GESTÃO DO CONHECIMENTO EM SEGURANÇA PÚBLICA: UM ESTUDO SISTEMÁTICO EM PERIÓDICOS

Felipe Pereira de Melo1

Bruna Hernandes Scarabelli2

Rejane Sartori3

Arthur Gualberto Bacelar da Cruz Urpia4

Nelson Nunes Tenorio Junior5

 

RESUMO

A Gestão do Conhecimento tem se tornado essencial para o desenvolvimento das organizações. No âmbito da Segurança Pública não é diferente, pois possibilita melhor alocação de recursos, eficiência na tomada de decisões, agilidade de processos, entre outros benefícios. Tendo em vista a importância desses dois temas, este estudo busca identificar, por meio de uma revisão sistemática da literatura, os estudos publicados a partir de 2015 no tocante à Gestão do Conhecimento na Segurança Pública. Para tanto, a partir de uma pesquisa bibliográfica, de caráter exploratória e com abordagem qualitativa, os resultados demonstram que publicações de estudos que tratam da Gestão do Conhecimento no contexto da Segurança Pública são atípicas, apontando assim possibilidade de estudos futuros.

Palavras-Chave: Gestão do Conhecimento; Segurança Pública; Inteligência de Segurança Pública.

 

ABSTRACT

Knowledge Management has become essential for the development of organizations. In the area of ​​Public Security is no different, as it enables better allocation of resources, efficiency in decision making, agility of processes, among other benefits. Given the importance of these two themes, this study seeks to identify, through a systematic literature review, the studies published from 2015 on Knowledge Management in Public Safety. Therefore, from an exploratory bibliographic research with a qualitative approach, the results show that publications of studies dealing with Knowledge Management in the context of Public Security are atypical, thus pointing to the possibility of future studies.

Keywords: Knowledge Management; Public security; Public Security Intelligence.

 

 

 

1 INTRODUÇÃO

A criminalidade tem crescido de maneira exponencial na maioria dos estados brasileiros, conforme revelam os dados apresentados no Atlas da Violência, documento produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA) e Fórum Nacional de Segurança Pública (IPEA, 2019), que apresenta indicadores para propiciar um melhor entendimento do processo de acentuada violência no país. Evidente que o problema da Segurança Pública não segue a linha cartesiana, na qual elementos isolados são responsáveis por todo o contexto, mas sim se considera uma perspectiva da Teoria da Complexidade, que de acordo com o sociólogo francês Edgar Morin, fundador da ciência da complexidade, vê o mundo como um todo indissociável. Para Morin (2005, p.188), “[...] complexus é o que está junto; é o tecido formado por diferentes fios que se transformam numa só coisa. Isto é, tudo se entrecruza, tudo se entrelaça para formar a unidade da complexidade [...]”.

Entendendo que a temática Segurança Pública é de elevada complexidade, tem-se claro que a Gestão do Conhecimento pode contribuir significativamente para o gerenciamento das organizações policiais, particularmente no que tange às pessoas, processos e tecnologias envolvidas no sistema. Como afirma Dinelli (2018), é notável que a interação entre os segmentos individuais, empresariais e financeiros trouxe uma dinâmica singular, as quais passaram a ser entendidas como um sistema, isto devido a sua própria complexidade. Imersas em cenários de incertezas, as organizações precisam de soluções adequadas para as necessidades emergentes, o que pode ser alcançado por meio da Gestão do Conhecimento, uma vez que seus objetivos estão ligados à criação, armazenagem e compartilhamento do conhecimento nas organizações, visando à melhoria de processos e tomadas de decisões.

Nesse sentido, este artigo visa identificar, por meio de uma revisão sistemática da literatura, os estudos publicados a partir de 2015 no tocante à Gestão do Conhecimento na Segurança Pública. A relevância deste estudo reside no fato de que se procura demonstrar que embora o conhecimento seja o maior ativo de uma determinada organização, as pesquisas na área da Segurança Pública não seguem o mesmo fluxo.

Desse modo, este estudo está organizado em quatro seções. Além desta Introdução, a seção 2 apresenta a base teórica utilizada para o desenvolvimento do presente estudo. Na seção 3 relata-se a metodologia empregada para o desenvolvimento da pesquisa. Na seção 4 são apresentados os resultados obtidos, seguidos de discussão. Por fim, na seção 5 são expostas as principais conclusões a respeito deste estudo, seguidas das referências.

 

2 BASE TEÓRICA

Nesta seção são abordados os principais conceitos relacionados à Gestão do Conhecimento e Segurança Pública, procurando demonstrar a importância desses termos.

 

2.1 GESTÃO DO CONHECIMENTO

A Gestão do Conhecimento, como disciplina interdisciplinar, é um tema que surge entre os inúmeros e complexos fatores sociais, especialmente após a crise do sistema Fordista de produção em massa, da competitividade dos países asiáticos e da grande crise econômica ocasionada pelo petróleo no mundo durante a década de 1970. Embora tenha surgido entre a década de 80 e 90, a repercussão desse assunto ganha espaço após a crise econômica de 2007, advinda dos subprimes no setor imobiliário norte americano (GOUVEIA, 2009).

As crises no setor econômico produziram uma nova dinâmica no mercado internacional, obrigando o setor privado a se readaptar e buscar constantemente a inovação. Parte da doutrina existente considera, inclusive, que a dinâmica global formou o que se pode chamar de “Era do Conhecimento” (ALVARENGA NETO; BARBOSA; PEREIRA, 2008). Conquanto a temática tenha surgido objetivando sanar as dificuldades no setor privado, os exemplos de sucesso na Gestão do Conhecimento proporcionaram avanços significativos no setor público, visando sua eficácia e efetividade a fim de atender as demandas sociais.

O conceito de Gestão do Conhecimento tem evoluindo ao longo do tempo. No Quadro 1 encontram-se sistematizadas algumas das principais definições existentes na literatura.

 

Quadro 1 - Definições de Gestão do Conhecimento

Autor

Definição

Wiig (1993)

Construção sistemática, explícita e intencional do conhecimento e suaaplicação para maximizar a eficiência e o retorno sobre os ativos deconhecimento da organização.

Nonaka e Takeuchi (1997)

Capacidade que a empresa tem de criar conhecimento, disseminá-lo na organização e incorporá-lo a produtos, serviços e sistemas.

Davenport e Prusak (1998)

Consiste em um ciclo de geração do conhecimento, codificação e coordenação do conhecimento e disseminação do conhecimento.

Bukowitz e Williams (2002)

Processo pelo qual a organização gera riqueza a partir do seu conhecimento ou capital intelectual.

Dalkir (2005)

Coordenação deliberada e sistemática de pessoas, tecnologias, processos e estrutura da empresa na busca da criação de valor através do recurso do conhecimento e inovação.

Fonte: Elaborado pelos autores

 

A capacidade inovadora que a Gestão do Conhecimento propicia no setor privado engloba diversos fatores, como a criação de novos produtos e a melhora de processos. Segundo Oliveira et al. (2018, p. 23),

 

Quando uma organização consegue catalisar o conhecimento individual em prol do conhecimento organizacional e colocá-lo ao seu serviço, atinge patamares de motivação e desempenho dos seus colaboradores que permitem a otimização e inovação que muito beneficiam a si própria.

 

Do mesmo modo que no setor privado, o setor público também tem percebido o conhecimento como insumo estratégico e desse modo, como afirma Wiig (2000), gerenciar o conhecimento torna-se uma responsabilidade dos gestores públicos, com vistas a fortalecer a eficácia do serviço público e agregar valor à sociedade. Batista (2012, p.18) ressalta que “enquanto o setor privado implementa a Gestão do Conhecimento visando ao lucro e ao crescimento, a administração pública busca principalmente qualidade, eficiência, efetividade social e desenvolvimento econômico e social”. Para esse autor, o setor público possui alguns princípios importantes, que são a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Nesse sentido, a Gestão do Conhecimento no setor público, além de proporcionar a construção de um processo de inovação contínuo, voltado para o atendimento das demandas sociais e para a construção de um atendimento de qualidade, permite aos gestores a melhor forma de atuação diante das necessidades emergentes.

A partir de pesquisa sobre o grau de externalização e formalização da Gestão do Conhecimento na Administração Pública, Batista (2012, p. 49) define Gestão do Conhecimento no setor público como

 

Um método integrado de criar, compartilhar e aplicar o conhecimento para aumentar a eficiência; melhorar a qualidade e a efetividade social; e contribuir para a legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade na administração pública e para o desenvolvimento brasileiro.

 

É importante salientar que para a Gestão do Conhecimento funcionar de uma maneira eficaz, deve haver uma harmonização de seus três pilares: pessoas, processos e tecnologia. Apesar da importância desses pilares, Servin e De Brun (2005) consideram que as pessoas são o mais importante, pois possibilitam a criação, a disseminação e a utilização do conhecimento. Nesse sentido, esses autores conduzem a uma importante reflexão acerca da Gestão do Conhecimento no setor público, uma vez que é utilizada na maioria das empresas para obter vantagem competitiva: seu uso justifica-se pela possibilidade de interação entre seus diferentes órgãos, o que pode trazer um impacto positivo na prestação de serviços de qualidade ao cidadão.

 

2.2 SEGURANÇA PÚBLICA

Ao abordar sobre Segurança Pública, evidencia-se de pronto o fato de que se trata de um tema dotado de grande complexidade e de enorme relevância, visto seu caráter de serviço público singular necessário para a tranquilidade pública e paz social. Um exemplo recente que ilustra a magnitude da importância dessa área pode ser observado na crise da Segurança Pública no Estado do Espírito Santo, em 2017, ocasionada pela paralisação dos policiais militares e resultando em um caos absoluto. Em números fornecidos pelo Sindicato dos Policiais Civis do Espírito Santo, em apenas 20 dias constatou-se 204 óbitos por morte violenta (FOLHA VITÓRIA, 2018).

Embora os investimentos em policiamento sejam crescentes, do ano de 2016 para 2017, como mostra o Anuário Brasileiro de Segurança Pública produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), os gastos com informação e inteligência tiveram elevada queda nesse período. Conforme o Anuário 2018, no ano de 2016 o total de gastos com policiamento foi de R$ 25.229.663.473,47, enquanto em 2017 foi de R$ 25.571.052.583,61, ou seja, houve um pequeno aumento de 1,4%. Quanto ao gasto com informação e inteligência, em 2016 totalizou R$1.379.988.443,17, enquanto que em 2017 foi de R$ 623.791.288,18, ou seja, uma queda significativa superior a 50%, mais precisamente, 54,80% (FBSP, 2018). Esses dados encontram-se sistematizados na Tabela 1.

 

Tabela 1 - Gastos em policiamento, informação e inteligência.

Policiamento

 

2016

2017

Variação %

Total

R$ 25.229.663.473,47

R$ 25.571.052.583,61

1,4

União

R$ 1.049.129.325,85

R$1.322.651.000,00

26,1

Unidades da Federação

R$ 21.735.731.900,47

R$ 21.812.264.702,10

0,4

Informação e Inteligência

 

2016

2017

Variação %

Total

R$ 1.379.988.443,17

R$ 623.791.288,18

- 54,80

União

R$ 791.340.963,46

R$ 63.660.000,00

-91,96

Unidades da Federação

R$ 519.694.099,02

R$ 513.125.292,05

-1,26

Fonte: Elaborado a partir de Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2018, p. 62).

 

Desta forma, embora sejam fundamentais os gastos com aquisição de equipamentos, a capacitação e a gestão de informações devem acompanhar o processo. A forte atuação criminosa no Brasil traz em si características únicas, necessitando de manobras e articulações entre os diversos segmentos da segurança pública (SANTOS, 2006).

Segundo a Doutrina Nacional de Inteligência de Segurança Pública (DNISP), a Inteligência de Segurança Pública (ISP) é conceituada como o exercício permanente e sistemático de ações especializadas, a fim de que se possa identificar, avaliar e acompanhar as ameaças de qualquer natureza, sejam elas reais ou potenciais, no âmbito da segurança pública (BRASIL, 2007, apud MOREIRA; FERRO, 2017).

Em geral, na esfera das instituições de segurança pública, os processos relacionados às atividades de Inteligência envolvem os níveis tático, operacional e estratégico (MELO, 2017). As informações e conhecimentos para cada um dos níveis possibilitam a efetividade nas tomadas de decisões, favorecendo a melhor alocação dos recursos e revertendo-se na melhor prestação de serviços para a população.

Hawerrot Filho (2010) menciona que devido a inúmeras restrições orçamentárias, as instituições públicas necessitam adaptar-se e, para tanto, é fundamental a implementação de políticas de informação, analisando-se como os profissionais podem colaborar nos segmentos em que já estão inseridos. Tais contribuições podem favorecer a eficácia e a efetividade em matéria organizacional.

Sendo assim, o aprimoramento das tecnologias, processos e do desenvolvimento pessoal no âmbito da Segurança Pública serve como importante fator para o implemento de ações em benefício de suas instituições e da população.

 

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente estudo, trata-se de uma pesquisa bibliográfica e bibliométrica elaborada a partir de uma revisão sistemática, sendo utilizado o protocolo de Sampaio e Mancini (2007).

O protocolo proposto por Sampaio e Mancini (2007) é composto por 4 etapas, a saber: Etapa 1 – Definição da Pergunta; Etapa 2 – Busca das evidências; Etapa 3 – Revisão e Seleção dos Estudos; Etapa 4 – Análise da qualidade metodológica dos estudos.

Descrição do processo de Revisão Sistemática conforme o Protocolo de Sampaio e Mancini (2007). Fonte: Sampaio e Mancini (2007, p.86).

 

A primeira etapa consistiu na definição do objetivo do estudo, que compreendeu realizar os estudos unindo as perspectivas de Gestão do Conhecimento com Segurança Pública.

Em seguida, foram realizados os processos de identificação das bases de dados a serem consultadas, as palavras-chave e as estratégias de busca. As bases de dados escolhidas foram Dimensions, Web of Science, Scopus e Scielo. As palavras-chave utilizadas foram Knowledge management, public security, police activity, public safety intelligence e police intelligence. A estratégia empregada consistiu na busca por artigos completos, publicados a partir de 2015. Não houve limitação quanto ao idioma de origem.

A pesquisa foi realizada em abril de 2019, sendo que foram encontrados 576 artigos, como apresentado na Tabela 2.

 

Tabela 2 –Resultado das buscas por bases de dados

Palavras-chave

Dimensions

Web of Science

Scopus

Scielo

Total

Knowledge management AND public security

204

233

33

10

480

Knowledge management AND police activity

18

20

02

1

41

knowledge management AND public safety intelligence

0

5

0

0

5

knowledge management AND police intelligence

29

07

14

0

50

Total

576

Fonte: Elaborado pelos autores com base nos dados da pesquisa.

 

Na sequência, seguindo as etapas propostas por Sampaio e Mancini (2007), foram definidoscomo critérios para a seleção dos artigos obtidos a partir da busca a avaliação dos títulos e dos resumos. Para tanto, inicialmente efetuou-sea leitura do título de todos os artigos para verificar o alinhamento destes com a pesquisa. Foram considerados apenas os artigos que continham a expressão “Segurança Pública” ou outro termo que tangenciasse esse tema. Com essa seleção, chegou-se a um número de 41 artigos.

Dando continuidade ao processo de filtragem, foram realizadas leituras dos 41 resumos dos trabalhos selecionados, sendo que 35 foram excluídos em razão do não alinhamento com a pesquisa, resultando, desse modo, em seis artigos para a leitura completa.

A partir da leitura integral desses seis artigos, selecionaram-se quatro trabalhospara compor os estudos a serem analisados nesta pesquisa, uma vez que estes, de fato, estavam alinhados com o tema de objeto de estudo,ou seja, abordavam especificamente sobre Gestão do Conhecimento e Segurança Pública.

Por fim, a última etapa proposta por Sampaio e Mancini (2007) é a validação da qualidade. Para isso, esses autores recomendam o uso de escalas como Delphi, critérios de Maastricht, escala de Jadad. Entendendo que essas escalas são utilizadas na área de saúde, esta etapa não foi aplicada neste estudo.

Na seção seguinte apresenta-se a análise dos resultados obtidos.

 

4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

 

A partir dos resultados obtidos conforme os critérios estabelecidos na seção anterior, foi iniciado o processo de análise dos dados. Assim, inicialmente realizou-se a identificação dos periódicos em que os artigos estão publicados, tendo como base a sua classificação Qualis (sistema brasileiro de avaliação de periódicos mantida pela CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). Desta forma, considera-se que

 

[...]afere a qualidade dos artigos e de outros tipos de produção, a partir da análise da qualidade dos veículos de divulgação, ou seja, periódicos científicos. A classificação de periódicos é realizada pelas áreas de avaliação e passa por processo anual de atualização. Esses veículos são enquadrados em estratos indicativos da qualidade - A1, o mais elevado; A2; B1; B2; B3; B4; B5; C - com peso zero (CAPES, 2014).

 

Desse modo, é possível observar no Quadro 4 que três, dos quatro artigos selecionados para compor o portfólio bibliográfico desta pesquisa, foram publicados em periódicos internacionais; cada um dos artigos foi localizado em base de dados diferente; e dois foram publicados em revistas classificadas com Qualis B2, um em A2 e um em A1.

 

Quadro 2 -Artigos selecionados e respectivos periódicos,Qualis e bases de dados.

Artigo

Periódico

Qualis

Base

Use of Organizational Memory Systems in a Police Organization

International Journal of Knowledge Management

B2

Web of Science

Efetividade do Crowdsourcing como Apoio à Segurança Pública

Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Administração

A2

Scielo

The ChequeredPastandrisky Future of Digital Forensics

Australian Journal of Forensic Sciences

B2

Scopus

Police Intelligence: Connecting-the-dots in Anetwork Society

Policing& Society

A1

Dimensions

Fonte: Elaborado pelos autores com base nos dados da pesquisa.

 

No Quadro 3 são apresentados esses artigos e respectivos autores, sendo possível observar que não houve publicações distintas de um mesmo autor.

 

Quadro 4 - Artigos do portfólio bibliográfico e autores

Artigo

Periódico

Use of Organizational Memory Systems in a Police Organization

Denise de Cuffa, Rodrigo Kraemer e Andrea Valéria Steil

Efetividade do Crowdsourcing como Apoio à Segurança Pública

João Moisés Brito Mota e Afonso Carneiro Lima

The ChequeredPastandrisky Future of Digital Forensics

Eoghan Casey

Police Intelligence: Connecting-the-dots in Anetwork Society

Ryan Sinclair Cotter

Fonte: Elaborado pelos autores com base nos dados da pesquisa.

 

Ademais, verifica-se que a participação de autores nacionais e internacionais é a mesma, ou seja, 50% dos artigos foram elaborados por autores nacionais e os outros 50% por autores internacionais. Os autores nacionais são dos estados de Santa Catarina e Ceará, da Universidade Federal de Santa Catarina e Universidade de Fortaleza; já os internacionais são originários da Suíça e Estados Unidos, das IES Universidade de Lausanne e Universidade de Maryland, respectivamente.

Posteriormente, foram identificadas as palavras que mais se repetem ao longo daqueles estudos e desse modo, com a utilização do Software Atlas TI, uma nuvem de palavras foi criada, conforme mostra a Figura 1.

 

Figura 1 - Nuvem de palavras

Fonte: Elaborado pelos autores com base nos dados da pesquisa.

 

Como pode ser observado na Figura 1, dentre as palavras que mais frequentes nos artigos que compõem o portfólio bibliográfico desta pesquisa estão inteligência, informações, forense, conhecimento e digital/digitais.

A partir da leitura completa dos quatro artigos selecionadosfoi possível perceber que a temática Gestão do Conhecimento no contexto da Segurança Pública circunda principalmente estudos policiais, utilizados principalmente para melhorar a eficiência dessas organizações. Assim, pode-se inferir que o tema é ainda pouco estabelecido na literatura, o que aponta para uma lacuna teórica que demanda, desse modo, a necessidade de futuras pesquisas acerca desse assunto. O artigo intitulado “Use of Organizational Memory Systems in a Police Organization”, de autoria de Denise de Cuffa, Rodrigo Kraemer e Andrea Valéria Steil e publicado em 2008, teve por objetivo identificar sistemas de memória organizacional e seu uso para a realização de atividades diárias em uma organização policial. Esses autores definem um Sistema de Memória Organizacional (SMO) como o meio que as organizações utilizam para reter e reutilizar o conhecimento disponível.

Cuffa, Kraemer e Steil (2008) utilizaram como instrumentos de coleta de dados a aplicação de questionários e observação. A pesquisa foi realizada em uma grande organização policial brasileira, a Polícia Rodoviária Federal (PRF), com funcionários da área administrativa e operacional. Os autores analisaram a relação entre a área de atuação do colaborador e como/por quais meios o colaborador acessa uma informação, quando necessário.Procuraram ainda identificar e caracterizar o SMO usado para acessar o conhecimento organizacional. Dos 10.000 questionários enviados, os autores obtiveram um retorno de 782 questionários válidos. A amostra foi composta de 250 funcionários da área administrativa e 482 de área operacional, totalizando 782 profissionais.

Os resultados revelaram que os SMOs utilizados pela instituição são divididos em meios internos (painel da PRF, e-mail, redes de arquivos, placas de observação e redes sociais das pessoas) e externos (redes sociais públicas e comerciais baseadas na tecnologia não fornecida pela organização, como Facebook e WhatsApp). Atribuem a diferença dos resultados entre a área administrativa e operacional pela natureza do trabalho realizado, uma vez que a área operacional requer informações relacionadas com a execução do trabalho de polícia, de forma rápida, enquanto que o colaborador da área administrativa tem mais tempo para pesquisar as informações que necessita(CUFFA; KRAEMER; STEIL, 2008).

Como conclusões do estudo os autores mencionaram que apesar da maioria dos sistemas existentes na PRF só terem conteúdo explícito, os mais utilizados são aqueles com conteúdo tácito, como redes sociais, sendo que os SMOs mais utilizados são conversas com colegas e WhatsApp (CUFFA; KRAEMER; STEIL, 2008).

O artigo intitulado “Efetividade do Crowdsourcing como Apoio à Segurança Pública”, de autoria de João Moisés Brito Mota e Afonso Carneiro Lima e publicado em 2018, apresenta uma investigação em um período futuro de cinco anos (2017-2022) do uso de Crowdsourcing, ou seja, a produção colaborativa para desenvolver produtos/serviços ou soluções organizacionais no âmbito da segurança pública, mais precisamente junto a membros da Polícia Judiciária do Estado do Ceará que desempenham papel investigativo. Foi utilizado o método Delphi para analisar o Crowdsourcing, os recursos necessários e os impactos na atividade investigativa, entre outros. Para a pesquisa foram selecionados 29 potenciais beneficiários das informações da plataforma de Crowdsourcing na primeira rodada e 21 na segunda.

Com a pesquisa os autores concluíram que cidadãos e profissionais da segurança pública reconhecem a importância do compartilhamento de informações/conhecimento, mas quando envolve a participação da alta administração (como tomadas de decisões, planejamento em Crowdsourcing),os especialistas não acordaram uma postura em relação à efetividade, o que mostra a carência do aproveitamento das novas tecnologias na segurança pública (MOTA; LIMA, 2018).

O artigo intitulado “Police Intelligence: Connecting-the-dots in Anetwork Society”, de autoria de Ryan Sinclair Cotter e publicado em 2017, teve como propósito discutir sobre a importância do compartilhamento de informações, demonstrando ser este processo fundamental para a eficiência da Inteligência Policial.

Dentre os pontos impactantes dos resultados da pesquisa Cotter (2017) percebeu que devido à necessidade de conhecer, há uma grande dificuldade em aceitar a criação de um sistema padrão, pois a desconfiança com relação ao sistema de dados ainda é uma constante. Além disso, o estudo verificou a confiança nos bancos de informações formais quando comparadas com a rede social informal para troca de informações. Demonstrou que há uma grande resistência quanto ao compartilhamento de conhecimento sensível, mas que as redes informais acabam suprindo eventuais necessidades. Para o autor não se trata de uma sugestão de substituição de bancos físicos ou digitais de informações, mas sim de que há necessidade de maior delineamento na perspectiva e aprimoramento na troca de informações.

Tendo em vista que um dos temas de maior importância na Gestão do Conhecimento se trata do processo de compartilhamento de informações para que assim se produza conhecimento, considera-se esse artigo extremamente pertinente para discutir aspectos fundamentais para a melhor tomada de decisões no âmbito da Segurança Pública.

Por fim, o artigo intitulado “The Chequered Pastandrisky Future of Digital Forensics”, de autoria de Eoghan Casey e publicado em 2019, discute especialmente sobre a estratégia da Gestão do Conhecimento na construção das necessidades de ciências forenses, investigações e inteligência, em um sistema de ecossistema forense digital, como forma de melhorar o valor social e sua contribuição. O autor não deixa claro o conceito de “ecossistema forense digital, permeando dúvidas sobre sua definição.

Casey (2019) menciona que a transdisciplinaridade surge como elemento complexo no tocante à resolução de crimes, sendo que a combinação de estratégias envolvendo processos, pessoas e tecnologia é fundamental. Destaca também que o compartilhamento de informações deve ser uma constante, criando as interações necessárias para a produção de conhecimentos. O autor conclui afirmando que as disciplinas forenses podem beneficiar-se de maneira exponencial ao unir os conhecimentos especializados em laboratórios forenses com capacidades forenses descentralizadas nas mãos das polícias e demais segmentos profissionais.

Desta feita, pode-se perceber que os assuntos discutidos no decorrer do artigo estão em consonância com a temática Gestão do Conhecimento, sob a perspectiva de que a troca e o compartilhamento de informações produzem maior eficiência e eficácia no trato com a resolução dos problemas transdisciplinares encontrados na esfera da segurança pública.

 

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao se realizar a revisão sistemática da literatura, utilizando como base a Gestão do Conhecimento na Segurança Pública, almejou-se identificar quais estudos têm sido produzidos nessa área em âmbito nacional e internacional.

A pesquisa exploratória, realizada em abril de 2019, utilizou os passos propostos por Sampaio e Mancini (2007). As bases de dados utilizadas foram Dimensions, Web of Science, Scopus e Scielo, as palavras-chave empregadas foram knowledge management, public security, Police activity, public safety intelligence e police intelligence, considerando-se ainda um recorte temporal a partir de 2015. Desse modo, foram selecionados cinco artigos para compor o portfólio bibliográfico desta pesquisa, sendo que apenas quatro contemplavam a junção de Segurança Pública e Gestão do Conhecimento em seu conteúdo. Os resultados demonstram que poucos são os estudos publicados que tratam da Gestão do Conhecimento na Segurança Pública, revelando assim haver uma lacuna que deve ser preenchida, uma vez que Segurança Pública é um tema de alta relevância, fundamental para a paz social de todas as nações

 

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WIIG, K. M. Application of knowledge management in Public Administration. Public Administration of the City of Taipei, Taiwan, ROC. May, 2000. Disponível em: <http://www.krii.com/downloads/km_in_public_admin_rev.pdf>. Acessoem: 10 maio 2019.

WIIG, K. M.; Knowledge management foundations: thinking about-how people and organizations create, represent, and use knowledge. Texas: Schema Press, 1993.

 


1Mestre em Gestão do Conhecimento nas Organizações pelo Centro Universitário de Maringá – UNICESUMAR. felipedemelo.esc@gmail.com

2Mestra em Gestão do Conhecimento nas Organizações pelo Centro Universitário de Maringá – UNICESUMAR. scarabellibruna@gmail.com

3 Orientadora. Docente do Programa de Pós-Graduação em Gestão do Conhecimento nas Organizações da Unicesumar. Pesquisadora do ICETI. rejane.sartori@unicesumar.edu.br.

4Orientador. Vice-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Gestão do Conhecimento nas Organizações da Unicesumar.arthur.urpia@unicesumar.edu.br

5Orientador. Docente do Programa de Pós-Graduação em Gestão do Conhecimento nas Organizações da Unicesumar.nelson.tenoriojr@gmail.com