso em 17 abr. 2015

LIMA, Renato Brasileiro. Legislação Especial Criminal Comentada. 2ª Ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2014.

MENDONÇA. Andrey Borges de. A Colaboração premiada e a nova Lei do Crime Organizado (Lei 12.850/2013). Revista eletrônica do Ministério Público Federal: Custos Legis. 4º Vol. 2013. Acesso em 10 abr. 2015.

MOREIRA, Rômulo de Andrade. A nova lei de organização criminosa – lei nº. 12.850/2013. Disponível em <http://romulomoreira.jusbrasil.com.br/artigos/121938874/a-nova-lei-de-organizacao-criminosa-lei-n-12850-2013>. Acesso em 18 mar. 2015.

PACELLI, Eugenio. A Lei de Organizações Criminosas – Lei 12.850/13. Disponível em: <http://eugeniopacelli.com.br/atualizacoes/curso-de-processo-penal-17a-edicao-comentarios-ao-cpp-5a-edicao-lei-12-85013-2/>. Acesso em 4 abr.2015.

PEREIRA, Frederico Valdez. Delação premiada: Legitimidade e procedimento. 2ª Ed. Curitiba: Juruá, 2013.

SANTOS, Daniel Lin. Organizações criminosas: conceitos no decorrer da evolução legislativa brasileira. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 22 maio 2014. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.48208&seo=1>. Acesso em 23 fev. 2015.

SILVA, Eduardo Araújo da. Organizações criminosas: aspectos penais e processuais da Lei nº 12.850/13. São Paulo: Atlas, 2014.

TÓRTIMA, Fernanda Lara e BORGES, Ademar. Os limites da atuação do juiz na delação premiada. Consultor Jurídico, 18 fev. 2015. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2015-fev-18/limites-atuacao-juiz-delacao-premiada>. Acesso em 24 abr. 2015.

VARGAS, Robson de. Normatização da delação premiada é imprecisa. Consultor Jurídico, 24 ago. 2012. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2012-ago-24/robson-vargas-normatizacao-delacao-premiada-imprecisa-problematica>. Acesso em 24 fev. 2015.

 


1 Delegado de Polícia do Departamento de Polícia Civil do Estado do Paraná

2 JESUS, Damásio E. de. Estágio atual da "delação premiada" no Direito Penal brasileiro. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 854, 4 nov. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/7551>. Acesso em: 10 mar. 2015

3 LIMA, Renato Brasileiro. Legislação Especial Criminal Comentada. 2ª Ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2014, p. 107.

4 CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Crime Organizado: Comentários à nova lei sobre o Crime Organizado - Lei 12.850/2013. São Paulo: Editora JusPodivm, 2014, pag. 35.

5 SILVA, Eduardo Araújo da. Organizações criminosas: aspectos penais e processuais da Lei nº 12850/13. São Paulo: Atlas, 2014, p. 59.

6 LIMA, Renato Brasileiro. Legislação Especial Criminal Comentada. 2ª Ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2014, p. 550.

7 MENDONÇA. Andrey Borges de. A Colaboração premiada e a nova Lei do Crime Organizado (Lei 12.850/2013). Revista eletrônica do Ministério Público Federal: Custos Legis. 4º Vol. 2013. Acesso em 10 abr. 2015.

8 LIMA, Renato Brasileiro. Legislação Especial Criminal Comentada. 2ª Ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2014, p. 524/525.

9 PEREIRA, Frederico Valdez. Delação premiada: Legitimidade e procedimento. 2ª Ed. Curitiba: Juruá, 2013, p. 119.

10 GRECCO FILHO, Vicente. Comentários à Lei de Organização Criminosa: Lei nº 12.850/13. São Paulo: Saraiva, 2014, pag. 40.

11 CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Crime Organizado: Comentários à nova lei sobre o Crime Organizado - Lei 12.850/2013. São Paulo: Editora JusPodivm, 2014, pag. 67.

12 Nesse sentido, Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto, Renato Brasileiro e Eduardo Araujo da Silva. Conforme obras já citadas neste trabalho.

13 MENDONÇA. Andrey Borges de. A Colaboração premiada e a nova Lei do Crime Organizado (Lei 12.850/2013). Revista eletrônica do Ministério Público Federal: Custos Legis. 4º Vol. 2013. Acesso em 10 abr. 2015.

14 LIMA, Renato Brasileiro. Legislação Especial Criminal Comentada. 2ª Ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2014, p. 539/540.

15 CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Crime Organizado: Comentários à nova lei sobre o Crime Organizado - Lei 12.850/2013. São Paulo: Editora JusPodivm, 2014, pag. 85.

16 MENDONÇA. Andrey Borges de. A Colaboração premiada e a nova Lei do Crime Organizado (Lei 12.850/2013). Revista eletrônica do Ministério Público Federal: Custos Legis. 4º Vol. 2013. Acesso em 10 abr. 2015.

17 O art. 156 do Código de Processo Penal permite que o juiz, ainda no curso do inquérito civil, determine a produção antecipada das provas reputadas urgentes, em medida de cautelaridade extrema, na expectativa de que não haja perecimento, observando-se a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida.

18 ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 7ª ed. rev. e atual. Salvador: Juspodivm, 2012, p. 397.

19 PEREIRA, Frederico Valdez. Delação premiada: Legitimidade e procedimento. 2ª Ed. Curitiba: Juruá, 2013, p. 142.

20 CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Crime Organizado: Comentários à nova lei sobre o Crime Organizado - Lei 12.850/2013. São Paulo: Editora JusPodivm, 2014, pag. 70.

21 GRECCO FILHO, Vicente. Comentários à Lei de Organização Criminosa: Lei nº 12.850/13. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 43.

22 LIMA, Renato Brasileiro. Legislação Especial Criminal Comentada. 2ª Ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2014, p. 539/546.

23 SILVA, Eduardo Araújo da. Organizações criminosas: aspectos penais e processuais da Lei nº 12850/13. São Paulo: Atlas, 2014, p. 66.

24 SILVA, Eduardo Araújo da. Organizações criminosas: aspectos penais e processuais da Lei nº 12850/13. São Paulo: Atlas, 2014, p. 66.

25 SILVA, Eduardo Araújo da. Organizações criminosas: aspectos penais e processuais da Lei nº 12850/13. São Paulo: Atlas, 2014, p. 63.

26 MENDONÇA. Andrey Borges de. A Colaboração premiada e a nova Lei do Crime Organizado (Lei 12.850/2013). Revista eletrônica do Ministério Público Federal: Custos Legis. 4º Vol. 2013. Acesso em 10 abr 2015.

27 CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Crime Organizado: Comentários à nova lei sobre o Crime Organizado - Lei 12.850/2013. São Paulo: Editora JusPodivm, 2014, pag. 78.

28 BITTENCOURT, Cezar Roberto. Delação premiada na "lava jato" está eivada de inconstitucionalidades. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 04 dez. 2014. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-dez-04/cezar-bitencourt-nulidades-delacao-premiada-lava-jato>. Acesso em: 17 abr. 2015.

29 LEMOS, Artur Pinto de. Delação premiada: posição favorável. Carta Forense, São Paulo-SP: 05 maio. 2014. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/delacao-premiada-posicao-favoravel/13614>. Acesso em: 17 abr. 2015.

30 LIMA, Renato Brasileiro. Legislação Especial Criminal Comentada. 2ª Ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2014, p. 539/546.

31 CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Crime Organizado: Comentários à nova lei sobre o Crime Organizado - Lei 12.850/2013. São Paulo: Editora JusPodivm, 2014, pag. 81.

32 MENDONÇA. Andrey Borges de. A Colaboração premiada e a nova Lei do Crime Organizado (Lei 12.850/2013). Revista eletrônica do Ministério Público Federal: Custos Legis. 4º Vol. 2013. Acesso em 10 abr. 2015.

33 CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista. Crime Organizado: Comentários à nova lei sobre o Crime Organizado - Lei 12.850/2013. São Paulo: Editora JusPodivm, 2014, pag. 83.