POPULISMO PENAL: A REPÚBLICA, O DISCURSO POLÍTICO E INDEVIDA UTILIZAÇÃO DO DIREITO PENAL

Gerson Faustino Rosa1

 

Resumo: Trata da indevida utilização política do Direito Penal, como instrumento populista para ampliação do colégio eleitoral, valendo-se para tanto, da promessa de mais prisões, da bravata discursiva, da restrição das liberdades, dos discursos de ódio e da segregação social. Para tanto, perpassa pelas lições socráticas de como deveriam se portar os governantes, abordando a formação ideal dos ocupantes de cargos políticos e denunciando a desonestidade intelectual dos sofistas. Destaca o comportamento oportunista e lamentável dos candidatos e dos eleitos que, priorizando fortalecer sua popularidade política, a obtenção de votos e a consequente manutenção no poder, prometem uma suposta e falsa sensação de segurança, através da apresentação (política) de soluções comezinhas e equivocadas, valendo-se sobremaneira dos sentimentos e das paixões do homem, bem como das tormentas e inquietações hodiernas, em detrimento dos reais interesses do povo.

Palavras-chave: Populismo Penal; Discurso Político; Despotismo.

 

Abstract: This research deals with the undue political use of Criminal Law as a populist instrument to expand the electoral college, making use of the promise of more prisons, discursive bravado, restriction of freedoms, hate speech and social segregation. For that, it goes through the Socratic lessons of how the rulers should behave, approaching the ideal formation of the occupants of political positions and denouncing the intellectual dishonesty of the sophists. It highlights the opportunistic and regrettable behavior of candidates and elected officials who, prioritizing to strengthen their political popularity, obtaining votes and the consequent maintenance of power, promise a supposed and false sense of security, through the (political) presentation of trivial and wrong solutions, making use of man's feelings and passions, as well as of today's storms and anxieties, to the detriment of the real interests of the people.

Keywords: Penal populism. Political speech. Despotism

 

 

INTRODUÇÃO

Principal discípulo de Sócrates, Platão, que descende de família aristocrata de atenienses, nasceu na Ilha de Egina, em 428 a.C., e faleceu possivelmente, em 348 a.C., aos 80 anos de idade. Platão conheceu seu mestre aos 20 anos de idade, tornando-se seu aluno mais assíduo. Esse contato, entretanto, durou cerca de uma década, quando em 399 a.C., Sócrates faleceu depois de ter sido condenado - por ateísmo e corrupção do caráter dos jovens atenienses2 - pelo Conselho de Justiça de Atenas, e ingerido um cálice de cicuta3.

O verdadeiro nome de Platão era Aristócles, e segundo seus historiadores, o apelido é em decorrência de seu vigor físico e da largueza de seus ombros (platos – largueza, largo). Em 384 a.C, Platão fundou sua própria escola, denominada Academia, situada nos jardins do subúrbio de Atenas, onde formou seu maior discípulo, Aristóteles4.

Platão influenciou sobremaneira na racionalidade do pensamento ocidental5, ao postular que o conhecimento filosófico decorre da relação entre as sensações (corpo) e o pensamento (alma). Para ele, as sensações representariam o conhecimento obtido empiricamente, através dos sentidos corporais6. O pensamento, por sua vez, refere-se ao conhecimento científico, obtido a partir da alma, grande responsável por aproximar o indivíduo das formas inteligíveis e também, afastá-lo, o máximo possível, das paixões, pois o corpo é um obstáculo para a aquisição do saber. Verifica-se que Platão, com essa ontologia, prepara o caminho para uma moral, de modo que, para ele, semelhante tomada de conhecimento não consiste simplesmente num processo teórico, mas resulta de uma transformação profunda da alma. Daí que o afastamento do corpo não é apenas um ato de abstração intelectual, mas sobretudo, uma reforma prática e existencial. Por isso dizer que “o corpo nos sujeita a paixões, desejos e temores de toda a natureza, nos torna cobiçosos de riqueza, nos lança em guerras, nos escraviza”. Logo, se a alma é imortal e destinada a uma vida futura, é preciso viver já, e na medida do possível, pela virtude, longe dos prazeres corporais, com temperança e justiça7. O que só é possível a partir da obtenção do conhecimento científico (filosófico), pois a realidade das formas e a afinidade que com elas temos, em virtude de sermos alma, prescreve-nos esse modo de vida como único capaz de proporcionar a plenitude de nosso ser e, portanto, a autêntica felicidade.

Na mesma linha de seu mestre, Platão defendeu arduamente que o conhecimento levaria à virtude e, por consequência, ao caminho do bem e da felicidade. E somente a virtude poderia nortear a ação da alma, evitando-se os vícios ligados ao corpo, de modo que “pela educação do corpo e do espírito o homem conseguiria superar os problemas da vida, inclusive os de ordem moral”8. Nesse passo, Platão é tido também, como um dos fundadores da Filosofia Política, pois é sua obra que traceja as primeiras investigações do agir humano em comunidade. Nos diálogos de A República, encontramos “as cartas de um jogo que não conseguimos parar de jogar”9.

Diante de tamanha inquietação, propõe-se uma reflexão acerca das insignes lições cravadas pelo filósofo em face realidade político-social factual de uma convivência humana fortemente influenciada pela desinformação, uma época em que a arte da mentira abala as próprias fundações da democracia e do mundo como o conhecemos. Como podemos defender a verdade em uma época de mentiras, e dos chamados fatos alternativos?10

Eis que num cenário incrementado por tantas inverdades e incertezas, o populismo (sobretudo o penal) ocupa o espaço da dúvida ofertando uma suposta e falsa sensação de segurança, através da apresentação (política) de soluções comezinhas e equivocadas, valendo-se sobremaneira dos sentimentos e paixões do homem, bem como das tormentas e inquietações hodiernas. Empregar-se-á, para tanto, os métodos lógico-dedutivo e indutivo-argumentativo, através de análises fundamentais e qualitativas, tendo como recursos bibliografia nacional, estrangeira e periódicos.

 

1 CONHECENDO O PENSAMENTO PLATÔNICO A PARTIR DA OBRA A REPÚBLICA: REFLEXÕES SOBRE O BOM GOVERNO

A República é um compilado de diálogos da maturidade de Platão, dos quais são personagens Sócrates, Glauco, Polemarco, Trasímaco, Adimanto e Céfalo. Em tais diálogos, o autor, afastando-se de sua fase socrática, de juventude, porém, bastante influenciado pelos ensinamentos obtidos de seu grande mestre, apresenta diálogos sobre a administração e o funcionamento das cidades, o papel que devem desempenhar os cidadãos (governantes, guardiões e artesãos), além de discorrer sobre uma série de importantes conceitos, como o de justiça, virtude, educação, entre outros11.

Saliente-se que, para melhor entender a obra, deve-se considerar o estado de coisas vigentes em que os diálogos se desenvolveram, bem como os fatores que motivaram o filósofo a exteriorizar as aspirações de reformas que pretendia para Atenas. Nesta senta, referindo-se às suas aspirações juvenis de uma vida política, natural a um bem nascido ateniense, Platão descreve os acontecimentos que, gradativamente, foram afastando-o de qualquer pretensão nesse sentido.

Numa Atenas recém-derrotada pelos espartanos, o poder esfacelado dá margem à chamada “tirania dos Trinta” 12, cujo procedimento e cujas consequências, a corrupção dos costumes, provocam no jovem repulsa em Platão. Mas o momento mais crítico é o da condenação de Sócrates, seu mestre, “o mais justo de então”, fato que denota cabalmente a impossibilidade de recuperação de uma cidade perdida13. Daí a manifestação do jovem filósofo:

“Finalmente pensei sobre todas as cidades atuais, que são mal administradas, pois suas leis são praticamente incuráveis, sem uma notável preparação com sorte, e fui forçado a afirmar, louvando a correta filosofia, que a partir dela é possível ver o que é justo na cidade e no particular. Não terminarão os males para a raça humana, portanto, antes que a raça dos que filosofam correta e verdadeiramente chegue ao poder, ou que a raça dos que nas cidades detêm o domínio, por um destino divino, realmente filosofe”14.

 

Na Grécia antiga, sobretudo em Atenas, os sofistas ensinavam aos jovens de famílias abastadas sobre como desenvolver aquilo que seria tomado como instrumento indispensável para a atuação política: o bom uso da palavra nas assembleias e tribunais, instituições eminentemente democráticas. Assim, o sofista conquista a sua importância porque domina um certo saber, a retórica, e ensina os meios eficazes para a produção da fala persuasiva, para empregar a palavra (lógos). Daí que, a influência de Sócrates, aliada a uma preocupação primordial com a política, colaborou para a tomada de consciência da necessidade da elaboração de uma filosofia “correta e verdadeira”, contrária aos sofistas.

Assim, o platonismo surge como crítica a esse “falso conhecimento” dos sofistas. De certo modo, Sócrates representou para Platão essa nova “visão de mundo”, seja pelas rigorosas exigências implícitas em suas indagações, seja em virtude de sua conduta na cidade, de irrepreensível coerência com seu ensino, o que lhe custou a acusação no tribunal e sua condenação e morte15.

A defesa platônica de uma nova visão das coisas, em face da tradicional retórica e da robustecida sofística, é sobretudo, uma defesa de Sócrates. A constante interrogação socrática, associada ao seu modo de vida impede que se confunda o ensino da “verdadeira filosofia” com o ensino da arte de persuasão tão frequente em Atenas. “A República” constitui um esforço para evitar essa confusão, retomando o desenvolvimento das principais características desse socratismo. Dito de outro modo, a obra de Platão surge, com o intuito de, sob a influência de Sócrates, elaborar uma filosofia política correta e verdadeira16.

A cidade só poderia ser tida como justa se fosse a verdadeira expressão da realidade. E somente o conhecimento dessa realidade poderia proporcionar a compreensão de como a cidade deve ser. E o governo só poderia caber a quem detivesse esse conhecimento. Assim, a boa legislação serviria para preservar a cidade, sua utilidade e identidade, ou seja, o interesse público.

Com isso, Platão “requalifica” a filosofia, atribuindo a ela “novo (e verdadeiro) sentido”, que desqualifica pretensos saberes que deverão ser considerados tentativas de usurpação ilegítima de um título que pertence apenas a essa autêntica e inédita filosofia. Essa é a tese nuclear do diálogo de Platão. A república platônica, no entanto, é muito criticada e tida como utópica, inalcançável.

Nesse passo, buscando diferenciar o que seria a justiça e a injustiça, Sócrates e seus interlocutores, no Livro II, começam a imaginar o que viria a ser a “cidade ideal”:

“Então, Gláucon e os outros começaram a pedir que, usando todos os recursos, eu a socorresse e não desistisse da discussão, mas, ao contrário, examinasse a fundo o que são a justiça e injustiça e qual é a verdade sobre a utilidade de ambas. Expus, então, meu parecer:

A pesquisa que empreendemos não é de pouca monta, mas, pelo que se mostra, é tarefa para alguém de olhos perspicazes. Então, disse eu, já que não somos hábeis, parece-me bom fazer, sobre essa questão, uma pesquisa como esta. Alguém manda que pessoas que, de maneira alguma, enxergam bem leiam letras bem pequenas, vendo-as de longe... Depois alguém percebe que é possível ler as mesmas letras também em outro lugar. Mas em tamanho maior e com maior espaçamento. Para tais pessoas, creio, será como um achado, primeiro lê-las em tamanho maior e, depois, examinar se as menores coincidem com elas.
- Muito bem disse Adimanto. Mas, Sócrates, e o que vês de semelhantes a isso na pesquisa sobre a justiça?
- Eu já te digo... disse. A justiça, afirmamos nós, é própria de um indivíduo... É também própria da cidade toda?
- Sem dúvida, disse ele.
- E a cidade é maior que o indivíduo?
- Maior, disse.
- Ora, num espaço maior, talvez haja mais justiça e seja mais fácil entende-la. Se quiserdes, portanto, primeiro examinemos como ela é nas cidades; depois a examinemos no indivíduo, procurando na forma da menor a semelhança com a maior.
- Penso que está bem como dizes, disse.
- Então, disse eu, será que, se imaginássemos ver o nascer de uma cidade, também veríamos o nascer de sua justiça e também o de sua injustiça?
- Talvez, disse ele.
- Depois disso, poderíamos ter esperança de ver com maior facilidade o que buscamos?
- Muito mais.
- Parece-te, então, que devemos tentar levar a termo nossa pesquisa? É que isso não nos dará pouco trabalho... Atentai bem, portanto!
- Para nós já está decidido, disse Adimanto. Não desistas!17

 

Verifica-se que, considerando que a cidade é maior que o indivíduo, e composta por este, Platão sugere que se busque o “justo” e o “injusto” na cidade, para só então, encontra-los em cada um. Ideia fundamental no pensamento de Platão, a passagem da investigação da justiça no indivíduo para a investigação da justiça na cidade, estabelecendo um “elo” indissolúvel entre a conduta individual e a ação na cidade, entre uma política e uma ética. Disso, podemos concluir que a diferença entre a cidade e cada um de seus cidadãos é de tamanho, pois a cidade é o que são seus cidadãos, e estes são o que a cidade é. A cidade é a “grande alma” dos cidadãos.

Um pouco antes, ainda no Livro I, quando Sócrates debatia com Trasímaco acerca da justiça e da injustiça, o famoso sofista afirma que “a justiça é o interesse ou a conveniência do mais forte” 18. E Sócrates refuta a definição de seu oponente, que na narrativa platônica, fica desprestigiado. Não só por ser um sofista, mas também por ter pedido dinheiro para dar seu parecer (337d) e por ter externado certo desequilíbrio emocional ao longo do debate (338d)19. Ainda debatendo com Trasímaco, e buscando delimitar o que seria “justo”, Sócrates relaciona a justiça à sabedoria, e a injustiça, à ignorância (350c)20, justiça à felicidade, e injustiça à infelicidade (354a)21.

Não chegam a uma definição de “justiça” e nem de “injustiça”. Contudo, sob uma perspectiva geral da obra, nota-se a preparação feita para uma concepção política e moral de justiça, que visa desqualificar a definição sofista, que para Platão, está intimamente relacionada ao estado de decadência da cidade22.

No Livro II, idealiza-se a cidade a partir das necessidades básicas, tais como: alimentação, habitação, vestuário etc. Daí pensa-se no surgimento das profissões responsáveis por suprir tais necessidades. Com a multiplicação dessas atividades, nasce o comércio, inclusive externo, responsável suprir as demandas existentes (371a)23.

Fala-se então, na “capacidade natural” que os indivíduos têm para exercer determinadas atividades. Teríamos então, três classes de profissionais: o governante, os guardiões e os artesãos, conforme as atividades para que são naturalmente dotados. Os agricultores, servidores e trabalhadores em geral, são classificados como artesãos. Já os guardiões, deverão ter perspicácia, força e coragem. Dos guardiões mais bem dotados, sairá o governante, que se devidamente educado, fará o bem para o povo e para a cidade (412c-414c)24.

Nota-se aqui, a importância dada por Platão quando fala da “verdadeira educação” (filosófica) que será dada ao governante, pois para o autor, é ela a chave para a viabilização da cidade ideal. E essa educação deve proporcionar cuidados para o corpo e para a alma, composta de ginástica, música e arte das musas25. Platão sempre destacou a importância dos cuidados do corpo e da alma.

Na República, as mulheres devem ter as mesmas funções na cidade que os homens, necessitando, portanto, receber a mesma educação (451d)26.

Para Sócrates, aí está a justiça. Quando cada indivíduo cumpre a sua função, quando todos permanecem ocupando seu lugar na cidade. Essa tripartição da cidade permitirá a Sócrates voltar ao indivíduo e nele localizar a justiça. Para ele, “justiça é cada um possuir o que é seu e realizar o que lhe cabe (434a)”27.

Mais adiante, o diálogo retoma a tese central da obra – justiça, governo e indivíduo -com a afirmação de Sócrates à Gláucon de que o governante deve ser educado. E deve ser filósofo. O filósofo deve governar, para que a cidade possa, na medida do possível, ser realizada.

Se os filósofos não forem reis nas cidades ou se os que hoje são chamados reis e soberanos não forem filósofos genuínos e capazes e se, numa mesma pessoa, não coincidirem poder político e filosofia e não for barrada agora, a caminhada das diversas naturezas que, em separado, buscam uma dessas duas metas, não é possível, caro Gláucon, que haja para as cidades uma trégua de males e, penso, nem para o gênero humano. Nem, antes disso, na medida do que é possível, jamais nascerá e verá a luz do sol essa constituição de que falamos. (...) (473e)

Parece-me forçoso, se de alguma forma queremos escapar dessas pessoas de quem falas, que lhes definamos quem são os que chamamos de filósofos e de quem ousamos dizer que devem governar, para que se possa, estando evidentes os seus traços, fazer a defesa, mostrando que a uns, por natureza, cabe ocupar-se com a filosofia e ter o comando na cidade e a outros, abster-se dela e obedecer ao que tem o comando (474c)28.

 

Dessa forma, Sócrates conclui que a justiça da cidade está na obediência e na inclinação natural de cada um e, assim, o governo do filósofo tem a chancela da natureza. Daí falar que há uma “natureza filosófica” que é “inata”, uma espécie de “mentalidade”, um “caráter” que deve ser definido para se evitar os sofistas. Ou seja, há um perfil filosófico, ideal e real, que deve ser traçado, em oposição ao filósofo apenas em aparência.

O verdadeiro filósofo, educado inicialmente como guardião, ama a verdade e a sabedoria29, tem boa memória e facilidade de aprender; é magnânimo, amável, tem afinidade com a verdade, justiça, coragem e temperança. É moderado e cultiva os prazeres da alma30. Mas sua natureza benéfica, diz Sócrates, quando recebe a educação errada, pode tornar-se perversa, e é isso que acontece nas cidades, que não o conhecem realmente e o deixam a mercê dos sofistas31. Se o filósofo é mal visto nas cidades, não é por sua culpa: a cidade não sabe aproveitá-lo. Não é de estranhar, conclui Sócrates, que os bem-dotados para a filosofia, diante da insensatez da multidão e dos governantes, mantenham-se à margem da vida política, parecendo então inúteis32. E continua Sócrates:

Cada um dos indivíduos mercenários a quem o povo chama de sofistas e considera como rivais seus não tem outro objetivo de ensinamento senão essas opiniões que o vulgo expressa nas assembleias e a isso chamam sabedoria. É como se alguém, ao cuidar de um animal grande e robusto, procurasse conhecer-lhe as reações e os desejos, por onde deve aproximar-se dele e tocá-lo, quando e por que ele se torna mais agressivo e mais dócil, qual a razão do tom que dá a cada um dos seus urros, e a que tom de voz se amansa ou enfurece; e, depois de aprender tudo isso, com a convivência e gasto de tempo, a isso desse o nome de sabedoria e, como se tivesse constituído uma arte, se dedicasse a ensiná-la, na verdade nada sabendo o que, entre essas opiniões e desejos, é o belo ou feio, bom ou mal, justo ou injusto, mas a tudo isso, com base nas opiniões do grande animal, chamasse de boas as coisas que o agradam, de más aquelas que o irritam e, a respeito disso, não desse nenhuma justificação, mas apenas chamasse de justo e belo o que é inevitável, sem ver quanto realmente a natureza do inevitável difere da natureza do bom e também sem ser capaz de mostrar isso a outrem. Por Zeus, tal educador não te pareceria um disparate?33

 

Por outro lado, o melhor governante seria aquele que, conhecendo o real, justamente por isso não tem vontade de governar; é aquele que não é movido pelas benesses que tanto atraem os homens à vida política, porque aprendeu a desdenhar dos bens materiais e saberá, como legislador, impedir que a riqueza se insinue na cidade e comprometa sua unidade34. Somente ele pode legislar e administrar bem, porque desprovido do desejo pessoal desse poder e de tudo o que, nas cidades corrompidas, dele decorre35.

 

2 O POPULISMO SOFISTA E A INDEVIDA UTILIZAÇÃO POLÍTICA DO DIREITO PENAL

Ante as premissas estabelecidas na obra de Platão, e demonstradas alhures através da transcrição dos diálogos socráticos, calha estabelecer a seguir, como ocorre a atual utilização de discursos falaciosos e a consequente apresentação de promessas de falsas soluções para os anseios da humanidade, sobretudo no que tange à seara penal.

Eis que a utilização política do Direito Penal versada no presente ensaio refere-se ao modo pelo qual profusos candidatos e eleitos apresentam soluções simples e práticas para a nação, muitas vezes até como plano fulcral de um projeto de governo. Nesse contexto, a bravata de recrudescimento político-criminal soa como uma doce melodia à avida auscultação das moscas da praça pública36. O aludido comportamento tem invocado o entusiasmo de diversos pensadores, que o classificam de múltiplas maneiras. Fala-se em populismo37, em fascismo, em populismo seletivo38, ou ainda, em despotismo39.

Independentemente das variadas formas de denominação empregada, certo é que a retórica sofista e autoritária agrada as multidões e, apesar de cada vez mais dissimulada e sofisticada do que a que se apresentou no século passado, pode ser detectada em razão de alguns laivos de pariformidade40.

Por assim dizer, a marca inicial do populismo, é que não se pretende ceifar a democracia para implementar a ditadura, mas objetiva-se, isso sim, estatuir um conteúdo autoritário no seio da democracia formal, o que não só contraria a ideia de uma Constituição do povo e para o povo, como também afronta a tripartição de poderes e recalcitra o ideal pluralista de sociedade.

E não é só. Cumpre advertir que o populismo não é uma ideologia, no sentido de ter um conteúdo político específico41, razão pela qual não pode ser precisamente tido como sendo necessariamente de direita - como no caso do fascismo -, ou de esquerda. Pode ser de direita, esquerda, centro etc42.

Ademais disso, Finchelstein ainda indica que o populismo normalmente centra-se em um líder messiânico e carismático, tido pela maioria como a personificação do povo43. E é justamente neste processo que ocorre a homogeneização do povo como uma única entidade, bem como a configuração dos antagonistas políticos como inimigos, os antipovo, os antipátria, os traidores da nação. Por isso afirmar que o populismo é contrário ao pluralismo e à tolerância, e consequentemente, avesso à democracia e à política44.

Calha lembrar, outrossim, de relevantes vicissitudes na esfera comunicacional, posto que, com o advento da internet exsurgiram-se bolhas informacionais, com desproporcional excrescência de digitais influencers atuando através das redes sociais e da forte ascensão da troca de informações em grupos de WhatsApp. Isso porque, é mais palatável um discurso simplista e falso do que as complexidades oriundas de explicações científicas acerca da realidade. Nesta senda, é corriqueiro o embaraço na percepção - dentro do público debate - sobre o que se exterioriza como manifestação legítima da liberdade de expressão e o vem a ser puro negacionismo, engendrando-se um ambiente propício para a desinformação e a fluidificação dos parâmetros de verdade. “Cria-se um ambiente de desorientação, para além da desinformação”45. De pós-verdade46. A novidade reside, não na desinformação propagada pela classe política – essa, como se pretende expor aqui, já fora denunciada por Platão há séculos47 -, mas na resposta comportamental do público. Por aí dizer que se vive na era da pós-verdade: uma época em que a arte da mentira abala as próprias fundações da democracia e do mundo como o conhecemos48.

Neste cenário de incremento das incertezas, o populismo preenche o vácuo gerado com a oferta de uma segurança fictícia, através de resoluções simplistas e comezinhas, e no mais das vezes, equivocadas. Atua, pois, no âmago das paixões e dos sentimentos humanais, explorando aleivosamente as inquietações e as tormentas do mundo moderno.

Dito isso, importa enfatizar que o populismo não perturba só o campo político, de modo que se desenvolve exponencialmente na seara político-criminal e, por consequência, ganha corpo na criação e na alteração de leis penais, propugnando pelo recrudescimento das respostas punitivas com vistas satisfazer o anseio social de segurança e de garantia da ordem pública. Eis que a legislação penal passa a ser empregada como uma ferramenta particularmente apta para a concretização do populismo. “Se o objetivo é construir uma artificial homogeneidade social, com a ideia do nós contra eles, nada melhor do que usar o Direito Penal para castigar os inimigos, os párias, os antipovo”49. E a sociedade é virtualmente vingada. A ordem, restabelecida. A clama e o esquecimento assumem o lugar da inquietude, da irritação e do desejo de vingança causados nos cidadãos honestos quando do cometimento do crime. A repressão é, portanto, virtualmente perfeita com o pronunciamento da pena. Depois da condenação, o silêncio sucede ao rumor dos salões judiciários e o esquecimento à atenção geral. A população se desinteressa pela sorte dos condenados50. “A prisão é uma tumba onde se enterram os vivos, e nenhum epitáfio recorda aos passantes o nome daqueles que estão por detrás das grandes muralhas de pedra”51.

Cumpre advertir que assim sendo, a ciência do Direito Penal perde a sua pretensão de racionalidade e efetividade, transfigurando-se em puro terror, vingança e brutalidade. Os contrários no campo da política são transformados em inimigos, e são tratados pela via penal – não há mais arena de discussão, não há tolerância; há combate, há luta, há guerra. Ao tentar mobilizar sentimentos humanos, o populismo busca despertar a vingança e o ódio, fazendo as pessoas desejarem mais polícia, mais prisões, mais penas e até mesmo mais armas em suas mãos. E uma vez mais esse discurso é apresentado como hegemônico. A partir dessa perspectiva, as leis penais elaboradas sofrem cada vez mais essa influência, ampliando-se gradativamente o rigor das respostas oferecidas pela seara penal. Tudo é válido para combater o inimigo, o outro. Entretanto, é de bom alvitre destacar que todas essas alterações se fundam na busca por votos, não em evidências e efetividade. Predomina, então, o engano. Finge-se que o recrudescimento penal resolverá todos os problemas, mas obviamente não resolve. É uma premissa tautológica. Há, então, nova decepção dos destinatários do discurso, que passam a desacreditar ainda mais a política e a democracia52.

“O populismo no Direito Penal aprofunda, portanto, as causas de surgimento do próprio populismo na política, criando um círculo vicioso. Se na Europa tais ferramentas penais recrudescidas e inefetivas se voltam, sobretudo, contra o imigrante, eleito o inimigo pelo populismo, no Brasil o Direito Penal aprofunda sua aplicação socialmente desigual e racista. O populismo penal torna-se ferramenta do processo contínuo de dominação de grupos minoritários. Além disso, volta-se aos crimes de colarinho-branco apenas para, qualitativamente, enfraquecer as garantias penais. As consequências serão suportadas, no entanto, sobretudo pela clientela de sempre do sistema penal. Ademais, a concepção de que quem pratica crime é inimigo leva ao descaso pela situação carcerária, se é que é possível piorar algo que já alcançara o absoluto desrespeito à dignidade da pessoa. As prisões são o inferno, pois para lá não vão cidadãos, vão apenas os párias, os antipovo”53.

 

Nota-se que o populismo é um fenômeno social fortemente presente, disseminado e recorrente na contemporaneidade, exteriorizando-se de modo particularmente grave no âmbito do Direito Penal. É extremamente importância que a sociedade o compreenda e seja capaz de identifica-lo, a fim de que promessas vazias, bravatas de campanha, discursos sofistas e outras tantas mais soluções que se nos apresentam ano após ano, especialmente no período eleitoral, não permitam que seus autores ou propagadores prosperem e ascendam aos cargos de governo.

Ora, como se admitir discursos vagos e imprecisos, pretendentes a atentar contra a dignidade humana em um Estado democrático de Direito? Vale lembrar que, historicamente, foi “a partir do cristianismo que teve lugar o conceito de pessoa como categoria espiritual, dotada de valor em si mesma, um ser de fins absolutos e possuídos de direitos fundamentais e, portanto, de dignidade”54. Difunde-se, a partir do desenvolvimento da teologia cristã, a convicção segundo a qual o homem era o único ser vivo sobre a terra feito à imagem e semelhança de Deus: cada alma humana é obra mestra de Deus. E a expressão pessoa é definida por Boécio, no século V, como sendo “uma substância individual de natureza racional”, definição essa, reelaborada no século XIII por Santo Tomás de Aquino em sua Suma Teológica (I, q. 29, art. 1)55, constituindo a matriz teológica cristã da ideia de dignidade da pessoa humana. Pessoa esta que deve ocupar uma posição absoluta, central, concreta e operativa56.

No século XVII, como ideário do Direito natural racional, em especial na obra de Samuel von Pufendorf, aflora a noção de humanitas como princípio jurídico, dispondo que a natureza exige que o homem seja sempre considerado como semelhante, ainda que nada de bom se possa esperar dele, sendo essa a razão suficiente para que o gênero humano construa uma comunidade pacífica57.

Recorde-se, outrossim, das célebres palavras de Cesare Beccaria (século XVIII), para quem “não existe liberdade onde as leis permitem que, em determinadas circunstâncias, o homem deixe de ser pessoa e se converta em coisa”58.

Nesse passo, em um modelo de Estado cujo centro ético, político e jurídico é a pessoa, são expressamente vedadas a criação, a execução ou qualquer outra medida, a título de resposta penal, que atente contra a dignidade humana. E é justamente na dignidade humana que reside o fundamento material do princípio da humanidade enquanto limite da atividade punitiva estatal59.

 

3 CONCLUSÃO

Os homens submetem-se à justiça porque não têm alternativa, pois temem punições. Eles se consideram naturalmente injustos, mas, constrangidos pela possibilidade de serem vítimas da injustiça alheia, preferem estabelecer por lei, por uma convenção, que ninguém deve ser injusto60. Ora, com a nova cidade, a tensão entre o pretenso caráter natural da injustiça, como um bem, e o suposto caráter convencional da lei, que reprime esse bem, se dissolve, pois perde o seu sentido: agora, a lei estabelecida pelo filósofo, reflete a natureza mesma das coisas. A lei não é simples convenção: é a tradução terrena, sempre incompleta, da estrutura mesma do real. Por isso, nessa cidade, não mais se encontra uma distinção que de fato fundamentava o sentido tradicional da prática política, aquela entre “ser” e “parecer”, que Gláucon, em sua retomada de Trasímaco, desenvolvia, concluindo que, se a injustiça é natural em nós, mas a lei inevitável nos oprime, devemos ser injustos sem que disso se apercebam os outros, devemos parecer justos, sem realmente sê-lo, eis o ápice da injustiça61.

A República platônica, de certa maneira, suprime essa diferença, ou a torna inoperante, ao estabelecer uma subordinação do “aparecer” ao “ser”, invertendo a prática corrente. Pois a política, entendida como uma disputa pelo poder, como um embate de forças antagônicas em busca desse mesmo fim, constituiu desde sempre, assim parece pensar Platão, em persuadir de que o que parece é – em mobilizar os recursos da arte da retórica e pôr em xeque a fixidez dos valores, para dar aos desejos, convicções e interesses próprios o estatuto de verdade, assim conquistando na cidade reputação superior, mas conduzindo a cidade à ruina.

Conclui-se, portanto, que a cidade de Platão não tem o que habitualmente se chama de política – não se oferece a possibilidade de uma discussão sobre o que é melhor para a cidade, porque o que é melhor para a cidade já está inscrito nas leis que o filósofo conhece e prescreve.

Não devemos ler “A República” como uma receita a ser aplicada, nem mesmo como uma proposta política que devêssemos avaliar, tal como fazemos com as doutrinas contemporâneas. Se este excepcional diálogo ainda deve ser lido, e para que se conheça as origens do pensamento ocidental e, sobretudo, como uma análise crítica da democracia e de suas peculiaridades, que também a nós, às vezes, se apresenta de forma incômoda.

Além disso - estabelecendo-se uma aproximação conclusiva com o populismo penal tracejado adrede -, salienta-se que o direito de punir do Estado democrático de Direito não é, e nem poderia ser, uma faculdade estatal desenfreada e arbitrária. Ao contrário, tanto a própria estrutura do modelo jurídico optado pelo Poder Constituinte – leia-se: Estado democrático (e social) de Direito -, como o fundamento funcional do Direito Penal – leia-se: a indispensável e amarga necessidade de pena para a tutela de bens jurídicos mediante a proteção dos valores ético-sociais mais elementares - contêm limitações expressas ou implícitas (art. 5.º, §2.º, CF).

Assim como os demais ramos do Direito (e as ciências em geral), o Direito Penal fundamenta-se em determinados princípios - essenciais e diretores – derivados dos valores ético-culturais e jurídicos vigentes em uma determinada comunidade social e numa certa época, os quais foram se impondo num processo histórico-político contínuo como sendo basilares à sociedade democrática62.

Nesse contexto, as Constituições promulgadas nos últimos decênios, sob um modelo de Estado incorporados dos valores liberais (Rechtsstaats) e sociais (Sozialstaats), as normas concernentes ao Direito Penal se traduzem em postulados que, de um lado, em defesa das garantias individuais, condicionais restritivamente a intervenção penal do Estado; e de outro, preceituam um alargamento da atuação do Direito Penal, ampliando a área de bens objeto de sua proteção, mesmo diante do vigor libertário daquelas. Dito de outra forma, apesar de as Constituições contemporâneas fixarem os limites do ius puniendi estatal, resguardando as prerrogativas individuais, elas também inserem normas propulsoras do Direito Penal para novas matérias, tornando-o um instrumento de tutela de bens metaindividuais, cujo resguardo se mostra indispensável para a consecução dos fins sociais do Estado. Entretanto, apesar da possibilidade de utilização do Direito Penal para a tutela dos mais variados bens (individuais e transindividuais), essa salvaguarda deve ser a última ratio. E a promessa eleitoreira de recrudescimento da resposta penal estatal não pode se sobrepor ao debate político acerca da necessidade de prestação social de serviços essenciais como, por exemplo, a educação e a saúde63.

É frequente a constatação de ocasiões em que diversos problemas sociais são deixados de lado para priorizar-se uma suposta intervenção emergencial da persecução penal. Basta ver o noticiário, os telejornais, até mesmo os debates políticos de campanha. A sociedade adora ouvir “que bandido bom, é bandido morto”! Mas quem está disposto a entender e a remediar a causa do problema social? Antes, devemos debater acerca da desigualdade, da falta de educação, da necessidade de estruturar as famílias, de garantir moradia, emprego, da erradicação da pobreza, da marginalização e do preconceito. E esse papel não é penal!

Por óbvio que a discussão político-criminal é de suma importância. Todavia, não é suficiente que se implementem medidas, emergenciais ou não, através da ingerência penal estatal, deixando para trás o imprescindível desvelo que se deve ter com as instâncias materiais. Ora, a formação substancial do humano advém da família, da escola, da igreja, da prática esportiva etc. Não do cárcere.

 

4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1 Doutor, mestre e especialista em Ciências Penais. Professor de Direito Penal. Investigador de polícia.

2 Sobre o julgamento de Sócrates, vide PLATÃO. Apologia de Sócrates. Trad. Edson Bini. 2. ed. São Paulo: Edipro, 2015.

3 CASTILHO, Ricardo. Filosofia do Direito. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 51.

4 Para um estudo mais aprofundado, vide: FRONTEROTTA, Francesco; BRISSOM, Luc (orgs.). Platão: Leituras. São Paulo: Loyola, 2011.

5 A formulação precisa desse conhecimento encontra-se no Crátilo, onde Platão numa tentativa de definir o conhecimento, assevera que a gnôsis “só pode ter por objeto algo que é ele próprio, que deve ser sempre tal como é, e não pode ser algo que nunca é do mesmo modo, deve ser sempre do mesmo modo e o mesmo; se assim não fosse, não poderia ser conhecido por ninguém, pois o conhecimento não conhece o que não é de nenhum modo. Não há conhecimento se tudo muda e nada permanece” (PLATÃO. Diálogos VI – Crátilo, Cármides, Laques, Ion, Menexeno.  Trad. Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2013, 439c ss). Um dos motivos que levou Platão a delimitar o conhecimento, foi sua percepção durante os diálogos entre Sócrates e seus interlocutores (sofistas), que estes, ao não saber responder a indagação de seu mestre, apresentavam outra resposta. Daí que a falta de conhecimento daqueles que não compreendiam o sentido da pergunta.

6 ARISTÓTELES. Metafísica. Trad. Edson Bini. 2. ed. São Paulo: Edipro, 2014, 991ª, p. 20-22. O maior discípulo de Platão, assíduo frequentador da Academia por duas décadas, relata e critica a afirmação platônica acerca da existência separada das formas: as visíveis que nunca mantêm identidade, que mudam a todo momento, coisas que se dão imediatamente a nós; e as invisíveis, idênticas entre si e de formas invariáveis. As primeiras, são sensíveis de múltiplos aspectos (corpo). As últimas, são divinas, inteligíveis, de aspecto único (alma).

7 PLATÃO. Fedro. Trad. Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2014, 66c e 114c-115b. Importa salientar que semelhante contraponto é feito cerca de quatro séculos depois, com a vinda de Jesus Cristo, quando se defende a sobreposição do “espírito” sobre a “carne” único meio de uma vida santa, com sabedoria. Vide: Gálatas 5.16 (“vivam pelo espírito, e de modo algum satisfarão os desejos da carne; Matheus 26.41 (“o espírito pode estar pronto, mas a carne é fraca”).

8 CASTILHO, Ricardo. Op. cit., p. 52.

9 PLATÃO. A República: (ou sobre a justiça, diálogo político. Trad. Anna Lia Amaral de Almeida Prado. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2014, p. 13, introdução de Roberto Bolzani Filho.

10 D’ANCONA, Matthew. Pós-Verdade: a nova guerra contra os fatos em tempos de fake news. Barueri: Faro, 2018, p. 26-32.

11 CASTILHO, Ricardo. Op. cit., p. 51.

12 Tirania dos Trinta  foi um governo oligárquico de Atenas composto por trinta magistrados chamados tiranos, que sucedeu à democracia ateniense ao final da Guerra do Peloponeso, durante menos de um ano, em 404 a. C. (Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Tirania_dos_Trinta. Acesso em set. 2017).

13 PLATÃO. Op. cit., 324b-325e.

14 Idem. Op. cit., 326a-b.

15 Sócrates era um parresiasta, coerente e irrepreensível em sua conduta, pregava o “cuidado de si” a fim de que o “indivíduo” evoluísse, tornasse-se “sujeito”, apto ao exercício cívico na polis (vide FOUCAULT, Michel. A hermenêutica do sujeito. Trad. Márcio Alves da Fonseca. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2010, p. 13-15.

16 No Protágoras, Platão narra o episódio em que ao chegarem à porta da casa de Cálias - que hospedava Protágoras, além dos sofistas Hípias e Pródico -, Sócrates e o jovem Hipócrates ouvem do serviçal que os atende que seu senhor não tem mais tempo para mais sofistas (PLATÃO. Protágoras. São Paulo: Humanitas, 1999, 314c-d). Platão reconhece a aparente confusão que a cidade devia fazer entre Sócrates e os sofistas. Afinal, todos eles viviam a “ensinar” alguma coisa, e acabaram por receber denominações semelhantes, como por exemplo, “sábios”.

17 PLATÃO. Op. cit., p. 61-62 (324b-325e).

18 PLATÃO. Op. cit., p. 18-19 (338c).

19 Ibidem. p. 17-19.

20 Ibidem. p. 37.

21 Ibidem. p. 43.

22 Trasímaco era um sofista, como muitos, muito influente. Tais concepções superficiais, sofistas, eram frequentes à época. Daí a vontade de Platão em desqualificá-la.

23 PLATÃO. Op. cit., p. 65.

24 PLATÃO. Op. cit., p. 125.

25 As musas (em grego antigoΜοῦσα, Mousa), na mitologia grega, eram entidades a quem era atribuída a capacidade de inspirar a criação artística ou científica. Eram as nove filhas de Mnemósine ("Memória") e Zeus. O templo das musas era o Museion, termo que deu origem à palavra museu nas diversas línguas indo-europeias como local de cultivo e preservação das artes e ciências. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Musa. Acesso em: set. 2017.

26 Ibidem. p. 178.

27 Ibidem. p. 155-156.

28 Ibidem. p. 212-213.

29 PLATÃO. Op. cit., p. 214.

30 Ibidem. p. 229.

31 Ibidem. p. 236.

32 Ibidem. p. 237.

33 Ibidem. p. 238.

34 PLATÃO. Op. cit., p. 138.

35 Ibidem. p. 274.

36 NIETZSCHE, Friedrich. Assim Falava Zaratustra. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 53.

37 FINCHELSTEIN, Federico. Do fascismo ao populismo na história. Trad. Jaime Araújo. Campinas: Edições 70, 2020, p. 21 et. seq.

38 Umberto Eco refere-se ao populismo seletivo, pois, “em nosso futuro haverá o populismo de televisão ou de internet, no qual a resposta emocional de um seleto grupo de cidadãos pode ser apresentada e aceita como a voz do povo”. E acerca do fascismo eterno, que “fala a novilíngua de Orwell, de modo que todos os livros didáticos do nazismo ou do fascismo faziam uso de um vocabulário pobre e de sintaxe elementar, a fim de limitar os instrumentos para um raciocínio complexo e crítico” (ECO, Umberto. O fascismo eterno. Trad. Eliana Aguiar. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 2019, p. 55 et. seq.).

39 BOBBIO, Norberto. Contra os novos despotismos: escritos sobre o berlusconismo. Trad. Érica Salatine. São Paulo: Unesp, 2016, p. 29 et. seq.

40 Neste sentido alerta Eco ao afirmar que a “liberdade de palavra significa libertar-se da retórica” (ECO, Umberto. Op. cit., p. 62).

41 Vide: CHAUI, Marilena. O que é ideologia? (In) O que é filosofia? Ideologia? Dialética? São Paulo: Círculo do Livro, 1981, p. 75.

42 Vide: BOBBIO, Norberto. Direita e Esquerda: razões e significados de uma distinção política. 3. ed. São Paulo: Unesp, 2012.

43 FINCHELSTEIN, Federico. Op. cit., p. 32.

44 LOBO DA COSTA. Helena Regina. O avanço do populismo também no Direito Penal. Opinião. São Paulo: Estadão, 2021. Disponível em: https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,o-avanco-do-populismo-tambem-no-direito-penal,70003568056. Acesso em: 18 jan. 2021.

45 LOBO DA COSTA. Helena Regina. Op. cit., p. 01.

46 Vide: KEYES, Ralph. Era da pós-verdade: Desonestidade e enganação na vida contemporânea. Curitiba: Vozes, 2018.

47 Vide: PLATÃO. A República: (ou sobre a justiça, diálogo político). Trad. Anna Lia Amaral de Almeida Prado. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2014.

48 A pós-verdade é diferenciada de uma longa tradição de mentiras políticas, mostrando o poder das novas tecnologias e das mídias sociais de manipularem, polarizarem e enraizarem opiniões. Fala-se em pós-verdade, quando os apelos à emoção, a crenças e a ideologias têm mais influência em moldar a opinião pública que os fatos objetivos. Como podemos defender a verdade em uma época de mentiras, e dos chamados fatos alternativos? (D’ANCONA, Matthew. Pós-Verdade: a nova guerra contra os fatos em tempos de fake news. Barueri: Faro, 2018, p. 26-32).

49 LOBO DA COSTA. Helena Regina. Op. cit., p. 01.

50 ROSA, Gerson Faustino. Os limites da retribuição: uma análise crítica dos princípios penais constitucionais de sanção no Estado democrático de Direito. CARVALHO, Jeferson Moreira de. ROSA, Gerson Faustino. Temas de concretização constitucional. Leme: Edijur, p. 101-102.

51 BATTAGLINI, Giulio et al. Progetto Rocco nel pensiero giuridico contemporaneo. Roma: Istituto di Studi Legislativi, 1930, p. 129. Tradução livre.

52 LOBO DA COSTA. Helena Regina. Op. cit., p. 01.

53 Ibidem.

54 PRADO, Luiz Regis. Princípios da dignidade da pessoa e humanidade das penas na Constituição Federal de 1988. Disponível em: http://www.professorregisprado.com/resources/Artigos. Acesso em: 17 out. 2016, p. 3.

55 CATTANEO, Mario Alessandro. Pena, diritto e dignità umana: saggio sulla filosofia del diritto penale, Torino, 1990, p. 278, apud PRADO, Luiz Regis. Tratado de Direito Penal brasileiro: parte geral: volume 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 169.

56 PRADO, Luiz Regis. Op. cit., p. 169.

57 WELZEL, Hans. Introducción a la filosofía del Derecho: derecho natural y justicia material. Trad. Felipe González Vicén. Madrid: Aguilar, 1971, p. 143, apud PRADO, Luiz Regis. Tratado de Direito Penal brasileiro: parte geral: volume 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 184.

58 BECCARIA, Cesare. Dei delitti e dele pene, XXVII, p. 316, apud PRADO, Luiz Regis. Tratado de Direito Penal brasileiro: parte geral: volume 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 170.

59 PRADO, Luiz Regis. Op. cit., p. 183-185.

60 PLATÃO. Op. cit., p. 50.

61 PLATÃO. Op. cit., p. 51.

62 PRADO, Luiz Regis. Op. cit., p. 160.

63 ROSA, Gerson Faustino. Op. cit., p. 108 et. seq.