A POLÍCIA CIVIL DO PARANÁ E A QUALIDADE NO ATENDIMENTO À SOCIEDADE: ESTRATÉGIAS PARA UM MODELO DE POLÍCIA CIDADÃ

BRISOLLA, Fillipe Dalla Vecchia1

LENZ, Elias2

SILVA, Eder Nunes da3

STÁBILE, Leandro Alberto Albuquerque4

RESUMO:

O objetivo deste trabalho é apresentar a situação da Polícia Civil do Paraná (PCPR) hoje (onde está) no que diz respeito à qualidade de atendimento à população paranaense e onde pode chegar, por meio de estratégias para implantação de um modelo inovador de polícia cidadã, ou seja, com medidas que auxiliem e promovam um aprimoramento na relação entre polícia e sociedade, com foco precípuo nas necessidades locais de cada região de abrangência, a fim de gerar uma parceria efetiva que contribua para o combate à criminalidade e redução dos índices de violência. Para a confecção do presente trabalho foram utilizadas pesquisas bibliográficas em livros, revistas, publicações especializadas para embasamento teórico e apresentação de dados, informações e pesquisas relevantes, além de pesquisas de natureza aplicada, por meio de avaliações de natureza qualitativas realizadas pelos autores, de forma a compreender o contexto estudado, analisar estratégias para mudanças de paradigmas e da aplicabilidade do modelo de polícia cidadã na realidade de trabalho da PCPR. Por fim, a intenção precípua deste artigo é que a PCPR seja vista como uma polícia modelo de excelência e qualidade a serviço da sociedade.

Palavras-chaves: Polícia Civil, Paraná, polícia cidadã, atendimento, sociedade

 

 

The Paraná Civil Police and the Quality in Service to Society: Strategies for a Citizen Police Model

ABSTRACT:

The objective of this paper is to present the situation of the Civil Police of Paraná (CPPR) today (where it is) with regard to the quality of service to the population of Paraná and where it can go, through strategies to implement an innovative model of citizen police , that is, with measures that help and promote an improvement in the relationship between police and society, with a primary focus on the local needs of each region covered, in order to generate an effective partnership that contributes to the fight against crime and reduction in violence rates. For the preparation of this work, bibliographic searches were used in books, periodicals, specialized publications for theoretical support and presentation of data, information and relevant research, in addition to research of an applied nature, through qualitative assessments carried out by the authors, in a to understand the context studied, analyze strategies for changing paradigms and the applicability of the model of citizen police in the reality of the work of the CPPR. Finally, the main intention of this article is for the CPPR to be seen as a model police of excellence and quality at the service of society.

Keywords: Civil Police, Paraná, citizen police, service, society

 

 

INTRODUÇÃO

A PCPR como órgão de segurança pública, na incumbência das funções de polícia judiciária e de apuração de infrações penais, cuja missão é conduzir investigações criminais com eficiência e exercer as atribuições de polícia judiciária e administrativa do Estado do Paraná, contribuindo para a paz social e promoção da cidadania deve buscar constantemente o aperfeiçoamento e a excelência no atendimento à sociedade em relação à prestação de segurança pública. Na busca por exercer tais funções, o modelo de atuação da polícia civil é de uma polícia repressiva. Logo, a participação da instituição no contexto da criminalidade se dá preponderantemente por provocação – como de vítimas, do Ministério Público, do Poder Judiciário – e também de maneira independente – como é o caso do DENARC (Divisão Estadual de Narcóticos) e da AIPC (Agência de Inteligência) –, agindo não como uma polícia preventiva, mas sim como uma polícia investigativa na busca dos autores de delitos.

O processo de investigação exige do agente uma relação próxima com a sociedade, com os atores sociais pertencentes a uma comunidade organizada, pois é neste contato que informações importantes são coletadas. No entanto, a forma como essa relação se estabelece contribui no grau de eficiência do serviço policial, bem como na qualidade do atendimento do serviço policial prestado à sociedade, principalmente considerando seu contexto anterior, ou seja, como a instituição é vista pela sociedade no seu entorno e de que maneira ocorre, no dia a dia, a relação entre a delegacia, seus servidores e a comunidade por ela afetada.

O aumento da eficiência no combate à criminalidade e consequentemente na melhoria do atendimento às demandas da segurança social, patrimonial e ambiental são uma constante busca dos órgãos de segurança pública, mas diversos são os gargalos identificados nesta temática, como quantitativo de servidores aquém do necessário, falta de equipamentos adequados, burocracias, falta de integração entre os órgãos de segurança, entre outros.

Logo, diante do objetivo de compreender o modelo inovador da polícia cidadã e sua contribuição para o aumento da eficiência e excelência do atendimento à sociedade, faz-se necessário compreender suas bases teóricas, definições e processos históricos de evolução dessa nova mentalidade e estratégias dos órgãos de segurança pública para pô-la em prática.

Por isso, o presente trabalho apresentará conceitos e fundamentos teóricos que tratam da temática com a finalidade de compreensão do histórico de policiamento tradicional e cidadão no contexto brasileiro, bem como da qualidade de atendimento policial em delegacias, para, assim, fundamentar estratégias de implantação de um modelo de polícia cidadã na realidade da Polícia Civil do Paraná.

1. HISTÓRICO DO PROCESSO POLÍTICO-INSTITUCIONAL

Segundo Bohn (2013), o modelo de polícia tradicional existente no Brasil desde o século XIX traz consigo um contexto de distanciamento entre o policial e o cidadão, bem como torna o agente policial um ente separador de classes, entre o cidadão de bem e o criminoso.

Tal postura ficou latente no período do regime militar (1964-1985), pois a atuação policial confundia-se com a atuação das forças armadas, com as ideologias de Defesa Nacional. Esse cenário influenciou a atuação da polícia que usava principalmente da força para manutenção da ordem, instituindo uma cultura institucional militarizada (BOHN, 2013).

Convém destacar que não é foco deste trabalho exercer qualquer julgamento moral quanto a atuação da polícia tradicional aqui breve e superficialmente descrita, visto que tais atuações estão atreladas a contextos e momentos históricos próprios. Busca-se, porém, mostrar as mudanças institucionais ocorridas e como tais processos trouxeram outras perspectivas para a segurança pública, abrindo caminhos para outras estratégias de atuação.

Com o fim do regime militar, um processo de redemocratização se iniciou no país e com ele mudanças na visão do que se entendia por cidadania.

A Constituição Federal de 1988, que inaugurou o Estado Democrático de Direito no Brasil, trouxe um amplo rol de direitos e garantias individuais ao cidadão, além de prever responsabilidades ao Estado e à sociedade para a efetivação destes direitos. Diante deste novo cenário, o conceito tradicional de cidadania foi modificado, reconhecendo-se o sujeito como ser detentor de direitos e deveres amplos. (SERRANO, 2010).

 

No mesmo período, a Carta Política ampliou o conceito de Segurança Pública reconhecendo que este era um direito individual e coletivo e atribuiu responsabilidades àqueles que devem garantir tal direito. Nesse aspecto, conforme Serrano (2010), a Constituição Federal nos seus artigos 5° e 6° tratou o tema da segurança como um direito de natureza individual e, ao mesmo tempo, coletivo ou social. Por conseguinte, a Carta Magna estabelece a segurança como dever do Estado, direito e responsabilidade de todos. Não obstante existirem discussões acerca do Estado de Proteção Social limitar-se à segurança econômica ou externa (DRAIBE, 1993), a Carta Magna, em seu artigo 6º, ao inserir a segurança no rol de direitos sociais, não possui tal implicação, mas fala propriamente de segurança pública.

Nas palavras de Pedro Lenza (2015), constitucionalista renomado:

[…] a previsão no art. 6º tem sentido diverso daquela no art. 5º. Enquanto lá está ligada à ideia de garantia individual, aqui, no art. 6º, aproxima-se do conceito de segurança pública, que, como dever do Estado, aparece como direito e responsabilidade de todos, sendo exercida, nos termos do art. 144, caput, para preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. (LENZA, 2015)

 

Nesse sentido, tratando-se, pois, a Carta Magna a base do ordenamento jurídico de um Estado democrático e soberano, é no campo da Constituição Federal, promulgada em 1988 pelo constituinte brasileiro que devemos buscar estudar a estrutura jurídica das discussões multidisciplinares que envolvem a proteção social, individual ou coletiva, que, como dito anteriormente, é responsabilidade de todos, porém, dever do poder público. É o que ensina, aliás, Di Giovanni (1998), professor da Universidade Estadual de Campinas, que assevera que, “[…] a proteção social exercida através do Estado é socialmente assumida como função do poder público e representa a existência de um conjunto de garantias, mais ou menos extensas, através de intervenção política e administrativa.” Considerando que a segurança pública é de responsabilidade de todos (lato sensu), convém destacar o conceito de segurança pública definido por Bengochea (2004, p. 120):

A segurança pública é um processo sistêmico e otimizado que envolve um conjunto de ações públicas e comunitárias, visando a assegurar a proteção do indivíduo e da coletividade e a aplicação da justiça na punição, recuperação e tratamento dos que violam a lei, garantindo direitos e cidadania a todos. Um processo sistêmico porque envolve, num mesmo cenário, um conjunto de conhecimentos e ferramentas de competência dos poderes constituídos e ao alcance da comunidade organizada, interagindo e compartilhando visão, compromissos e objetivos em comum; e otimizado porque depende de decisões rápidas e de resultados imediatos. (BENGOCHEA, 2004)

 

Desse modo, é possível dizer que foi diante dessa alteração de contexto político-institucional que o cenário para a evolução da construção de uma polícia cidadã se iniciou, visto que o processo de mudança da visão do cidadão, bem como da segurança pública, se estabeleceu de forma organizacional, partindo dos atores políticos que detinham a governança para iniciar tal transformação.

Nesse compasso, a Polícia cidadã se apresenta não como uma força estatal meramente repressiva, mas sim, protetora da sociedade, do patrimônio e da cidadania como um todo, ou seja, de um lado, protege o bem, e de outro, combate o mal, gerencia crises, aconselha, dirime conflitos, evita o crime, faz a paz e regula as relações sociais, assunto este será abordado daqui em diante.

2. POLÍCIA CIDADÃ

A polícia cidadã, por se confundir com o conceito de polícia comunitária, será utilizado no presente estudo como sendo sinônimo deste. Além disso, o conceito de ambos varia de autor para autor, bem como as suas principais características.

Conceitualmente, policiamento comunitário é definido como filosofia e estratégia organizacional que proporcionam uma nova parceria entre a população e a polícia, baseada na premissa de que ambos devem trabalhar, conjuntamente, na construção da segurança pública. Operacionalmente, definem o policiamento comunitário como a filosofia de policiamento adaptado às exigências do público que é atendido, em que o policial presta um serviço completo. Isso significa que o mesmo policial realiza patrulhas e trabalha em uma mesma área, em uma base permanente, atuando em parceria com a população desse entorno. (NEV, 2009).

 

O conceito apresentado acima é o conceito de policiamento comunitário trazido por Robert Trojanowicz e Bonnie Bucqueroux no livro “Policiamento Comunitário: como começar?”. De forma geral, de acordo com Nev (2009), os autores enfatizam o policiamento comunitário como um trabalho realizado em parceria com a população, através da prevenção de crimes.

Nesse aspecto, nos moldes de um Estado Democrático de Direito, em que está presente uma Constituição elaborada pelo seu povo e que requer uma verdadeira aplicação dos direitos do Cidadão surge a figura da Polícia Cidadã, a qual age estabelecendo boas ações humanas concomitantemente com sua missão institucional, ou seja, a de servir como uma polícia em defesa da cidadania.

Não obstante o Estado em prol dos interesses da coletividade deter o poder de limitar direitos e restringir liberdades, deve observar os princípios norteadores da Carta Magna como é o caso da legalidade estrita, além de não atentar contra a dignidade humana. Nesse aspecto, a instituição policial exerce os poderes que detém a administração pública com a finalidade de preservar a ordem pública, a proteção social e patrimonial.

Assim, segundo ensina Bengochea et al. (2004), a questão policial é um tema central para o desenvolvimento social e sustentável da sociedade brasileira. Logo, constata-se que o modelo de atuação dos agentes policiais precisa mudar.

Atualmente verifica-se que os órgãos policiais majoritariamente compreendem a segurança e sua intervenção na ordem pública, apenas pela ótica da repressão. Por isso, de acordo com Bengochea et al. (2004), o modelo de polícia cidadã traz mudanças profundas, pois nesse sistema não apenas a polícia como órgão executivo do Estado é a responsável, mas também o poder Judiciário, o Ministério Público e a sociedade em geral participam do debate sobre segurança pública de maneira conjunta. Dessa forma é possível ter uma polícia mais eficiente, objetiva e integrada até mesmo internamente, com um trabalho em conjunto dentro de um mesmo órgão, tendo sua atuação pautada e alicerçada na estrita legalidade e no respeito aos direitos humanos, propiciando a defesa à cidadania e ao bem-estar coletivo.

Com a Constituição Federal, a opinião pública começou a exigir o surgimento de uma nova polícia. Uma que respeitasse os Direitos Humanos, a Lei e, principalmente, protegesse efetivamente o cidadão e não mais o Estado. Começaram a surgir novos conceitos como o de Polícia Comunitária, Polícia Cidadã, ou mesmo Polícia Interativa, onde se buscaria uma parceria definitiva com a comunidade para a resolução dos problemas de segurança pública da comunidade. (BONDARUK, 2005, p. 73-74).

 

Assim, para que tais mudanças profundas ocorram, os agentes policiais e servidores precisarão ter uma outra visão de seu objeto de trabalho, ter a capacidade e a habilidade de reconhecer e compreender a importância da participação e aproximação da sociedade, bem como sua composição diversa. O controle social de uma polícia cidadã é aquele que sai da sociedade e entra para a polícia. É uma visão completamente diferente da atualmente existente (Bengochea et al., 2004).

No entanto, para entender a lógica do policiamento comunitário, é preciso discutir o histórico dessa questão no contexto mundial e brasileiro. Nesse sentido, conforme explica Santos (2019), o policiamento dos Estados Unidos da América dividiu-se em três grandes fases, denominadas “Eras do Policiamento Moderno”, sendo elas: I) Era Política, marcada por um policiamento sem especialização; II) Era da Reforma ou Era Profissional, marcada pelo surgimento das Academias de Polícia, com o objetivo de formação de profissionais para combater a criminalidade; e III) Era Comunitária, fase na qual os trabalhos são orientados para a resolução de problemas da comunidade através da construção de um relacionamento de cooperação entre a polícia e a comunidade.

Já no contexto brasileiro, de acordo com Filho (2017), o policiamento comunitário começou a dar seus primeiros passos em 1983, no Rio de Janeiro, durante o comando do Coronel Carlos Magno Nazareth Cerqueira, então Comandante Geral da PMERJ. Posto isso, Cerqueira (1999) vê a parceria entre a polícia e a comunidade como instrumento essencial para a prevenção do crime:

A estratégia comunitária vê o controle e a prevenção do crime como resultado da parceria com outras atividades; quer dizer que os recursos do policiamento articulados com os recursos comunitários são agora os instrumentos essenciais para a prevenção do crime. (CERQUEIRA, 1999, p.23).

 

Desta forma, a proposta do policiamento comunitário é a aproximação e a integração entre o administrado e a polícia, a fim de romper o distanciamento e hostilidade existente entre ambos (BOHN, 2013).

Assim, segundo Mesquita Neto (2011), o modelo de polícia comunitária possui três grandes objetivos:

  1. Reformular a organização de um comportamento fechado para uma organização de comportamento mais aberto a consulta e a participação da sociedade, estreitando os laços e aumentando a confiança entre a polícia e a população, o que inclui à aproximação do diálogo, a troca informações entre um e outro.
  2. Melhorar a qualidade do serviço policial, elevando a efetividade e a eficiência, a fim de que o indivíduo, usuário deste serviço policial, seja atendido integralmente nas suas demandas, isto é, sem que ocorra lesão aos seus direitos;
  3. Levar com novos métodos a redução da criminalidade, da desordem e da insegurança na sociedade, de modo a aprimorar os métodos que atualmente vem sendo aplicado.

Ainda, como cita o referido autor, não podemos destoar às dificuldades de implantar um modelo que vise a aplicação do policiamento comunitário, seja dentro ou fora da polícia, entre eles e o risco da oposição e da resistência a novas experiências, até mesmo no sentido de não se permitir que policiamento comunitário venha a ser implantado e visto como mais uma atividade especializada, ou mesmo o risco de que as instituições policiais, quando passam a ter a responsabilidade de fazer o policiamento comunitário, deem menos valor às atividades de policiamento comunitário do que às atividades tradicionais próprias da polícia.

Já Trojanowicz e Bucquerouxe (1994), apontam o policiamento comunitário como sendo uma forma de filosofia e estratégia organizacional que proporciona uma nova parceria entre a população e a polícia.

Baseia-se na premissa de que tanto a polícia quanto a comunidade devem trabalhar juntas para identificar, priorizar e resolver problemas contemporâneos tais como crime, drogas, medo do crime, desordens físicas e morais, e em geral a decadência do bairro, com o objetivo de melhorar a qualidade geral da vida na área. (TROJANOWICZ; BUCQUEROUXE, 1994)

 

Nesse contexto, Bayley e Skolnick (2002), relacionam a importância de dividir a responsabilidade da polícia com o cidadão, no qual apresentam um desafio às polícias de efetivamente conseguirem estreitarem os laços:

A premissa central do policiamento comunitário é que o público deve exercer um papel mais ativo e coordenado na obtenção da segurança. A polícia não consegue arcar sozinha com a responsabilidade, e, sozinho, nem mesmo o sistema de justiça criminal pode fazer isso. Numa expressão bastante adequada, o público deve ser visto como “co-produtor” da segurança e da ordem, juntamente com a polícia. Desse modo, o policiamento comunitário impõe uma responsabilidade nova para a polícia, ou seja, criar maneiras apropriadas de associar o público ao policiamento e a manutenção da lei e da ordem. (BAYLEY; SKOLNICK, 2002)

 

Segundo (Bayley; Skolnick, 2001 e Skolnick; Bayley, 2002), quatro inovações essenciais e quatro fatores cruciais são necessários para o desenvolvimento do policiamento.

Quanto as inovações essenciais têm-se o seguinte:

  • organização da prevenção do crime tendo como base a comunidade;
  • reorientação das atividades de policiamento para enfatizar os serviços não emergenciais e para organizar e mobilizar a comunidade para participar da prevenção do crime;
  • descentralização do comando da polícia por áreas;
  • descentralização do comando da polícia por áreas; participação de pessoas civis, não-policiais, no planejamento, execução, monitoramento e/ou avaliação das atividades de policiamento.

Já quanto aos fatores cruciais, incluem-se:

  • o envolvimento enérgico e permanente do chefe com os valores e implicações de uma polícia voltada para a prevenção do crime;
  • motivação dos profissionais de polícia por parte do chefe de polícia;
  • defesa e consolidação das inovações realizadas;
  • e por último, mas não menos importante, o apoio público, da sociedade, do governo e principalmente da mídia.

De outro modo, (Bayley e Skolnick 2001 Skolnick e Bayley, 2002) também apontam dificuldades para a implantação e consolidação do policiamento comunitário e que também devem ser levados em conta. São eles:

  • a cultura tradicional da polícia;
  • a expectativa ou a demanda da sociedade pela pronta resposta diante do crime e da desordem;
  • o corporativismo dos policiais, expresso principalmente através das suas associações profissionais, que temem a erosão do monopólio da polícia na área da segurança pública;
  • a limitação de recursos que a polícia dispõe para se dedicar ao atendimento de ocorrências, a investigação criminal e a organização e mobilização da comunidade;
  • a falta de capacidade das organizações policiais de monitorar e avaliar o próprio trabalho e fazer escolhas entre tipos diferentes de policiamento, levando em consideração sua eficácia, eficiência e legitimidade;
  • a centralização da autoridade na direção das polícias, e a falta de capacidade da direção de monitorar e avaliar o trabalho das unidades policiais e profissionais de polícia;
  • as divisões e conflitos entre os policiais da direção e os da ponta da linha, entre policiais experientes e os policiais novos;
  • as divisões e conflitos entre a polícia e outros setores da administração pública;
  • as divisões e conflitos entre grupos e classes sociais no interior da comunidade.

De posse de tais conceitos e perspectivas, percebe-se que a polícia cidadã é um modelo inovador que busca métodos diversificados de combate à criminalidade. É importante considerar que, segundo Skolnick e Bayley (2002), o modelo profissional não apresenta eficiência nesse objetivo, visto que o aumento do número de policiais não reduz as taxas de criminalidade, nem aumenta a proporção dos crimes resolvidos.

Além disso, Cerqueira (1999) expõe, em sua obra, que um policiamento exclusivamente repressivo não está de acordo com as necessidades do mundo contemporâneo.

Fica claro que a parceria entre polícia e população é essencial para a existência do policiamento comunitário. O final do século XX e o advento do século XXI nos deixaram muito evidente que um policiamento exclusivamente pautado na lógica da repressão não satisfaz as necessidades da sociedade livre do mundo ocidental. A questão da segurança deve ser debatida e assumida tal qual tarefa e responsabilidade perene tanto do Estado quanto da população. Teremos assim a integração comunitária em prol da ordem pública. (CERQUEIRA, 1999).

 

Ademais, uma polícia exclusivamente repressiva pode causar degeneração da imagem da polícia como um todo, conforme destaca Nev (2009):

A adoção do Policiamento Comunitário advém da constatação que o modelo do policiamento pautado exclusivamente na repressão não apresenta mais grande eficácia diante dos novos padrões da crescente violência urbana, quer seja no sentido da violência criminal ou no sentido de manifestações coletivas para melhor acesso a direitos. A abordagem da polícia quanto a esses novos contextos sociais que tiveram início no final da década de 1960, se feita de maneira equivocada, causa forte deterioração da imagem das forças policiais junto a população. (NEV, 2009).

 

Portanto, de acordo com Bengochea et al. (2004), é necessário o investimento em uma concepção de polícia cidadã e o desdobramento em diversas dimensões. Por exemplo, a participação comunitária – inexistente na polícia tradicional – é um fator permanente na polícia cidadã, pela aproximação de seus integrantes à população e pelo comprometimento com a segurança pública no local de atuação, surgindo aí o chamado policiamento comunitário. Adiciona-se ainda que este método pode vir a ser estratégico e relevante para uma melhora significativa na qualidade do atendimento do serviço policial para a sociedade.

Noutras palavras, o policial da atualidade deve ser acolhido pela comunidade a qual esta a servir, integrando-se a ela e não agir como se temido ou estranho fosse, e sim, abarcado pelo respeito e pela confiança, de forma ser capaz de despertar nos cidadãos os sentimentos de cordialidade e solidariedade., uma vez que tais propostas de integralização veem justamente buscar uma redefinição do relacionamento entre a sociedade e a polícia, com o intuito de melhorar a qualidade dos serviços policiais e, consequentemente a satisfação com o serviço por parte do usuário contribuinte.

 

3. QUALIDADE DO SERVIÇO POLICIAL

De acordo com Ribeiro et al. (2014), a polícia deveria ser uma das principais instituições do sistema de garantias dos direitos individuais, uma vez que é a organização responsável por registrar e investigar crimes e infrações que ocorrem em cada localidade, indicando à Justiça os possíveis autores, possibilitando que eles sejam processados e, caso se verifique sua culpa efetiva, punidos conforme a lei.

Entretanto, no Brasil e em vários outros países, é baixa a confiança da população na polícia, quer por históricos de corrupção e violência, quer pela má qualidade do atendimento que presta. Isso faz com que grande parte dos crimes não seja registrada, não chegue ao conhecimento das autoridades públicas e não resulte em processamento e punição dos culpados, como já apontado pelo sociólogo Edwin H. Sutherland (1940) nas chamadas Cifras Criminais (correspondente às estatísticas criminais não divulgadas oficialmente por desconhecimento das autoridades ou por deixarem de seguir o caminho necessário de punição dos autores, logo, crimes não solucionados ou não punidos). Dessa forma a baixa participação da população no processo investigativo prejudica a disponibilização de informações e provas.

Nesse sentido, mensurar a qualidade do serviço policial é algo desafiador, visto se tratar de um critério altamente subjetivo. No entanto, algumas pesquisas trazem critérios objetivos para que a qualidade do serviço em uma delegacia de polícia possa ser devidamente mensurada e avaliada. Nesse sentido, pode-se citar a “Semana de Visitas a Delegacias de Polícia”, uma pesquisa internacional desenvolvida pela Altus Aliança Global5, em que várias unidades de delegacias, em diferentes países, são avaliadas diretamente por pessoas que residem na área atendida pela delegacia de polícia. De um modo geral, os resultados para as delegacias brasileiras no estudo realizado no ano de 2010 foram os seguintes:

[...] Constata-se que, no ano de 2010, um percentual substantivo de delegacias de polícia recebeu avaliação inadequada (38,95%) ou adequada (31,98%). É importante destacar que 15,15% das delegacias receberam avaliação totalmente inadequada, 9,3% receberam avaliação mais do que adequada e apenas 4,65% receberam uma avaliação excelente. (RIBEIRO, 2013).

 

No que se refere a essa pesquisa, pode-se ainda destacar alguns pontos observados pelos visitadores:

I) Existem diferenças sistemáticas de qualidade de atendimento entre as cidades e regiões avaliadas, e essa diferença não tem relação com o Índice de Desenvolvimento Humano do local;

II) Os policiais, em geral, não estão preparados para um atendimento igualitário à população, de modo que não conseguem se adequar às especificidades do público que os procura;

III) As delegacias, em geral, contam com adequada infraestrutura e os policiais possuem mecanismos suficientes para o exercício de suas funções; no entanto, fachadas dos prédios em mau estado de conservação são comuns e trazem uma má impressão àquele que será atendido, assim como a presença de inúmeros materiais apreendidos pelos corredores, conforme relato:

Segundo eles (visitantes), por mais que a delegacia não esteja bem conservada e não existam investimentos por parte do governo, cabe ao delegado organizar a delegacia. Isso, para eles, passou uma imagem de que o delegado reclamava, mas estava acomodado com a situação. Uma das visitantes resumiu bem essa ideia dizendo: “Parece que ele coloca a culpa toda na falta de investimentos e na manutenção pra ‘tirar o corpo fora’ das suas próprias responsabilidades. (RIBEIRO, 2014).

 

IV) Há dificuldade de identificação imediata, nas unidades, de quem é policial, de quem é vítima, de quem é detido pela prática de um crime, podendo levar a confusões, desrespeitos e ilegalidades, pois nem a própria comunidade consegue entender, de pronto, quem é policial de fato.

Outrossim, como relata Santos (1980), apesar dos esforços da polícia no sentido de uma aceitação mais positiva por parte da comunidade, continua a ser vista por esta como uma força hostil investida de funções estritamente repressivas.

Por isso, este item demonstra por meio de dados, a forma como a polícia ainda é vista atualmente pela sociedade, evidenciando seu distanciamento em relação a ela. Isso comprova mais uma vez o quanto é fundamental uma mudança progressiva na forma de atuação da polícia, não exercendo apenas um papel repressivo, mas atuando de forma preventiva junto à comunidade, se envolvendo com os atores sociais, com o objetivo de construir pilares de sustentação em uma relação de confiança mútua polícia-comunidade, de forma a mudar o déficit de confiabilidade das organizações policiais brasileiras, sobretudo da PCPR, estudo do presente trabalho. Mais uma vez, é o método de abordagem, de estratégia, da polícia cidadã que apresenta um roteiro prático para alcançar tal objetivo.

4. ESTRATÉGIAS PARA IMPLANTAÇÃO DE UM MODELO DE POLÍCIA CIDADÃ NA PCPR E POSSÍVEIS DIFICULDADES

Sabe-se que grande parte da sociedade possui uma visão das polícias civis no país atrelada diretamente à imagem e ao atendimento que a própria instituição passa, e no Paraná isso não é diferente. De acordo com Stábile (2017), “[...] a imagem institucional é um meio e um fim. Se pode ser tratada como uma forma de avaliar o trabalho desempenhado pelo órgão
e os seus reflexos na sociedade - a quem deve servir e é o propósito de sua existência”.

Vale aqui destacar que é comum se deparar com muitos cidadãos que, além de já estarem conturbados por serem possíveis vítimas de delitos ou de alguma forma terem sofrido algum dano patrimonial, moral ou psicológico, ainda serem revitimizados pelo próprio Estado. Isso se dá porque ao procurar canais de ajuda o segundo dano pode advir de um mal atendimento nas delegacias, da demora do órgão em oferecer auxílio ou do descrédito que a pessoa já tem ao procurar qualquer atendimento, imagem esta que de algum modo é denegrida pelas notícias de corrupção ou qualquer ineficiência do órgão promovida pela mídia, uma vez que “a sociedade utiliza os meios de comunicação como um dos principais recursos na
construção da imagem da instituição [...]” (STÁBILE, 2017).

Diante disso, para que a sociedade tenha uma familiarização com o órgão de maneira favorável, algumas mudanças podem contribuir significativamente para uma nova percepção em relação ao trabalho prestado pela instituição.

 

4.1 DELEGACIA CIDADÃ

Uma dessas mudanças dentro da PCPR que podem ser adotadas e que favorecem a proximidade com a comunidade está em seus organismos base, que nada mais são do que as próprias delegacias. Ter uma delegacia bem apresentada, com infraestrutura adequada, conservada, limpa e eficiente é um dos primeiros pontos a se efetivar em todo o Paraná.

Sendo a delegacia um espaço preparado a receber e atender a população da melhor e mais respeitosa maneira possível, deve estar adaptada para prestar um digno atendimento. [...] Os aspectos técnicos-físicos do ambiente devem ser considerados quando da análise do uso do espaço, propondo então novas alternativas de leiaute e novas técnicas construtivas com materiais adequados para obtenção de um melhor condicionamento ambiental. (BRONDANI, et al. 2020)

 

E um fator relevante que se destaca no estado é que isso já foi iniciado através das novas infraestruturas policiais – as chamadas delegacias cidadãs – existentes em Matinhos, Fazenda Rio Grande, Pinhais e Paranaguá entre outros diversos locais no Paraná. De acordo com a Secretaria da Segurança Pública (2019) a nova proposta conta com salas de atendimento ao público, plantão, reuniões, chefia e investigação, cartório, defensoria pública, sala de delegados e demais departamentos administrativos, o que facilita a troca de informações entre os servidores policiais e melhora o andamento dos trabalhos, amenizando a sobrecarga diária enfrentada no tradicional modelo de delegacia.

Outro destaque é que essas unidades dispõem de acessibilidade para pessoas com dificuldades motoras e banheiros adaptados, bem como ambientes isolados para crianças, adolescentes, mulheres e idosos. De acordo com Cambiaghi (2007), um ambiente que se adequa às necessidades de um usuário se torna mais confortável, ou seja, está apto a acolher as pessoas.

[...] se no processo de concepção do projeto não for considerada a diversidade de usuários quanto ao sexo, dimensões, idade, cultura, destreza, força e demais características, é possível que apenas uma porcentagem reduzida da população possa utilizar os espaços confortavelmente. Atualmente costuma-se dizer que um projeto pode habilitar ou inabilitar uma pessoa a utilizar determinado ambiente ou produto. (CAMBIAGHI, 2007, p.15)

 

No caso das delegacias cidadãs percebe-se que a implantação do projeto acolhe as pessoas de maneira positiva, pois são espaços de atendimento à sociedade mais dignos, arejados, com estrutura ampla e modernos. Isso tudo proporciona um ambiente mais humanizado, o que aproxima a polícia da população e vai ao encontro da qualidade e excelência na segurança pública.

FIGURA 1 – DELEGACIA CIDADÃ

FONTE:<http://www.seguranca.pr.gov.br/Projetos/Novas-Delegacias#> Acesso em: 10 Abril 2021.

 

Como se observa, trata-se de um local em que o cidadão tem seu primeiro atendimento com o Estado na busca de garantia de seus direitos, abarcando espaços específicos em um só lugar que promovam o contato inicial que pode se dar de maneira integral dentro das funções exercidas pelo órgão, inclusive com possibilidade de auxílio de assistentes sociais e psicólogos. Logo, é imperativo que esse novo formato de delegacia se dissipe por todo o estado, alcançando inclusive cidades do interior. Muito embora isso ainda seja um desafio, os primeiros passos já estão sendo dados no âmbito do Paraná através dos investimentos em novas construções em outras cidades, o que é muito positivo para a Polícia Civil. É por meio desse primeiro contato polícia - cidadão que o órgão valoriza cada vez mais seus valores de eficiência, integração e excelência técnica, o que contribui para a construção diária da paz social e da promoção da cidadania.

 

4.2 ATENDIMENTO AO PÚBLICO

Outra mudança fundamental e inseparável para a efetivação de uma polícia cidadã parte do próprio atendimento em si para com a comunidade. Conforme Stábile (2017), “em meio a todas as constantes e variáveis que influem na construção da imagem de uma instituição pública uma que definitivamente carrega extrema relevância é a qualidade do serviço prestado ao cidadão, o cliente da Polícia Civil é o cidadão [...]”.

De acordo com Moraes (2018, p. 114), o problema muitas vezes enfrentado no trato dos órgãos com o público está na “inteligência para mudança de comportamentos, passando-se do individualismo do “eu” para o coletivo da equipe “nós todos”. Só assim, o bom atendimento aparecerá natural e gradualmente”. Isso se dá porque os policiais que ali recebem cada cidadão em suas delegacias e tenham essa nova perspectiva comportamental, bem como empatia, não irão aceitar ver demais colegas tratando mal qualquer pessoa que necessite de um atendimento. Por isso que quando se fala em polícia cidadã diferentes aspectos estão mais que interligados e passam não só pela imagem das delegacias como dito anteriormente em relação às novas delegacias cidadãs, mas dependem também do atendimento aqui mencionado. Diante disso, é de fundamental importância destacar que o atendimento é elemento indissociável da imagem das delegacias, pois não é só infraestrutura que viabiliza esse novo modelo, mas principalmente uma associação à nova postura a ser adotada pelos servidores de querer sempre atender, e atender bem.

Certo é que todos os servidores diuturnamente acabam por construir a imagem da instituição seja ao prestar atendimento ao público, ao realizar os encargos que lhe são de atribuição e até mesmo ao dar cabo das determinações emanadas pelos superiores. Não se questiona que cada servidor vinculado ao órgão, seja qual for natureza de tal vínculo, colabora a todo momento para a construção da visão pública da Polícia Civil do Estado do Paraná, seja positiva ou negativamente. (STÁBILE, 2017)

 

Já não se pode aceitar mais a velha visão de servidores sem empatia, mas que busquem se colocar no lugar do cliente cidadão como seu principal mister a se atentar, como se defronte de um familiar estivesse sem desvirtuar da finalidade pública do Estado que ali se materializa através de seus servidores.

E para que essa qualidade de atendimento seja atingida com perfeição é notável destacar que o servidor policial não é simplesmente uma máquina sem qualquer tipo de percepção emocional, mas sim que também possui sentimentos e uma qualidade única de valores. É diante desse aspecto que o policial deve ser fortalecido constantemente contra os desequilíbrios emocionais e estresses vivenciados diariamente, além de qualquer tipo de problemas que afetem diretamente o desempenho de sua profissão. Isso porque um servidor que não está bem consigo mesmo certamente não irá atender bem o cidadão, e este último espera encontrar na delegacia, e mais especificamente junto ao policial, um caminho para o auxílio que necessita em um momento certamente inabitual. Desse modo, o bom trato psicossocial do Estado com seus servidores também faz parte desse processo, sendo conveniente a atenção adequada do órgão em relação a esse aspecto constantemente para que todos possam estar saudáveis também com a mente.

Nesse contexto, é mais que necessário o aperfeiçoamento contínuo e de seleção dos servidores mais adequados para o adequado atendimento. De acordo com a Polícia Rodoviária Federal (2021), para o alcance de uma estratégia organizacional de uma instituição que possui competências de excelência é fundamental promover o desenvolvimento humano com foco na qualificação e adequada alocação de servidores. Logo, isso remete a um processo de alinhamento entre a instituição e o desenvolvimento de habilidades e competências por parte dos servidores.

A instituição deve valorizar as qualidades de seus servidores, capacitando-os e alocando-os adequadamente em funções, setores e locais, preferencialmente de acordo com essa perspectiva, proporcionando um corpo de profissionais mais capazes, colaborativos, satisfeitos e consequentemente mais produtivos e engajados no alcance dos objetivos estratégicos do órgão. Nesse contexto, o estabelecimento, mapeamento e oferecimento de competências ocupam um papel importante no alcance desse objetivo, aliados a uma política de retenção de talentos e desenvolvimento de lideranças. (PRF, 2021)

 

E na Polícia Civil do Paraná isso não pode ser diferente, pois é fundamental que o órgão valorize as qualidades de cada servidor policial no bem atender ao público, alocando-os adequadamente em suas funções e locais de trabalho dentro das delegacias ou outros ambientes de atendimento. Isso propicia servidores mais colaborativos e engajados naquilo que fazem, alinhados com uma polícia que valoriza assim não somente o cidadão como também o próprio policial. Desta forma, cursos de aperfeiçoamento, palestras e/ou demais ministrações de especialização e qualificação tornam as fontes de capital humano mais eficientes e devidamente especializadas, o que impacta diretamente no trato com o público e consequente feedback positivo deste em relação à instituição.

Por fim, para se chegar a uma polícia cidadã, jamais se pode deixar de lado um elemento presente no dia a dia de todos: a comunicação. Conforme Moraes (2018, p.59), a falta de comunicação adequada com o cidadão pode trazer problemas, por exemplo, na confecção de boletins de ocorrência imperfeitos, deficientes na interpretação dos fatos narrados, isso nos traz, por consequência, um número excessivo de reclamações por parte de nossos clientes no atendimento recebido em nossas delegacias, o que causa assim a ineficiência no atendimento ao cidadão. Logo, ainda de acordo com Moraes (2018), trata-se de “uma busca do “saber falar” e do “saber ouvir””. Têm-se assim uma necessidade clara de que os policiais, em especial aqueles que trabalham diretamente com o público, tenham a capacidade de compreender com perfeição o que as pessoas buscam quando se deslocam até uma delegacia ou até os próprios servidores em si. Não se pode admitir intolerância no ouvir o cidadão ou bloqueios comunicativos por parte dos servidores, deve-se antes de tudo ter em mente que a comunicação para ser bem sucedida deve ocorrer de maneira completa, desde o ponto do emissor da mensagem até o receptor, e esse processo deve ocorrer sem barreiras que impeçam seu respectivo êxito.

 

4.3 AÇÕES DE EXTENSÃO DA ATIVIDADE POLICIAL

Quando se fala em polícia cidadã devemos lembrar que esta se relaciona diretamente com a comunidade, e é nesse pilar que a polícia cria raízes com o bom atendimento das pessoas.

A partir de ações com a sociedade, a Polícia Civil fortalece laços na prestação dos serviços e proporciona proximidade, elemento que se faz necessário para qualidade no desempenho de funções ao exercer a segurança pública. Trazer a comunidade para perto faz com que a confiança das pessoas no órgão aumente e traz maior valorização ao trabalho do policial, que passa a ser visto não simplesmente como agente perseguidor de criminosos, mas como também um importante amigo social que desempenha suas funções com excelência e que está disposto a ouvir pessoas, sejam elas vítimas ou não. Nesse sentido, ações comunitárias podem ser desempenhadas pelo órgão constantemente – e não apenas em caráter eventual – em busca de atrair novos olhares em relação ao desempenho das funções do órgão, muitas vezes desconhecidas pela população no geral que apenas possui uma visão dada pela mídia ou qualquer outro meio de comunicação.

Diante disso, observa-se que a educação acaba sendo um elemento indissociável na construção de uma sociedade mais humana e que valoriza o próximo, de modo que órgãos e instituições que promovem ações conscientizadoras são bem vistos pela comunidade a qual vê que não é simplesmente sujeita de ações corretivas ou punitivas por parte do Estado, mas que se integra a ele. Segundo Moraes (2018), ações assim trazem ao cidadão “a certeza de que a polícia está aprofundando o seu relacionamento com a sociedade”. Nesse sentido, práticas educativas por parte da Polícia Civil em instituições e escolas de ensino básico e médio criam laços estreitos com pais, alunos e professores, de modo que as pessoas assemelham a imagem da polícia como defensora de seus direitos. Logo, é importante que a ministração de cursos e palestras voltadas à comunidade seja promovida de forma a integrar polícia e cidadão, não apenas em assuntos relacionados à prevenção e combate de delitos, mas como qualquer outro e também aqueles que podem favorecer uma comunicação futura entre ambos. E não se limita naturalmente ao ensino, mas pode abarcar outras ações voltadas à presença policial, como na distribuição de presentes ou itens básicos em locais carentes, ou participação policial em eventos comunitários, formação de grupos escoteiros para crianças e adolescentes entre inúmeras outras práticas que criem essa conexão comunitária.

A exemplo de aplicações práticas nesse contexto, destacam-se as realizadas no Estado do Pará por intermédio de João Moraes em sua gestão como Delegado Geral de Polícia Civil daquele estado, como as ações e projetos “Meninos da Polícia Civil”, “Prevenção com arte” – voltado ao combate às drogas –, e “Projeto Polícia Civil Criança” entre outros ligados à área social, com a colaboração da família e do policial além da articulação com escolas, igrejas, centros comunitários, Secretaria Executiva de Educação, entre outros.

FIGURA 2 – EXEMPLO DE PROJETO COMUNITÁRIO NO MODELO DE POLÍCIA CIDADÃ

FONTE: MORAES (2018)

 

Trata-se de exemplos práticos que buscam essa integração comunitária de maneira efetiva, buscando orientar crianças e adolescentes para que exerçam suas atribuições de cidadãos. E são exemplos como esses desenvolvidos no Pará que devem ser cada vez mais efetivados na relação da sociedade com a Polícia Civil, ações simples que podem ser desempenhadas e que certamente trarão bons resultados a médio e longo prazo, seja ao evitar que menores sigam caminhos não desejados como proporcionar uma melhor condição de vida para aqueles que não dispõe de recursos. Práticas como essas devem ser mais valorizadas e ampliadas pela comunidade em geral visando à segurança do futuro.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Polícia Civil do Paraná possui a visão de ser reconhecida nacionalmente pela excelência na investigação criminal técnico-científica e se tornar referência em gestão da Segurança Pública, diante disso o presente artigo buscou trazer elementos para a proposta de polícia cidadã que podem ser aprimorados e desenvolvidos pela PCPR em busca dessa excelência e qualidade a serviço da sociedade. E é por meio de estratégias práticas para implantação de um modelo inovador de polícia cidadã que essa visão poder ser cada vez mais alcançada pelo órgão, com medidas que auxiliem e promovam um aprimoramento na relação entre polícia e sociedade, com foco precípuo nas necessidades locais de cada região de abrangência, a fim de gerar uma parceria efetiva que contribua para o combate à criminalidade e redução dos índices de violência. Buscou-se assim através da metodologia de estudo adotada evidenciar como a proposta do policiamento comunitário traz a aproximação entre o cidadão e a polícia, o que derruba a barreira do distanciamento quando comparada ao modelo tradicional das polícias civis. Desse modo, é com mudanças de paradigmas e aplicabilidade prática como já vem sendo desempenhado através das delegacias cidadãs – o que deve ser difundido por todo o estado do Paraná em busca de resultados cada vez mais satisfatórios contra a criminalidade – além do aperfeiçoamento no atendimento ao público de forma eficiente, com êxito na comunicação entre servidores e administrados, bem como por intermédio de ações e projetos voltados à conexão entre a comunidade e a polícia que se pode ter cada vez mais uma relação benéfica entre o Estado e a sociedade no que diz respeito ao tema da segurança pública. Portanto, pode a Polícia Civil estar cada vez mais próxima da sociedade não apenas na busca da repressão de crimes, mas também como sujeito ativo de um processo harmônico na busca de servir e atender bem seu maior cliente final, o cidadão paranaense.

 

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1 Possui graduação em Farmácia pela Universidade Federal de Santa Maria (2013), Especialista em Ciências Criminais/ESPC-PR (2021). http://lattes.cnpq.br/9109922032162712

2 Possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Paraná (2015). Especialista em Ciências Criminais/ESPC-PR (2021)http://lattes.cnpq.br/9934675105954186

3 Possui graduação em Direito pela Faculdade Integrado de Campo Mourão (2016). Especialista em Ciências Criminais/ESPC-PR (2021) http://lattes.cnpq.br/1761632701157854

4 Possui graduação em Direito pelo Centro de Ensino Superior de Campos Gerais (2007), especialização em Direito Público pela Universidade de Desenvolvimento da Região do Pantanal (UNIDERP) (2010). Delegado de Polícia na Polícia Civil do Estado do Paraná. http://lattes.cnpq.br/9733750181496379

5 A Altus é uma aliança global que atua em vários continentes e adota uma perspectiva multicultural para melhorar a segurança pública e o sistema de justiça criminal. Seu principal projeto é a Semana de Visitas, organizado para: 1) avaliar a qualidade de serviços prestados por departamentos de polícia; 2) identificar boas práticas policiais; 3) fortalecer a prestação de contas pela polícia no que diz respeito ao público a que ela serve; 4) promover os direitos humanos. (RIBEIRO, 2013).